segunda-feira, outubro 12, 2015

OITO DOCUMENTÁRIOS



Apesar de o termo documentário hoje ser um tanto complicado de usar, devido às cada vez maiores fusões com a ficção, tomo a liberdade de empregá-lo para designar as obras abaixo, apenas para fins de organização e também por ter pouco a dizer sobre estes filmes, seja por culpa da memória, seja por necessitar cada vez mais passar adiante os títulos que devo a este blog. Nem que seja na forma de textos pequenos e rasteiros.

A VIDA PRIVADA DOS HIPOPÓTAMOS

Embora não tenha me empolgado muito na época em que vi A VIDA PRIVADA DOS HIPOPÓTAMOS (2014), o filme de Matias Mariani e Maíra Bühler hoje me parece bastante inventivo, tanto por ser bem diferente do que se espera de qualquer documentário feito no Brasil, quanto pela forma como vai nos apresentando à situação complicada em que se encontrou um técnico de informática americano que se apaixonou por uma colombiana e que acabou se metendo em encrenca. Os diretores inicialmente pretendiam fazer um filme sobre presos estrangeiros no Brasil, mas a história de Chris, o tal americano, já era mais do que suficiente para que fosse criado um filme dedicado exclusivamente a ele.

SOPRO

Exibido em uma única sessão em mostra no Cinema do Dragão, SOPRO (2013), de Marcos Pimentel, é um trabalho que lida com a vida rural sem necessariamente estar preocupado com algo parecido com uma narração. Aliás, até há uma narração, no sentido de que todo filme tem uma, mas Pimentel prefere homenagear a natureza e a vida simples através de imagens que se configuram num ritmo próprio. A sequência mais memorável pra mim e que acabou me causando náuseas foi a de um nascimento de um bezerro. A câmera nos mostra até o fim o processo de nascimento da criatura, que aos olhos de um sujeito da cidade pode parecer no mínimo estranho, cronenberguiano até. Mas a vida animal é assim. O sopro do título também está presente no som do vento, principal elemento do que se poderia chamar de trilha sonora do filme.

OS ÚLTIMOS CANGACEIROS

E depois de quatro anos de sua exibição no Cine Ceará, Wolney Oliveira finalmente consegue colocar em cartaz o seu OS ÚLTIMOS CANGACEIROS (2011), um trabalho bem interessante em que o efeito do acaso é mais uma vez um aliado dos documentaristas. Aqui temos o caso do encontro de um casal que fazia parte do bando do lampião. Os dois, já bem velhinhos, vivendo separados por causa da polícia, nem sabem mais se o outro está vivo. Wolney se torna, então, responsável por esse reencontro, e ainda nos presenteia com imagens inéditas do bando de Lampião, filmadas por Benjamin Abraão e colorizadas a mão. Ficou um trabalho bonito, mas não deixa de ser curioso também ver os velhinhos que já mataram tanta gente serem hoje recebidos como heróis nacionais. Não tive como não lembrar de O ATO DE MATAR, de Joshua Oppenheimer, mas sabemos que o contexto aqui é outro, bem diferente. Afinal, a polícia era corrupta e o sertão nordestino era deixado ao deus-dará. O banditismo era, então, uma questão de honra para muitas dessas pessoas que aderiam a essa vida.

NOSTALGIA DA LUZ (Nostalgia de la Luz)

Não sei bem dizer qual foi minha cisma com este NOSTALGIA DA LUZ (2010), de Patricio Guzmán. Posso dizer que acabei não gostando pelo efeito do treme-treme que algumas salas do Cinépolis Rio-Mar Fortaleza proporcionam. Isso a muito me incomoda e retira bastante o prazer dos olhos que um filme poderia trazer. Logo, acabei ficando com má vontade de ver o filme, que acompanhei meio que a contragosto. Quem sabe revendo em casa eu gosto. A impressão que ficou foi que a junção do filosofar sobre as estrelas e o tempo e a questão da vida perdida de presos políticos que foram enterrados e até hoje têm seus restos mortais procurados por familiares no Deserto do Atacama, no Chile, durante a ditadura de Pinochet, não chegaram a formar um todo coeso. Pareceram dois assuntos que foram forçosamente colocados juntos por Guzmán. Mas, claro, posso estar enganado.

