domingo, maio 31, 2015

TERREMOTO – A FALHA DE SAN ANDREAS (San Andreas)



Há filmes que não têm a menor pretensão em ser grande cinema. Embora queiram ser entretenimento grandioso. São os casos dos disaster movies, aqueles filmes que nos passam a saborosa sensação de que estamos totalmente seguros na poltrona confortável do cinema enquanto o mundo (ou parte dele) está se acabando diante de nossos olhos. Se TERREMOTO – A FALHA DE SAN ANDREAS (2015) está longe de ser uma maravilha como O IMPOSSÍVEL, de J.A. Bayona, cuja dimensão humana e trágica está acima da ação e dos efeitos especiais, o filme protagonizado por Dwayne Johnson funciona muito bem como diversão escapista.

E falando em Johnson, legal notar como ele tem cada vez melhorado na posição de herói de ação. Nem parece o início da carreira, quando ele não passava de uma montanha de músculos com cabeça de ovo. Agora ele, além de estar atuando melhor, tem presença de cena e convence que é uma beleza nas cenas em que desempenha atos de heroísmo que deixam os marmanjos com inveja, como na primeira sequência em que ele salva uma jovem prestes a cair num precipício. Seu trabalho é de bombeiro, de salvador de vidas pilotando um helicóptero.

Sua vida privada, porém, não anda às mil maravilhas. Ele está passando por um processo de divórcio com uma mulher que ainda ama (Carla Gugino) e sofre com a dissolução da família, pois também ama muito a filha, vivida pela lindíssima (e inacreditável, como diz um dos personagens, com toda razão) Alexandra Daddario. Quem pôde ver as cenas da moça em TRUE DETECTIVE tem motivos suficientes para ter um especial carinho (por assim dizer) por ela.

E o legal de sua personagem é que ela não é apenas uma jovem em perigo à espera do socorro do pai. Ao contrário, ela salva mais a vida dos dois irmãos que conhece no prédio do padrasto, graças ao conhecimento obtido com o pai, do que o contrário. Esse tipo de heroína, ou semi-heroína, tem sido bastante comum nos dias de hoje em que a mulher tem desempenhado papéis mais ativos. A própria Daddario encarou o aterroizante Leatherface em O MASSACRE DA SERRA ELÉTRICA 3D – A LENDA CONTINUA.

Quanto a TERREMOTO – A FALHA DE SAN ANDREAS, é um filme que chega em um momento bem oportuno, em que as salas IMAX e a tecnologia 3D estão em alta e potencializam a experiência de destruição. Embora em alguns momentos o excesso de CGI torne tudo menos realista, uma vez que entramos na brincadeira do filme e nas possibilidades que um grande terremoto na Califórnia podem gerar (inclusive cenas com tsunami), tudo passa a ser muito divertido. Não importa, portanto, se  o texto é ruim ou se estão subaproveitando um ator como Paul Giamatti, que interpreta um especialista em abalos císmicos. No caso, o sabor é de um bom filme B, com a diferença que foi feito com bastante dinheiro (110 milhões de dólares).

O diretor de TERREMOTO, Brad Peyton, já havia trabalhado com Johnson na aventura juvenil VIAGEM 2 – A ILHA MISTERIOSA (2012) e está finalizando um filme de horror a ser lançado ainda este ano chamado INCARNATE e protagonizado por Carice van Houten, hoje em dia mais lembrada como a bruxa sensual Melisandre, da série GAME OF THRONES.

sábado, maio 30, 2015

KURT COBAIN – MONTAGE OF HECK (Cobain – Montage of Heck)



Ver o documentário KURT COBAIN – MONTAGE OF HECK (2015), de Brett Morgan, além de ter sido uma experiência intensa e um tanto perturbadora, ativou muito minha memória dos anos 1990, que eu guardo com carinho por terem sido anos muito mais ativos e cheios de aventuras, mas também anos de mais angústias nos sábados à noite quando não conseguia sair. Mas isso é coisa da idade e é natural e é necessário para que a gente faça maiores esforços para tornar a vida mais interessante e suprir aquele caos interior.

Eu lembro do dia em que ouvi pela primeira vez “Smells like teen spirit”, numa tarde de 1991, lembro das tantas vezes que eu saí de casa para trabalhar de manhã logo depois de ter tomado a minha dose de veneno de In Utero. Sentia-me mal ouvindo aquele disco, mas não conseguia parar de ouvi-lo. Algo semelhante aconteceria anos depois com A Tempestade, da Legião Urbana. Ambos os discos eram despedidas dolorosas de seus realizadores de alma atormentada. E as flores no cenário do Unplugged do Nirvana não podiam ser outra coisa senão uma espécie de funeral prévio do astro. Só que a gente não sabia disso na época.

MONTAGE OF HECK nos apresenta à infância de Kurt, seu constante sentimento de rejeição dos pais, que se tornou ainda mais forte depois da separação, quando ele ficou pulando de casa em casa – casa da mãe, casa do pai, casa do avô. E esse sentimento se tornaria ainda mais intenso com a adolescência, quando o elo entre pais e filhos começa a se partir e o jovem procura o seu próprio mundo, sua própria identidade. No caso, o que de mais positivo Kurt conseguiu para liberar suas energias foi o rock, em especial o punk rock.

E é interessante ver o início da banda, antes do boom de Nevermind, quando eles tocavam para plateias de duas pessoas, depois começaram a aumentar mais e mais o público, até gravar o seu primeiro disco por um selo pequeno. E é de arrepiar o momento em que a mãe ouve pela primeira vez o Nervermind, numa fita remasterizada que um Kurt só de cueca traz para lhe mostrar. Ela ficou muito assustada. A música era boa demais e ela sabia que o filho não estaria preparado para o que viria.

De fato, o disco foi uma bomba que destruiu e reconstruiu o mundo do rock da época. Para o bem e para o mal. Eu diria que mais para o bem, já que o rock passou a ser mais catártico, menos de diversão escapista, mais sincero, mais intenso. Mais do que o Achtung Baby, do U2, e o álbum preto do Metallica, foi Nevermind o disco que inaugurou a década de 1990.

Pelo menos mais duas coisas se destacam em MONTAGE OF HECK: as sequências com desenho animado que recriam determinados momentos do passado de Kurt e as filmagens caseiras, principalmente as feitas durante o período em que Kurt e Courtney Love estavam casados.

Os desenhos são lindos e trazem uma melancolia que combina muito bem com o espírito do documentário. Destaque para o momento em que Kurt transa com uma moça com problemas mentais. Quanto às filmagens da intimidade do casal junkie mais famoso do mundo naquela época, eles são tão fortes que sentimos até um pouco de culpa em estar invadindo aquele terreno tão íntimo. Porém, eles funcionam como uma luva para tornar o documentário ainda mais especial.

Achei estranho não haver nenhuma entrevista com Dave Grohl, que nem mesmo é creditado, já que aparece apenas em imagens de arquivo, mas Krist Novoselic aparece impressionantemente abalado, como se ainda não tivesse saído do luto. As declarações de Courtney Love também servem para pintar a sensibilidade de Kurt de forma ainda mais intensa, reforçada pela música, pelos desenhos e os escritos que ele deixou. Os seus últimos rabiscos, então, são de rasgar a alma.

