segunda-feira, agosto 14, 2017

O ESTRANHO QUE NÓS AMAMOS (The Beguiled)

Embora possamos dizer que O ESTRANHO QUE NÓS AMAMOS (2017), de Sofia Coppola, é uma nova releitura do romance pouco conhecido de Thomas Cullinan, o mesmo que deu origem ao filme homônimo de Don Siegel de 1971, é muito difícil acreditar que as intenções de Sofia não fossem a de colocar seu trabalho junto ao longa estrelado por Clint Eastwood, trazendo questões pertinentes ligadas à força da mulher na sociedade machista construída ao longo dos séculos.

Assim, parece complicado se desligar da versão de Siegel, até pelo impacto, como thriller, que a produção setentista tem até hoje, embora quem não viu o filme de Siegel até possa ver a versão de Coppola como algo à parte, único, independente. A intenção da diretora parece ser provocar, mudar o ponto de vista da trama. Não vemos mais a história pelos olhos do soldado ianque ferido que é desejado por mulheres de todas as idades de um internato de garotas na Virginia, na época da Guerra Civil Americana. No filme de Siegel, ele consegue tirar proveito dessa situação, como se estivesse numa loja de doces. Ao mesmo tempo, o que acontece a seguir com ele é um pesadelo terrível.

O trailer da nova versão, ganhadora do prêmio de melhor direção em Cannes, infelizmente não soube esconder a parte trágica do que acontece com o tal soldado quando ele adentra aquele território de mulheres que se veem mudadas e excitadas com sua presença. Em entrevista, Sofia Coppola disse que fez seu filme para as mulheres e para seus amigos gays. Faz sentido, principalmente na cena em que Nicole Kidman, a dona do internato, banha o corpo nu e inconsciente do soldado (Colin Farrell) e sente o calor do desejo.

Três gerações de atrizes - Nicole Kidman, Kirsten Dunst e Elle Fanning - se comportam de maneira diferente diante daquele homem. Mas todas elas se sentem bastante atraídas por ele. A mais velha parece ter uma reputação a zelar, mas tenta se aproveitar do fato de mandar naquele lugar; a do meio vê naquele homem uma passagem para a felicidade do amor romântico; já a mais jovem é impulsiva o suficiente para jogar o seu charme e avançar o sinal sem a menor culpa.

Por mais que estejamos diante de um filme que trata do desejo de diferentes mulheres por um homem, O ESTRANHO QUE NÓS AMAMOS é também um filme sobre o corpo objetificado de um homem, de como a aparente fragilidade feminina pode esconder uma força - e até uma maldade - que o homem não imagina que terá que sofrer. Trata-se de uma obra feminista, como já era o primeiro trabalho da diretora, AS VIRGENS SUICIDAS (1999), mas é também um filme que procura sua própria beleza nas imagens através da luz natural da fotografia de Philippe Le Sourd, dos figurinos sóbrios das moças do internato, em um colorido "feminino" que também sabe lidar muito bem com o vermelho vivo. O que é natural. Afinal, a mulher não sangra todo mês?

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