domingo, novembro 01, 2015

AMY



Lembro que na virada dos anos 1990 para o novo século eu costumava dizer que jamais queria deixar de ficar antenado com a música que estava rolando pelo mundo. Os anos 90 foram deliciosos e intensos pra mim, mas eu não sabia que tinha algo chamado de envelhecimento ou falta de sintonia com uma nova geração que acabaria por fazer com que eu ficasse ou com pouco interesse por certos artistas novos ou começasse a questionar se a culpa era da falta de qualidade da nova música. Assim, no meio desse processo e em meio também a uma série de coisas chatas que ocorreram na década passada, eu comecei a me desinteressar por artistas daquela década, com exceção de alguns poucos, mas brasileiros.

Nesse ínterim, estava aflorando uma artista que hoje, para muitos, é considerada a maior do século atual, até o momento: a inglesa Amy Winehouse. Mesmo tendo lançado tão poucos discos. Sua trajetória até lembra um pouco a de Kurt Cobain, que surgiu como um meteoro, ou como uma bomba-relógio, com data iminente para explodir, devido, tanto à dificuldade de lidar com a fama quanto ao consumo desmedido de álcool e drogas aliado à saúde física e mental frágil. As más companhias também contribuíram bastante pra isso, principalmente o namorado de Amy, um sujeito que é pintado no documentário como um dos piores vilões já vistos.

AMY (2015), documentário dirigido pelo mesmo Asif Kapadia que dirigiu SENNA (2010), aborda de maneira ao mesmo tempo dura e delicada a trajetória dessa cantora sensacional, que se tornou mundialmente famosa quando estourou o álbum Back to Black (2006), o seu segundo, nascido da dor de ter sido abandonada pelo namorado Blake Fielder-Civil. Seria o equivalente ao Jagged-Little Pill, da Alanis Morissette, que também nasceu da dor do abandono, mas a cantora canadense soube canalizar isso tudo e ainda veio com um álbum seguinte em completo restabelecimento emocional e com uma bonita espiritualidade.

Infelizmente Amy preferiu se afundar nas drogas. Ou não teve forças para resistir por causa do vício. E as apresentações dela em shows começaram a ficar cada vez mais aquém do que o que o mundo conheceu. Assim, AMY traz tanto a evolução da cantora e compositora a partir de imagens de arquivo da adolescência quanto sua decadência física até a morte, em 2011. Algumas cenas são tão dolorosas de ver que a gente fica até pensando se é ético da parte do diretor mostrar aquilo, o quanto uma pessoa é capaz de ir ao fundo do poço, como quando ela é flagrada na rua com o namorado, depois de terem usado drogas e de terem se cortado com uma garrafa. Ou nas vezes em que ela estava completamente fora de si para dar uma entrevista. Até que ponto esse tipo de coisa é aceitável?

O documentário pinta como vilões (ou quase isso) pelo menos duas pessoas: o namorado/marido e o pai de Amy, que é visto como um sujeito que não apenas não soube tratar da filha como deveria, como também a explorou. Tanto que há uma ação jurídica dos familiares quanto aos responsáveis pelo filme.

Uma cena é particularmente digna de nota e causa arrepios, mesmo em quem não acompanhou de perto tudo isso na época em que estava se desenrolando, que é o nascimento no estúdio de "Back to black", a faixa-título do segundo álbum, uma das melhores canções de sentimento de abandono pela pessoa amada já feitas. E não é apenas pelo significado, pela letra, pela situação, mas como isso é traduzido em música e pela voz de Amy. Dessa mesma lavra veio também "Love is a losing game", outro lindo exemplar do amor como objeto cortante.

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