Não tive como não lembrar do documentário brasileiro A PAIXÃO DE JL, de Carlos Nader, que também apresenta um artista pisciano em sua trajetória para a morte e sua intensa sensibilidade. No caso de MONTAGE OF HECK, as emoções de Kurt, somadas ao uso excessivo de drogas e às suas tendências suicidas, levaram-no a um ponto que parecia inevitável. E no fim escolheram uma canção perfeita e arrepiante para encerrar e, por que não?, celebrar a passagem deste ser único por nosso planeta. A música do Nirvana está viva e jamais será esquecida. Nem o sorriso tímido de Kurt, nem sua atitude explosivamente bela no palco.

quarta-feira, maio 27, 2015

TRÊS FILMES LATINO-AMERICANOS



Vou confessar uma coisa: eu acho que tenho um pouco de má vontade com relação a filmes latino-americanos. Não falo do que o Buñuel realizou no México nos anos 1950 ou de alguns casos bem especiais, como o argentino RELATOS SELVAGENS, mas, diferente de filmes brasileiros, que eu já vou com uma boa vontade natural, mesmo para ver alguns de gosto duvidoso, os filmes latino-americanos precisam me conquistar de verdade. Segue, abaixo, três casos que não me fizeram amá-los, dois argentinos e um mexicano. Todos foram vistos no cinema.

BEM PERTO DE BUENOS AIRES (Historia del Miedo)

A semelhança com O SOM AO REDOR pode ser mera coincidência, mas trata-se de um filme que também lida com questões relativas a diferenças de classes sociais, utilizando o registro do cinema fantástico a fim de criar uma atmosfera de medo e apreensão em diversos momentos. Também há semelhança no que se refere ao número de personagens, como num filme coral, faltando um protagonista, por assim dizer. O mais interessante desse grupo é um sujeito de rosto estranho e marcante. O que é mais interessante em BEM PERTO DE BUENOS AIRES (2014), de Benjamín Naishtat, é o modo como ele desconstrói a ação e a narrativa tradicional, deixando o espectador um tanto perdido. É bem provável que seja um caso de filme a rever, até por ter apenas 70 e poucos minutos de duração. Algumas boas cenas ficam na memória, como o momento do blecaute.

O CRÍTICO (El Crítico)

Eis um filme que tinha tudo para me agradar, mas que depois de um começo interessante vai se tornando enfadonho e perdendo a força. O CRÍTICO (2013), de Hernan Guerschuny, nos apresenta a um crítico de cinema que odeia comédias românticas, e também é bastante exigente com a grande maioria dos filmes que vê. Sua vida acaba sendo um tanto sem graça, frequentando sem entusiasmo cabines fechadas para a imprensa e conversando depois com outros colegas críticos que parecem tão sem graça que a vida. Até um dia em que ele conhece uma mulher por quem se apaixona, vivida por uma bela interessante Dolores Fonzi, e começa a ver sua vida como uma comédia romântica cheia dos clichês que ele tanto odiava. Pena que o filme nem consegue ser uma boa comédia romântica, nem sabe usar o cinismo do personagem masculino a seu favor, nem traz uma conclusão satisfatória.

CLUB SANDWICH (Club Sándwich)

O caso de CLUB SANDWICH (2013, foto), de Fernando Eimbcke, é menos complicado, pois se trata de um filme bem menos ambicioso que os demais. É também uma obra claramente de baixo custo, com praticamente três personagens: a mãe, o filho adolescente e sua primeira namoradinha. A relação entre essa mãe solteira e o filho tão apegado a ela é de uma proximidade e uma amizade que é comprometida quando o garoto passa a descobrir a sua sexualidade e principalmente quando ele conhece a menina. Até então, a figura sexual mais próxima a ele era a própria mãe. Para a mãe, principia o distanciamento desse filho que esteve tantos anos grudado a ela, já que ela também sente ciúme da mocinha e começa a surgir um atrito. O legal do namoro dos jovens é que gera alguns momentos picantes, pelo menos até onde o filme se permite.

segunda-feira, maio 25, 2015

POLTERGEIST – O FENÔMENO (Poltergeist)



O filme não é tão feio quanto andam pintando por aí, mas a pergunta continua no ar: onde estão os bons filmes de horror do ano? Até agora o cenário está tenebroso. Não no sentido aterrorizante ou fantasmagórico do termo, já que nem mesmo histórias de maldição ou de mortes misteriosas nos bastidores, como as dos filmes de horror de outrora esses novos, há mais. Perdeu-se a magia, perdeu-se também a criatividade, afinal, estamos falando aqui de mais um remake de outro clássico do gênero, POLTERGEIST – O FENÔMENO (1982), de Tobe Hooper (e Steven Spielberg).

O novo POLTERGEIST – O FENÔMENO (2015) é produzido por Sam Raimi (A MORTE DO DEMÔNIO, 1981) e dirigido por Gil Kenan (da animação A CASA MONSTRO, 2006). E trazer alguém da animação para dirigir um filme de horror sério, mas com uma dinâmica própria dos desenhos animados, como eram também os filmes da trilogia EVIL DEAD, de Raimi, talvez fosse uma ideia interessante. Poderia surgir algo bom daí.

Mas não é só entregar um roteiro mequetrefe com uma simples e pouco inventiva atualização da história original de Spielberg para Kenan fazer milagre. E curiosamente, nos dias atuais, a semelhança que o filme cria é com SOBRENATURAL, de James Wan, muito provavelmente o maior nome do terror de casa assombrada da atualidade, afinal, a busca por uma criança desaparecida é o mote. Com sorte, o dinamismo da segunda metade do filme acaba fazendo com que nos esqueçamos por alguns minutos que estamos diante de uma obra fácil de esquecer.

Se antes a tecnologia já era um elemento forte na trama, no novo filme ela se tornou ainda mais importante. Agora temos aparelhos celulares, GPS e um avião de brinquedo que funciona como um drone. Além do mais, o aparelho de televisão que servirá como elo de comunicação com a garotinha agora é maior. Mas o elemento humano continua, embora pouco nos importemos com o destino dos personagens, o que é um mau sinal.

Pelo menos, a partir do momento em que a menina desaparece, a sucessão de clichês baratos da casa assombrando os novos moradores passa a ser substituída pela divertida e interessante busca pela garota raptada pelos espíritos dispostos a virar a casa do avesso para conseguir o que desejam.

No novo filme, quase não temos atuações marcantes. Sam Rockwell como o pai de família desempregado está ok. Rosemarie DeWitt, como a esposa, está bem apagada. As crianças têm os seus momentos. Mas é Jared Harris, como o especialista em limpar casas assombradas que representa o melhor personagem deste filme que só existe porque a vontade de lucrar é maior do que a vergonha na cara de fazer algo um pouquinho mais original.

domingo, maio 24, 2015

SORRIA, VOCÊ ESTÁ SENDO FILMADO – O FILME



Tudo bem que Daniel Filho não precisa de pessoas o defendendo, já que tem a seu favor o público, a bilheteria, mas de vez em quando é necessário que se perceba o quão bom ele é na direção. Culpá-lo pela popularização das "globochanchadas" por causa de sucessos como SE EU FOSSE VOCÊ (2006) e sua sequência (2009), que ainda trouxe a moda das continuações de filmes brasileiros, algo restrito aos estrangeiros, é uma bobagem. Afinal, ele sempre fez melhor que os outros. Assim como fez o melhor exemplar da safra de filmes espíritas com CHICO XAVIER (2010) e fez uma obra baseada em Eça de Queirós parecer uma deliciosa trama rodriguiana com PRIMO BASÍLIO (2006).

SORRIA, VOCÊ ESTÁ SENDO FILMADO – O FILME (2014) é o seu retorno à telona depois de um bom tempo longe – CONFISSÕES DE ADOLESCENTE (2013) não conta, já que ele fez em parceria com sua pupila pouco inspirada Cris D’Amato. E dessa vez foi com um trabalho pouco comum de se ver dentro do cinema mainstream. Como é um filme praticamente todo filmado com a câmera parada, e dependendo muito da movimentação dos atores em cena, lembra um pouco uma boa peça de teatro. Aliás, Daniel Filho já havia namorado com o teatro alguns anos atrás com A PARTILHA (2001).

