quarta-feira, setembro 02, 2015

CORRENTE DO MAL (It Follows)



Eis o filme que livra a maldição dos filmes fracos de horror em nosso circuito. Não só isso: CORRENTE DO MAL (2014) é um dos mais inteligentes filmes do gênero a aportar por aqui há um bom tempo. Ao mesmo tempo em que é aberto a variadas interpretações, trata-se de uma obra que se basta mesmo analisando-se "apenas" sua capacidade de envolver e de causar suspense com a expectativa constante de que algo de ruim está prestes a aparecer num giro de 360 graus.

CORRENTE DO MAL nos apresenta ao drama de Jay (Maika Monroe), uma jovem feliz que passa a ser atormentada depois que faz sexo com um rapaz que lhe passa, através da relação sexual, uma espécie de maldição. A partir de então, ela passará a ver a morte iminente na figura de pessoas das mais variadas formas, prontas para lhe pegar. Uma vez que ela morra, a morte voltará a dar prioridade ao seu hospedeiro anterior. O que ela faz é correr feito uma desesperada.

A sorte dela é encontrar um grupo de bons amigos que acreditam nesse absurdo e a ajudam a combater ou ao menos conter esse mal. O que não significa que ela tenha finalmente encontrado a paz. Ao contrário, já que boa parte da metragem do filme contém aparições dessas figuras fantasmagóricas, muitas delas realmente assustadoras, e a fuga desesperada de Jay de algo que só ela vê.

Curiosamente, o tom mais sério do filme dá espaço a alguns momentos de alívio cômico, como o uso de um efeito especial bem antigo, na cena da praia, ou na famosa cena da piscina. Essa tentativa de também encontrar graça em meio à desgraça pode ser uma maneira de o filme entrar em sintonia com as produções de horror e ficção científica que são vistas na televisão em preto e branco da sala de estar da casa onde moram – o filme se passa, provavelmente, nos anos 1960, pela ambientação e pela exibição nos cinemas de CHARADA, de Stanley Donen.

Essa ambientação, inclusive, é um dos destaques visuais do filme de David Robert Mitchell, que destaca a época nos carros, nas decorações, na lingerie, num modo de pensar mais ingênuo. Ao mesmo tempo, a questão de um mal que surge a partir de uma relação sexual pode ser visto como algo retrógrado, como também como uma forma de homenagear tantos outros filmes de horror que têm esse posicionamento mais conservador em condenar aqueles que praticam sexo com a liberdade que eles ou elas merecem. Principalmente levando em consideração que o mundo mostrado no filme é um mundo movido a um grande tédio.

Pensar em CORRENTE DO MAL apenas ligando ao sexo talvez seja um tanto limitador. Mas, ainda que eu não tenha conseguindo encontrar outras interpretações para o filme, embora saiba que existam, a questão do sexo não deve ser deixada de lado, até porque o ato sexual não é mostrado como algo prazeroso ao longo do filme. Para sobreviver, por exemplo, Jay precisa fazer sexo por obrigação, enfrentando questões morais sobre passar ou não adiante aquele mal para pessoas inocentes. E nesse sentido a sequência final é uma das mais belas, terríveis e melancólicas, e ao mesmo tempo cruelmente libertadoras, do cinema jovem recente.

Quem puder ver CORRENTE DO MAL no cinema, não perca essa oportunidade de ouro. A imagem belíssima e o brilhante trabalho de som ajudam bastante a criar um clima maior de imersão e de prazer em estar vendo algo realmente especial.

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