EDUARDO COUTINHO, 7 DE OUTUBRO

É tanta a saudade que sentimos de Eduardo Coutinho que este documentário EDUARDO COUTINHO, 7 DE OUTUBRO (2014), de Carlos Nader, chega a ser um alento. Nader, diretor do excelente A PAIXÃO DE JL (2014), emula o estilo enxuto de conversa de seu entrevistado e o resultado é bem descontraído e acaba por revelar bastante da personalidade e da vida de Coutinho, do seu processo de trabalho, da sorte em conseguir entrevistados fantásticos. Nader, ao usar a aleatoriedade na escolha de cenas de filmes como opção dentro de uma obra já bastante extensa como a de nosso maior documentarista, faz do acaso mais uma vez um aliado nesse gênero. Se fica atrás de qualquer outro título da filmografia de Coutinho é porque talvez queira mesmo ser humilde o bastante para reverenciar o seu ídolo.

ADEUS À LINGUAGEM (Adieu au Langage)

Não foi como deveria ter sido. Ver ADEUS À LINGUAGEM (2014, foto) em 2D e não em 3D, como foi pensado e arquitetado por Jean-Luc Godard, talvez seja ver apenas uma sombra de seu trabalho, aqui mais um filme-ensaio desse diretor que optou por um estilo peculiar de filmar a partir da década de 1970, quando praticamente abandonou a narrativa em prol de outros meios de contar a história ou de passar adiante a sua mensagem, a partir de imagem e recortes de textos seus e de outras pessoas ilustres. Tentar resumir ADEUS À LINGUAGEM é um tanto complicado, mas pode-se dizer que o principal eixo temático gira em torno de um casal vivendo em crise. Não chega a ser um filme difícil como se costuma pensar dos trabalhos do diretor suíço-francês e certamente deve render boas discussões filosóficas sobre a vida e a sociedade. E isso sem nunca deixar de ser cinema.

CAMPO DE JOGO

Certamente quem gosta de futebol e não é muito interessado em linguagem cinematográfica fora do convencional não deve gostar muito de CAMPO DE JOGO (2015), filme em que o esporte é o elemento central, mas, ao mesmo tempo, o diretor Eryk Rocha evitar mostrar os lances, preferindo deixar sua câmera nos olhares e nas emoções daquelas pessoas pertencentes a dois times de periferia que jogam no mesmo dia em que acontece a final da Copa do Mundo de 2014. Rocha faz cinema-poesia, ao optar por poucos depoimentos e filmar os corpos como num dança e os cortes da montagem como pedaços da construção de uma linguagem própria. Não é todo mundo que deve gostar do resultado, mas não dá pra dizer também que se trata de trabalho que mereça ser ignorado.

O UNIVERSO GRACILIANO

Não sou exatamente fã de Sylvio Back. Ele é até um bom diretor de documentários ensaísticos que sabe lidar muito bem com pedaços de outros filmes e imagens, como fez em YNDIO DO BRAZIL (1995), mas não soube aproveitar um tema tão interessante, que é a vida (e com ela a obra) de Graciliano Ramos, um de nossos maiores escritores. Em O UNIVERSO GRACILIANO (2013), Back opta por entrevistar pessoas que tiveram alguma relação, seja de amizade ou familiar, com o Velho Graça. O filme revela pouco sobre a obra do cineasta, mas algumas falas são acertos, como a cena em que a filha do escritor testemunha o momento em que o pai morre. Há uma valorização maior do homem Graciliano em detrimento do escritor e isso acaba empobrecendo o documentário. Eu confesso que estou na torcida para que Back não seja o diretor de uma futura adaptação de Angústia, um dos grandes romances de Graciliano, como andavam dizendo por aí.

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