Desta vez, a brincadeira gira em torno de uma webcam escondida que faz com que os podres dos personagens venham à tona, depois que se descobre que um inquilino cometeu suicídio. O primeiro a descobrir o defunto é o porteiro do prédio, vivido por Lázaro Ramos. Aliás, impressionante a diferença da performance de Ramos neste filme em comparação com O VENDEDOR DE PASSADOS. Nota-se o quanto um bom diretor faz a diferença. O ator baiano está totalmente à vontade no papel, assim como todos os demais.

Algumas cenas são especialmente hilárias, como a tentativa do síndico (Otávio Augusto) fazer funcionar um berrante. A cena gera a maior quantidade de risadas por minuto, já que emenda com a entrada do personagem do corretor, vivido por Marcos Caruso, cuja participação é rápida, mas, sem dúvida, marcante.

Também estão muito bem em cena Juliano Cazarré, como o policial mandão, Lúcio Mauro Filho, como o papa-defunto, Roberta Rodrigues, como a esposa do porteiro, e Suzana Vieira, como a esposa do síndico, que se gaba por ter feito um papel numa novela da Rede Globo.

Pode-se dizer, inclusive, que SORRIA, VOCÊ ESTÁ SENDO FILMADO é também uma farsa sobre a fogueira de vaidades da sociedade contemporânea e sua relação com a tecnologia. A vizinha tirando selfie com o morto é um exemplo disso, assim como é toda a representação dos personagens quando descobrem que estão sendo filmados.

O diretor pode não estar inventando a roda com esse filme – que na verdade é inspirado em uma obra sérvia, MORTE DE UM HOMEM NAS BALCÃS (2012) –, sem falar que sabemos que também não é nenhuma novidade o fato de que a reação das pessoas muda quando elas se postam em frente a uma câmera. Porém, o que importa aqui é o quanto o diretor trabalha a espontaneidade em seu elenco e o quanto o humor está afiado. Daniel Filho não se tornou o Midas do cinema brasileiro dos anos 2000 à toa.

sábado, maio 23, 2015

O VENDEDOR DE PASSADOS



Uma pena que um filme cuja premissa tão interessante, como se pode evidenciar pelo trailer, possa ser tão decepcionante quanto este O VENDEDOR DE PASSADOS (2015), de Lula Buarque de Hollanda, baseado no romance homônimo do angolano José Eduardo Agualusa.

Poderia atribuir a culpa à pouca experiência do diretor em lidar com trabalhos de ficção – é o seu primeiro longa do tipo, numa carreira pontuada por documentários, especialmente musicais –, mas há tantos cineastas de ficção que vieram de documentários, que isso não chega a ser exatamente uma desculpa.

Na trama, Vicente (Lázaro Ramos) é um falsificador especialista em reconstruir o passado de pessoas problemáticas. Atualmente tem cuidado no caso de um ex-gordo que nunca teve nenhuma relação sexual ou afetiva e que agora que fez a cirurgia bariátrica e passou por muitas plásticas está pronto para se reinventar, inclusive no passado, e finalmente conseguir uma noiva. Ele tem fé que com isso conseguirá mudar a sua vida da noite para o dia.

Em meio a casos do tipo, surge alguém que nem mesmo quer dizer seu verdadeiro nome, quanto mais seu passado real. A intenção da depois nomeada Clara (Alline Moraes) é criar um passado a partir do pouco que tem marcado em seu corpo. Trata-se de uma bela mulher que atrai a atenção do solitário Vicente, mas que depois acaba por surpreendê-lo.

Curioso como há uma série de elementos interessantes, como a questão da mãe do ex-gordo, ou da mentira tão comum nos dias atuais, que graças às tecnologias de computação pode criar algo que não existe e fazer com que todos acreditam. Esse tipo de discussão até poderia ser aprofundada se o filme não deixasse tudo na superfície e se os seus personagens não fossem tão frágeis.

Dá pra notar o esforço de Lázaro Ramos, grande ator que começou no cinema antes de começar a ficar famoso também na televisão, e ele acaba quase carregando o filme nas costas, já que Alline Moraes, por mais bela que seja, não tem boas referências no cinema, apesar de estar em bons filmes como O HOMEM DO FUTURO, HELENO e TIM MAIA. Seu trunfo está apenas na beleza, no físico, e precisaria de um bom diretor de atores ou de um preparador de elenco que a tornasse melhor do que seus personagens ruins das telenovelas globais.

Lula Buarque também não consegue trazer a solidão de Vicente para o lado de cá da tela, por mais que seja essa a intenção, e um dos elementos mais importantes da narrativa. Em nenhum momento nos sentimos solidários ao seu drama, algo que poderia elevar o filme a uma estatura de pretenso thriller para um também interessante drama familiar.

sexta-feira, maio 22, 2015

LOS HERMANOS – ESSE É SÓ O COMEÇO DO FIM DA NOSSA VIDA



Em certo momento de LOS HERMANOS – ESSE É SÓ O COMEÇO DO FIM DA NOSSA VIDA (2014), Marcelo Camelo e Rodrigo Amarante ensaiam "Nunca diga", canção de Frank Jorge (também conhecida em versão do Pato Fu) que fala sobre a questão dos gostos musicais e do quanto alguém que ama uma música ou artista pode ficar chateado quando o seu gostar (o seu amar, na verdade) é questionado, já que se trata de algo tão pessoal e de natureza tão emocional.

Foi bem essa a realidade dos brasileiros em relação ao Los Hermanos até uns anos atrás. Quem odiava, fazia questão de bradar aos quatro ventos e dizer o quanto achava ridículo aquele universo de fãs devotados. Mas, como ridículas são também as cartas de amor, como dizia Pessoa, são também os sentimentos exacerbados que as canções da banda transmitem e contagiam os corações mais românticos. Na década de 2000, não houve outra banda no Brasil que pegou tão forte uma juventude.

Se voltarmos no tempo, na época do lançamento de Ventura (2003), possivelmente a obra-prima da banda, logo nos shows de estreia os fãs cantavam a plenos pulmões as novas músicas de um disco lançado havia poucos dias. Em especial "O vencedor", uma espécie de hino de uma geração, que Camelo gostava de deixar o público cantando sozinho os primeiros versos. Isso é captado também em um momento arrepiante do documentário de Maria Ribeiro, sobre a turnê que a banda fez em 2012, depois de um hiato de cinco anos sem gravar discos ou fazer turnês.

A diretora conseguiu, depois de certa resistência, a autorização dos músicos para acompanhá-los naquele período, não apenas durante os shows, mas também nos camarins e nos intervalos, como no passeio que eles fazem por Brasília ou dentro dos ônibus. Destaque também para a ao mesmo tempo discreta e brilhante presença de Mallu Magalhães, sempre ali perto, como uma espécie de Yoko Ono jovem e bela. O distanciamento de Camelo e Amarante, apesar do forte sentimento de amizade que ainda persiste entre os dois, dá pra se notar em cena em que o ruivo ensaia a então inédita "Tardei", de seu disco solo.

É num desses momentos mais intimistas, dentro de um ônibus, que o filme consegue um depoimento comovente de Marcelo Camelo sobre uma mãe que pede o autógrafo a ele, informando que o filho dela, falecido, amava a banda. Como se a situação em si já não fosse de muita emoção, ela lhe dá um abraço apertado e depois vai embora, apontando o disco autografado para o céu, como se estivesse mostrando ao filho. Camelo fica comovido. Quem não ficaria?

Aliás, tão belas quanto as poucas cenas de canções ao vivo são as reações apaixonadas do público durante o catártico evento registrado em algumas cidades. Quanto às músicas, destaque para "Além do que se vê", "De onde vem a calma" e "A flor", todas bastante sujeitas a respostas performáticas dos fãs, alguns deles, flagrados em lágrimas.

O que pode depor um pouco contra o filme é o quanto Maria Ribeiro tateia pra encontrar um rumo para o seu documentário, muitas vezes até forçando a barra ao rodar a câmera dentro de um ambiente fechado e apertado em que os músicos estão ensaiando.

Documentário é um gênero que muito deve ao acaso para que sejam especiais. Isso acontece até mesmo com mestres como Eduardo Coutinho. No caso deste sobre o Los Hermanos, o ponto de partida lembra o de OS DOCES BÁRBAROS, de Jom Tob Azulay, que naturalmente foi muito mais feliz em seu resultado, tanto pelo ineditismo dos registros, quanto pelas performances, quanto pelas surpresas que surgiram ao longo das filmagens.

O que acaba mais importando em LOS HERMANOS – ESSE É SÓ O COMEÇO DO FIM DA NOSSA VIDA é a chance dos fãs em poder ver na telona do cinema um filme sobre e dedicado a uma banda que também é querida pela diretora. Quando termina, dá um gostinho de quero mais. Por isso, pode-se dizer que Maria Ribeiro foi bem-sucedida em sua difícil empreitada. Os fãs agradecem o presente.

quarta-feira, maio 20, 2015

THE ENFIELD HAUNTING



Atualmente estamos testemunhando uma crise no cinema de horror, especialmente os filmes que chegam aos nossos cinemas, já que há alguns, mais underground, que são descobertos por poucos. Em meio a este cenário tenebroso, a televisão britânica resolveu produzir esta minissérie em três episódios baseada em um caso que aterrorizou uma família na cidade de Enfield. Trata-se de um episódio bastante famoso e que inclusive fará parte da trama de INVOCAÇÃO DO MAL 2, de James Wan, previsto para o próximo ano.

O que depõe a favor de THE ENFIELD HAUTING (2015) é ser tanto um filme de assombração clássico quanto um drama sensível sobre perdas familiares. Somos apresentados inicialmente a um senhor de coração dolorido que tem a fama de cuidar de casos paranormais, Maurice Grosse, vivido com delicadeza pelo veterano Timothy Spall (SR. TURNER).

Ao chegar à casa da atormentada família Hodgson, ele logo se afeiçoa à pequena e molestada pelas entidades Janet (Eleanor Worthington-Cox, que fez a princesa Aurora aos 8 anos em MALÉVOLA), que não por acaso tem o mesmo nome da filha que ele perdeu em um acidente, anos atrás. A afeição é recíproca e a pequena e inteligente menina vê o velho e atencioso Maurice como o pai que ela não tem – o seu pai abandonara a família (a mulher, duas meninas e um menino com problema de gagueira) há alguns anos.

Entra para ajudar Maurice o especialista em poltergeists Guy Playfair (Matthew Macfadyen, o eterno Mr. Darcy, de ORGULHO E PRECONCEITO), com um livro publicado sobre sua experiência com fenômenos paranormais no Brasil. No entanto, ao chegar à casa dos Hodgson, inicialmente, ele trata com ceticismo o caso, pensando na possibilidade de a pequena Janet estar enganando a todos.

A minissérie teve todos os três episódios dirigidos por Kristoffer Nyholm, conhecido pela versão original de THE KILLING (2007-2012). Nyholm lida muito bem com uma história que poderia ser contada com todos os clichês de casas assombradas e coisas do tipo, inclusive com muitos sustos, mas os envolvidos preferiram um tom mais contido, embora não faltem cenas explícitas de ataque das entidades malignas através de objetos ou mesmo corpos sendo arremessados, assim como vozes saindo da boca da pequena Janet. Como já estamos há muito tempo da exibição de O EXORCISTA, já até nos acostumamos com isso, embora vez em outra um novo filme ou uma nova série consiga nos fazer arrepiar com algo do tipo.

THE ENFIELD HAUNTING faz isso, mesmo quando os rumos da história parecem se encaminhar para um desfecho niilista e um tanto incômodo, e talvez um pouco longe das tradicionais cenas de expulsão de demônios. Até porque a série lida com espíritos e não com demônios, o que dá, de certa forma, um ar de maior aprovação no que se refere ao realismo que ele tenta buscar, a fim de se tornar o mais próxima possível dos eventos reais.

O que chega a elevar o status da série é o seu último episódio, que lida de maneira mais aprofundada com a questão da perda, tanto de Maurice quanto de Janet, e que torna a minissérie ao mesmo tempo comovente e arrepiante.

segunda-feira, maio 18, 2015

DIVÃ A 2



O cinema brasileiro este ano ainda não teve o seu blockbuster. De certa forma, tem sido interessante essa escolha em diminuir a quantidade de comédias, a fim de experimentar novos gêneros, ou ao menos novos tons. Deixando de lado os filmes que são exibidos apenas no circuito comercial, por exemplo, os cinemas de shopping este ano trouxeram até agora uma animação (ATÉ QUE A SBÓRNIA NOS SEPARE), um drama romântico (PONTE AÉREA), um documentário musical (CÁSSIA ELLER), um drama sobre depressão (ENTRE ABELHAS), um drama de guerra (ESTRADA 47) e apenas duas comédias que não obtiveram tanto assim nas bilheterias – SUPERPAI e O DUELO.

DIVÃ A 2 (2015), de Paulo Fontenelle, segue a tendência. Embora possa ser classificado como uma comédia romântica, há um interesse em buscar novos tons, de parecer mais sério, ao nos apresentar a história de um casal em crise, que fala para seus analistas sobre a decadência de seu casamento e da vida depois da separação. Assim, ouvimos tanto a narrativa pelo ponto de vista de Eduarda (Vanessa Giácomo) quanto pelo de Marcos (Rafael Infante).

Claro que isso não quer dizer que DIVÃ A 2 seja uma beleza de filme. Na verdade, há muitos problemas, a trama é boba e até um pouco manjada, alguns diálogos são constrangedores e o final é brega que dói, mas há algo no filme que é simpático e divertido o suficiente para deixar o espectador pelo menos mais bem-humorado ao final da sessão, já que momentos de riso não faltam, principalmente por causa de Rafael Infante, mais um ator do canal humorístico Porta dos Fundos que tenta se firmar no cinema.

Infante é responsável pelos momentos mais divertidos do filme, embora haja uma tendência de o enredo desenvolver mais o drama de Eduarda, já que é ela quem encontra alguém significativo em meio às aventuras que os dois viveram no momento pós-separação. Trata-se do analista interpretado por Marcelo Serrado. Ele personifica o homem ideal para Eduarda. O que, aliás, faz com que isso seja algo bastante estranho para ela, acostumada que estava com o comportamento mais infantilizado, brincalhão e egocêntrico de Marcos, que durante a separação não conseguiu nem ser um pai razoável para o filho.

Porém, uma vez que estamos diante de um filme sem muitas pretensões, não há por que cobrar tanto de DIVÃ A 2. Trata-se de diversão escapista feita por um sujeito que havia dirigido uma comédia bastante irregular, para dizer o mínimo (SE PUDER...DIRIJA!, 2013) e um suspense pouco conhecido (INTRUSO, 2009), que não deve ser grande coisa também.

A mão pesada de Fontenelle é compensada com a simpatia de seus protagonistas, e por isso até que DIVÃ A 2 não se sai tão mal. O segredo é manter as expectativas baixas e relaxar. Quem sabe até você se identifique com alguns momentos ou até pense em quantas anda a sua vida amorosa.

domingo, maio 17, 2015

SEIS CURTAS BRASILEIROS



Aproveitando a Mostra Outros Cinemas, que rolou em Fortaleza esta semana, para escrever um pouco sobre os curtas que pude ver ou rever.

O CLUBE

Este é bem o caso de filme cuja boa aceitação crítica eu não consigo entender. Já tinha visto O CLUBE (2014), de Allan Ribeiro, em uma mostra especial no Dragão do Mar e agora pude rever na Mostra Outros Cinemas. Não melhorou minha impressão, embora tenha o seu grau de interesse no que se refere ao modo como o diretor misturou um roteiro com acontecimentos e falas espontâneos a cargo dos próprios personagens, que interpretam a si mesmos. A história se passa em um clube de transformistas que comemora mais de 50 anos de existência e também mostra a rivalidade existente entre eles/elas. O cineasta, presente ao evento, comentou que até a quantidade de brilho na roupa é levada em conta quando a questão é se sair melhor, fazer a melhor apresentação da noite etc. Embora eu não tenha gostado do filme, percebi muita gente entusiasmada e até dançando na cadeira com a canção final que toca, uma versão em espanhol e dançante de "My way", o que é um indicador que O CLUBE encontrou o seu público, como também encontrou o longa de Ribeiro, ESSE AMOR QUE NOS CONSOME (2012).

SEM CORAÇÃO

Outra revisão, SEM CORAÇÃO (2014), de Nara Normande e Tião, é só mais uma prova de quanto anda bem o cinema pernambucano. Aqui temos uma história que se passa em uma pequena cidade litorânea de Pernambuco que serve de palco para o encontro entre um garoto da cidade grande e uma menina, chamada de “Sem Coração”, por ter uma cicatriz no peito de uma cirurgia do coração que fez. A menina, ao mesmo tempo que convive entre os meninos, é ridicularizada por eles, e vista como alguém que não pode ser encarada como uma namorada séria, já que ela é generosa o bastante para “dar” para todos eles numa espécie de ritual. Ela encontra o amor no menino da cidade. O estilo de direção não é exatamente rigoroso, com uma câmera inquieta e alguns diálogos difíceis de entender, como geralmente acontece quando se trabalha com crianças, mas é um filme bem bonito e tocante.

ESTUDO DE PERSISTÊNCIA

Nada contra selfies pornôs. Ao contrário. O problema é que ESTUDO DE PERSISTÊNCIA (2014), de Krefer, nada mais é do que uma sucessão de imagens rápidas e com flashes dessas fotos. Se um flash já incomoda, imagina centenas deles, ainda que num intervalo de tempo de apenas dois minutos. Assim, procurar uma justificativa para esse trabalho, algo como uma reflexão, por exemplo, chega a soar até forçado.

ENSAIO SOBRE MINHA MÃE

Como deu pra notar no debate, ENSAIO SOBRE MINHA MÃE (2014), de Jocimar Dias Jr., encontrou sim o seu público, com depoimento de alguém que se identificou com a narrativa e com o fato de a protagonista ser também uma idealização de sua mãe. Ou seja, o filme, com várias sequências musicais, e a maior parte das músicas ser de fonte evangélica, acaba agradando a quem embarca nas intenções do jovem cineasta, que utilizou a própria mãe para recriar alguns momentos particularmente dolorosos de sua vida, incluindo a saída do filho de casa e as crises no casamento, passando pelos conflitos religiosos. É uma obra interessante, mas que não chegou a me tocar.

FILME SELVAGEM

Pedro Diógenes, um dos membros mais importantes do grupo Alumbramento, faz aqui uma espécie de manifesto sobre como o cinema deveria ser. FILME SELVAGEM (2014) traz uma sucessão de imagens desfocadas, que servem como pano de fundo para o discurso do próprio cineasta sobre o estado das coisas no que se refere à falta de interesse do grande público por um cinema mais desafiador e uma preguiça lamentável que faz com que esse público procure sempre mais do mesmo. Por outro lado, há também a culpa do sistema, que não oferece espaço para que um outro cinema, mais corajoso, circule. É o caso de filme cujo discurso verbal é mais interessante do que as imagens.

NUA POR DENTRO DO COURO

Estou gostando de ver essa nova geração fazendo cinema fantástico e criando coisas lindas como este NUA POR DENTRO DO COURO (2014, foto), um trabalho bem fácil de deixar os fãs do gênero e de cinema em geral maravilhado. Engraçado que o primeiro filme que eu vi de Lucas Sá foi uma espécie de documentário em que ele viaja até uma cidadezinha do interior para criar uma história adorável de sua família, um filme chamado NO INTERIOR DA MINHA MÃE (2013), curiosamente também exibido na Mostra Outros Cinemas do ano passado. NUA POR DENTRO DO COURO é algo completamente diferente, pelo menos à primeira vista, já que há uma mudança de registro. Temos aqui duas personagens principais: uma garota que usa um olho pintado colado no lugar do que seria seu olho (presume-se que ela seja cega de um olho), vivida pela bela Miriã Possani (de A ÚLTIMA ESTRADA DA PRAIA), e uma mulher com jeitão de bruxa que faz bolinhos e compra também veneno em um supermercado (Gilda Nomacce, de QUANDO EU ERA VIVO). Se o andamento da narrativa é por si só de dar gosto, o desenrolar e o desfecho tornam este curta ainda mais especial, com algo de lovecraftiano misturado com contos de fadas. Aguardemos com atenção o primeiro longa de Lucas Sá, que disse no debate que será protagonizado por Gilda Nomacce.

sexta-feira, maio 15, 2015

MAD MAX – ESTRADA DA FÚRIA (Mad Max – Fury Road)



A experiência de ver MAD MAX – ESTRADA DA FÚRIA (2015) no cinema, especialmente em uma sala IMAX, é algo difícil de expressar em palavras. Não exatamente pela tecnologia e pela maior imersão que a sala em si proporciona, mas por se tratar de uma obra verdadeiramente especial. Afinal, não é todo dia que a gente sai de uma sessão como tivesse sido atropelado por uma manada de elefantes. Ou melhor, por um caminhão enorme como aqueles mostrados no filme.

A expectativa, que já era alta, em relação ao novo trabalho de George Miller, se cumpre com louvor. É muito mais do que se imagina. É um espetáculo de loucura, no melhor sentido da palavra, de um homem visionário. Não à toa, o astro Tom Hardy foi pedir desculpas ao diretor depois de ver o filme pela primeira vez. Isso ocorreu pois ele ficava incomodando o cineasta durante as filmagens, perguntando o porquê de cada cena que ele fazia em movimento. E quem vê o filme sabe o quanto o filme raramente para quieto. Ação quase inteiramente non-stop. Com apenas alguns breves momentos para respirarmos e prepararmo-nos de novo para uma nova e perigosa jornada no deserto, enfrentando inimigos impiedosos.

Miller faz o milagre de nos deixar comovidos e apegados aos personagens sem nem ao menos sabermos de seu passado, como é o caso da estupendamente linda Furiosa, interpretada por uma Charlize Theron em estado de graça. Nada sabemos dela, mas a jornada tensa, dolorosa, sangrenta e perigosa que ela faz junto com outras mulheres e depois com Max é suficiente para que em determinado momento cheguemos a um ponto de grande comoção, algo pouco comum em filmes de ação, geralmente mais brutais.

Não que não haja brutalidade em ESTRADA DA FÚRIA. Há bastante. Mas há principalmente poesia. Ou as duas coisas juntas. Dizer que é uma obra-prima até chega a ser pouco, pois o termo foi se tornando comum demais. As palavras em si parecem comuns demais para descrever o indizível que é ver com os próprios olhos aquilo que outra arte que não o cinema jamais presentearia.

O grau de intensidade das sequências de ação e das loucuras que o cineasta apronta nos faz ver o filme com um sorriso nos lábios quase o tempo inteiro. Quando não é o caso, estamos de boca aberta, de admiração. Em que outro filme teríamos um vilão com o corpo todo queimado usando uma armadura e uma máscara de caveira dirigindo e comandando outros carros em perseguição ao grande veículo de Furiosa? Talvez algo parecido em MAD MAX 2 – A CAÇADA CONTINUA (1981), mas aqui isso é elevado a uma potência difícil de medir.

Em que outro filme teríamos um sujeito com uma guitarra elétrica que solta fogo e mais um grupo de outros caras na percussão, fazendo com que simpatizemos até mesmo com esses tais vilões, justamente por disporem de tais equipamentos? Do lado de cá, temos uma Furiosa utilizando uma prótese em seu braço amputado para dirigir o veículo e um homem usando uma espécie de focinheira que até então estava sendo usado como banco de sangue para um grupo de garotos extremamente pálidos dentro de uma jaula. Pois é graças a um desses garotos, Nux (Nicholas Hoult), que Max entra nessa corrida maluca, ainda dando o seu sangue e o seu carro.

A magnitude de FÚRIA NA ESTRADA certamente encontrará mais poesia nas palavras de quem tem um dom de eloquência melhor do que este que vos escreve. O que eu não poderia deixa passar era louvar esse trabalho de escala monumental que George Miller dá de presente à humanidade. Mesmo com uma carreira um tanto irregular, o cineasta australiano alcança, mais uma vez, o status de cineasta de primeira grandeza, tendo seu lugar reservado entre os melhores dos melhores. Não à toa, uma de suas maiores inspirações na realização deste filme foi A GENERAL, de Buster Keaton e Clyde Bruckman. Estão vendo como ele está bem acompanhado?

quinta-feira, maio 14, 2015

BATES MOTEL – TERCEIRA TEMPORADA (Bates Motel –Season 3)



Aquilo que temíamos aconteceu nesta terceira temporada de BATES MOTEL (2015): os roteiristas se perderam em meio às várias subtramas e isso prejudicou bastante o andamento da série, que perdeu em ritmo e em intensidade dramática. O jovem Norman Bates, vivido por Freddie Highmore, acabou se tornando um adolescente chato e repetitivo e mesmo nas cenas em que ele demonstra seu lado sombrio, ou até comete ou passa a impressão de que comete um crime, acaba não causando impacto.

Desse modo, não adianta buscar referências à obra-prima de Alfred Hitchcock a fim de passar uma impressão melhor, como numa determinada cena da season finale ou nos momentos em que o banheiro do famoso quarto do assassinato de Marion Crane é visitado. Falando nisso, para o bem e para o mal, o responsável pela trilha sonora da série deixou de buscar tantas repetições dos arranjos de Bernard Herrmann.

Mas nem tudo são espinhos nesta terceira temporada. Alguns personagens cresceram, ainda que não necessariamente por causa da narrativa: caso de Emma (Olivia Cooke) e Dylan (Max Thierrot), que seguem sendo dois jovens extremamente simpáticos pelos quais nos importemos – eu, pelo menos, quero saber o que será da Emma.

Mas momentos deles aproximaram a série de um drama romântico, fugindo um pouco da proposta de uma série de suspense, embora seja algo bem-vindo quando é uma das poucas coisas que funcionam. O relacionamento de Dylan com o pai, por outro lado, que pareceu ser um tiro no pé para a narrativa, até que acabou de maneira bem comovente.

Mas a série estaria completamente destinada ao fracasso (ainda há esperança de que se reerga na quarta temporada) se não fosse Vera Farmiga e sua intensa performance como Norma Bates. Ela dá tudo de si como a mãe que sofre a dor de ter um filho que alterna momentos de ternura com momentos de puro terror. Ela sabe que está com uma bomba relógio em casa e que é preciso fazer algo mais drástico, como também recomenda o seu filho mais velho, Dylan.

Quem também continua bem na série é o Xerife Romero, que deixou de ser o sujeito antipático e misterioso da terceira temporada para abrir o coração e assim sabermos o que ele sente por Norma e alguns outros segredos seus. Os momentos de Romero nesta temporada estão mais ligados a Norma, que por sua vez acaba metida em encrenca com um chefe do crime da cidade. O xerife também demonstrou o que é capaz de fazer para defender o seu posto. É, definitivamente, um dos melhores personagens da série.

Falando ainda em personagem, o retorno de uma personagem importante da primeira temporada ajuda a criar um clima de sonho interessante, mas que infelizmente não ajuda muito a levantar a moral da série. Acaba funcionando apenas como trampolim para uma cena da season finale.

A esperança para BATES MOTEL está no fato de os produtores e roteiristas perceberam que precisam colocar novamente a série nos trilhos e pararem de enrolar. Mais uma temporada, por exemplo,seria suficiente para encerrar a história e minimizar os riscos de haver uma queda ainda maior na qualidade.

quarta-feira, maio 13, 2015

MAD MAX 2 – A CAÇADA CONTINUA (Mad Max 2 / Mad Max 2 – The Road Warrior)



Já se nota uma diferença incrível entre o primeiro MAD MAX (1979) e esta superprodução (principalmente para os padrões australianos) que dá continuidade às aventuras do herói solitário vivendo em um ambiente inóspito. MAD MAX 2 – A CAÇADA CONTINUA (1981) é o resultado do sucesso de público que o primeiro filme alcançou nas bilheterias mundiais e que se reflete em tomadas muito mais grandiloquentes, com o uso de gruas e de filmagens de cima que até chegam a se contrapor à câmera acoplada nos para-choques dos carros, tão frequente nas cenas de perseguição do primeiro e mais modesto filme.

MAD MAX 2 se assume de vez como um grande filme de ação e aventura e George Miller aproveita tudo o que o dinheiro pode fazer para ter um alcance ainda maior e mais atraente para o público. A história é mais redonda, a ideia de um futuro distópico é desenvolvida de vez e apresentada imediatamente após os créditos iniciais, como num cinejornal mostrando as guerras que ocasionaram aquele mundo, bem como cenas arrepiantes do primeiro filme, que construíram a figura do herói atormentado pela perda de pessoas queridas, como a mulher e o filho.

Depois disso, a ação já começa pra valer, com Max sendo perseguido por quatro bandidos das estradas. Há uma passagem de tempo entre o primeiro momento e este representado tanto pelos fios brancos dos cabelos do herói, como pelo agravamento da situação apresentada no primeiro filme, que na verdade nem tinha essa mitologia ligada à falta de água e comida e a briga por gasolina.

Sobre a falta de comida, um dos exemplos mais perfeitos é quando Max (Mel Gibson), depois de conhecer o Capitão Gyro (Bruce Spence), degusta uma lata de comida de cachorro, enquanto Gyro e o cachorro ficam lambendo os beiços. Gyro terá que esperar primeiro pelo cachorro para depois lamber o que sobrou da lata. A cena funciona também para mostrar que Max não era um sujeito bonzinho. Mas isso quem já viu o primeiro filme já sabe. O que não quer dizer que ele não represente o que há de mais heroico na história.

Uma das coisas que impressiona no filme é o quanto Miller nos dá uma visão privilegiada da ação. Quando não estamos à frente ou dentro dos carros, temos uma visão aérea perfeita do que ocorre durante as cenas de ação, o que contrasta com a grande maioria dos filmes de ação feitos atualmente, quase todos extremamente picotados e mal dando para entender o que está acontecendo. Até mesmo bons diretores têm feito isso. Ridley Scott é um que me vem à cabeça.

MAD MAX 2 é tão centrado na ação que são poucos os diálogos do filme. O que é mais um ponto a favor, já que quase não percebemos ou sentimos falta desses diálogos e toda a ação é narrada muito bem apenas pelo olhar das câmeras. Diz-se no IMDB que Mel Gibson só tem apenas 16 falas em todo o filme, o que pra mim é uma informação surpreendente, mesmo tendo (re) visto o filme esta semana.

Ver MAD MAX 2 e ver o trailer de MAD MAX – ESTRADA DA FÚRIA (2015) ajuda um pouco a entender o que pode vir do novo trabalho de Miller, cuja história dizem se passar entre o primeiro e o segundo filmes. Falta pouco para conhecermos a nova loucura engendrada pelo diretor. Pena que não é mais com Gibson, mas dá pra entender os vários motivos, sendo o principal deles a idade do ator.

terça-feira, maio 12, 2015

ÚLTIMAS CONVERSAS



Ver o próprio Eduardo Coutinho sendo entrevistado e se sentindo um tanto acuado nos instantes iniciais de ÚLTIMAS CONVERSAS (2015) é de dar ainda mais saudade dele, de seus filmes de conversas, que ele sabia tão bem orquestrar e também montar, escolhendo os entrevistados certos para compor o seu mosaico. Infelizmente o novo filme teve que ser montado por outra pessoa devido à sua passagem em fevereiro do ano passado.

ÚLTIMAS CONVERSAS recebeu esse nome em virtude do que ocorreu com o cineasta, e o material de 32 horas de gravação foi entregue a pessoas de confiança, como Jordana Breg, que já havia editado alguns de seus melhores trabalhos, e João Moreira Salles, seu produtor e também grande documentarista, que teve a dolorosa honra de finalizar o filme.

O foco das entrevistas são jovens dos 16 aos 18 anos, todos estudantes de escola pública do Rio de Janeiro, sobre seus planos para o futuro e sobre suas vidas pregressas. Já havíamos visto um belo documentário que conversa com estudantes sobre a questão do ensino, PRO DIA NASCER FELIZ, de João Jardim, mas ÚLTIMAS CONVERSAS amplia o espectro temático, deixando o jovem expressar como lhe aprouver, falando não só desse período tão conturbado, que é a adolescência, como também de seus anseios e de suas visões de mundo.

Assim, há jovens mais pés no chão, que preferem falar apenas daquilo que experimentaram de fato, mas há aqueles que tentam filosofar demais e dar um passo maior do que as pernas, caso de um deles, que até teve que ser corrigido por Coutinho, numa de suas intervenções mais explícitas, já que ele costuma se manter o menos visível possível em seus filmes.

Pode-se dizer, aliás, que este novo filme é um dos que mais ouvimos a voz do cineasta-entrevistador. Até porque, pela pouca maturidade dos jovens, é preciso que ele puxe mais deles, incentivando, assim, uma maior abertura daqueles que são mais tímidos. Dessa maneira, o diretor arranca lágrimas e depoimentos bastante íntimos de alguns de seus entrevistados, como da garota que foi abusada pelo padrasto. Coutinho tinha uma maneira toda especial de deixar as pessoas à vontade ou prontas para usar a tela como um palco.

As angústias do cineasta ao início do filme, com relação ao universo jovem, se tornam ainda mais intensas para o espectador, uma vez que sabemos de sua tristeza com relação ao filho. E quando interpelado sobre deixar de filmar, ele afirma que jamais deixaria de filmar: é tudo o que ele sabe fazer. Felizmente, ao menos, ele exerceu o seu ofício até a sua morte. Ele cita a criança como um exemplo de entrevistado que representaria a pureza, o não atuar, o não chegar armado para uma entrevista. O que não quer dizer que ele não trate com o maior carinho todos os entrevistados que vemos.

O humanismo tão impregnado em seus documentários se manifesta novamente neste novo trabalho, que nem procura trazer algo novo e provavelmente não seria tão elogiado assim se Coutinho estivesse vivo, como foi mais ou menos o caso de AS CANÇÕES (2011), considerado por muitos um passo atrás do cineasta em sua evolução. ÚLTIMAS CONVERSAS é, de fato, uma variação de um estilo que ele já vinha exercitando há um bom tempo.

Mas “fazer o mesmo filme” para um grande autor é trazer sempre algo especial para os apreciadores de seu trabalho. E como estamos falando do maior documentarista de nosso país, todo e qualquer filme de Coutinho é especial. Sendo póstumo, então, o sabor pode até ser um pouco amargo, mas seu novo trabalho é mais leve do que aparenta. Os risos até se sobressaem ao choro. E no final ele ainda deixa a porta aberta para quem quiser entrar. Esse simbolismo, inclusive, pode significar uma porção de coisas. Talvez por isso seja tão bonito.

segunda-feira, maio 11, 2015

MAD MAX



Às vésperas da estreia de MAD MAX – ESTRADA DA FÚRIA (2015), nada como poder ver ou rever MAD MAX (1979), o filme que deu origem à trilogia original e também a este novo filme, novamente a cargo de George Miller. No meu caso, foi a primeira vez que eu vi, já que não era exatamente um aficionado pela cinessérie e a Globo costumava reprisar apenas o segundo e o terceiro filmes – soube depois que o SBT é que tinha os direitos deste primeiro.

Que, aliás, é bem diferente do que se espera, já que não é exatamente uma obra sobre um futuro apocalíptico. É mais um filme de perseguição entre carros e motos em estradas desertas, que depois se transforma em um thriller de suspense sobre um bando de psicopatas, para depois ser um grande e empolgante filme de vingança.

Assim, a primeira metade é estranha, pois o vilão principal se torna tão forte e tão presente que quase conquista o protagonismo. Aos poucos é que o personagem de Mel Gibson vai tomando conta da tela, apesar de podermos lembrar muito bem de sua primeira aparição, para alguns comparada à de John Wayne em NO TEMPO DAS DILIGÊNCIAS, de John Ford.

Na verdade, eu não estava tão empolgado na primeira metade, quando o foco era a disputa entre os foras-da-lei das estradas e os homens que patrulhavam a região. Mel Gibson é Max, um desses homens da lei, que acaba ficando bastante perturbado quando um grande amigo e colega de trabalho seu tem seu corpo totalmente queimado por uma ação dos bárbaros. A saída, para ele, então, seria abandonar o trabalho.

A partir daí, MAD MAX se transforma em um belo filme de psicopata, quando Max sai em seu carro de passeio com a mulher, o filho pequeno e o cachorro para longe do trabalho e do horror do dia-a-dia. A cena dos motoqueiros malvados perseguindo a mulher na praia é de deixar o sangue intoxicado, assim como a sequência imediatamente posterior. Tem tudo a ver com o chamado horror rural americano da década de 1970.

A busca por vingança de Max já era algo de se esperar, mas o modo como Miller orquestra tudo, dispondo de poucos recursos financeiros, é de tirar o chapéu. Não dá para esquecer as cenas da câmera pertinho do chão, acopladas aos carros nas estradas, e nem a violência com que o herói assume a sua missão, isto é, vingar aqueles a quem ele amou e que foram brutalmente assassinados por aquele bando.

Com a expectativa do novo filme – que já anda recebendo ótimas críticas de quem já pôde ver –, a vontade que dá é fazer uma mini-maratona dos três primeiros MAD MAX, que tão importante foram em seu tempo e que agora têm o seu valor resgatado.

domingo, maio 10, 2015

BIG BANG: A TEORIA – A OITAVA TEMPORADA COMPLETA (The Big Bang Theory – The Complete Eighth Season)



Já faz algum tempo que THE BIG BANG THEORY deixou de ser uma série relevante, ainda que os índices de audiência ainda a mantenham em boa conta entre os executivos. Não é uma série de muitos prêmios justamente por não ser tão brilhante, mas que tem personagens carismáticos que seguram mesmo os espectadores impacientes e um pouco mais exigentes, cansados de tanto marasmo.

A oitava temporada (2014-2015) representa o pior momento da série dos nerds. Poderia-se culpar o namoro lento de Sheldon e Amy, o casamento chato de Howard e Bernadette, a relação estável de Leonard e Penny, mas nada dessas bobagens de casal tem a ver com o fato de a série não ter mais graça. Afinal, pra que melhor exemplo do que SEINFELD de série que não precisa de personagens casando e namorando como exemplo de qualidade? Mas comparar com a melhor de todas é covardia. A comparação mais adequada é mesmo com FRIENDS e suas histórias de casais.

E por falar em casal, é mesmo uma pena que a nova namorada de Raj, Emily (Laura Spencer), uma belíssima ruiva que gosta de filmes de horror e tem um senso de humor interessante, mas que não bate com o jeitão medroso de Raj, tenha ficado de fora da maior parte dos episódios, tornando-a ainda mais estranha ao grupo. Assim, tem-se a impressão de que ela será descartada a qualquer momento.

A oitava temporada começou com algo que poderia ser um salto para a série, a volta de Sheldon depois de uma temporada andando de trem, quando deixou o grupo, inconformado com o fato de que seu colega de quarto Leonard se casaria e o deixaria só. Ele reaparece só de cueca e camiseta e um tanto desorientado. Outra mudança vem do corte de cabelo de Penny, mais curto. Mas, além disso, muito pouca coisa mudou na série.

Uma mudança que foi repentina se deveu à morte da atriz que faz a mãe de Howard. Ela faleceu durante as filmagens e resolveram homenageá-la, matando também a personagem. Isso acabou rendendo dois episódios, mas também não muito inspirados. Agora o fantasma da mãe do judeu baixinho está lá em Bernadette, cada vez mais apresentada como uma mulher de dar medo, vide a cena da entrevista de emprego de Penny com um profissional da indústria de laboratórios farmacêuticos.

Vamos ver o que teve de bom (ou quase) nesta fraca oitava temporada:

1. "The Commitment Determination" – O episódio que encerra a temporada serve mais para disfarçar os problemas da série. Mas pelo menos é bom, trazendo ganchos envolvendo os relacionamentos dos três casais ainda solteiros.

2. "The Focus Attenuation" – Enquanto as meninas viajam para Las Vegas, os rapazes festejam a liberdade de inventar algo legal. Acontece que tudo que eles encontram é falta de coragem, de foco e muita procrastinação, uma palavrinha muito comum nos dias de hoje.

3. "The Leftover Thermalization" – Um blecaute faz com que a turma se junte para uma verdadeira homenagem à mãe de Howard, depois de uma crise envolvendo um artigo de revista científica que só traz o nome de Sheldon, não o de Leonard, o verdadeiro idealizador.

4. "The Maternal Combustion" – O encontro entre duas mães que não poderiam ser mais diferentes: a de mentalidade criacionista, mãe de Sheldon, e a extremamente racionalista, a mãe de Leonard.

5. "The Champagne Reflection" – O episódio em que Bernadette descobre o que seus amigos realmente pensam dela. Enquanto isso, Leonard, Raj e Howard descobrem algo no escritório de um professor morto.

quinta-feira, maio 07, 2015

UMA LONGA JORNADA (The Longest Ride)



O título brasileiro da nova adaptação de um best-seller de Nicholas Sparks combina perfeitamente com a duração morosa das histórias desinteressantes que se desenrolam neste UMA LONGA JORNADA (2015), que conta duas histórias em épocas diferentes: a dos dois jovens que se conhecem em um campeonato de rodeio e a de um senhor idoso que é resgatado após um acidente de automóvel.

Na história principal, digamos assim, Sophia (Britt Robertson) é uma jovem prestes a viajar para Nova York e começar uma carreira dentro do meio das artes plásticas, sua paixão. O destino não poderia ser mais irônico ao fazer com que ela se apaixonasse por Luke, um peão de rodeio vivido por Scott Eastwood, filho do ator e diretor Clint Eastwood.

Aliás, é impressionante a semelhança de Scott com o pai, principalmente os olhos, que até já apresentam os mesmos pés-de-galinha que o pai já mostrava nos filmes que fez na década de 1960, como os westerns de Sergio Leone.

A história dentro da história é contada pelo velho Ira (Alan Alda), que cria um vínculo afetivo com a jovem Sophia, já que a história dele e do amor de sua vida guarda semelhanças com a do jovem casal que ele conheceu. Porém, tirando um momento aqui e outro acolá (como o caso da adoção de um garoto), trata-se de uma história ainda mais aborrecida que a de Frank e Sophia. Os personagens não são suficientemente bons, o texto é pobre e as tentativas de emocionar são frustrantes e/ou piegas.

Não que se esperasse muito de mais uma adaptação de filmes com a marca Sparks, mas, dependendo do elenco ou direção, o resultado poderia ser satisfatório, como foram os casos de UM AMOR PARA RECORDAR (2002) e DIÁRIO DE UMA PAIXÃO (2004). Mas, ao que parece, esses filmes tendem a se tornar piores com o tempo, à medida que entram numa zona de conforto que prejudica a possibilidade de criação de melhores filmes.

É só pensar nos filmes posteriores e tentar lembrar momentos realmente interessantes ou emocionantes. São todos filmes esquecíveis, mesmo aqueles que trazem atores mais experientes, como foi o caso de NOITES DE TORMENTA (2008), com Richard Gere e Diane Lane. E nem adianta colocarem cenários lindos ao fundo, que é o que sempre fazem.

Mas o pior de tudo é que eu acabo vendo todos esses filmes e certamente verei o próximo, A ESCOLHA, previsto para o ano que vem, que contará com a belíssima Alexandra Daddario. Assim é covardia. E por falar em moças bonitas, UMA LONGA JORNADA traz uma coadjuvante muito especial, que rouba a cena sempre que aparece e deixa Britt Robertson comendo poeira.

Trata-se de Melissa Benoist, que faz o papel de Marcia, a melhor amiga de Sophia. A moça pode ser vista em NÃO OLHE PARA TRÁS, como uma simpática atendente de hotel; como a namoradinha passageira do baterista obcecado de WHIPLASH – EM BUSCA DA PERFEIÇÃO; e será a nova Supergirl, na série de tevê cuja temporada foi aprovada recentemente. Muito justo.

quarta-feira, maio 06, 2015

ENTRE ABELHAS



O novo filme estrelado por Fábio Porchat merece parabéns mais por suas intenções do que por suas reais qualidades. ENTRE ABELHAS (2015), de Ian SBF, é uma tentativa de se fazer um drama de natureza fantástica utilizando um ator geralmente associado a comédias. Inclusive, há também presença de outros colegas de Porchat do canal humorístico Porta das Fundos no filme, como Letícia Lima, no papel de uma prostituta, e Luis Lobianco, como o atendente de uma pizzaria. São de Lobianco, aliás, as cenas que funcionam como alívio cômico do filme, os momentos em que é possível de fato gargalhar.

Mas as expressões sempre tristes e desoladas de Porchat e o seu drama fora do comum acabam contando pontos, pois é algo que foge à tradicional tendência do atual cinema brasileiro voltado para os cinemas de shopping de só apostarem em comédias. Não que a comédia seja um gênero ruim, ao contrário, é muito nobre, mas não deve ser a única coisa que se vende no cinema brasileiro contemporâneo.

Na trama, Bruno (Porchat) é um montador de vídeo que “comemora” a separação com os amigos em um bar repleto de prostitutas. Ainda abalado e ainda apaixonado pela ex-esposa (Giovanna Lancellotti), ele segue abalado e perdido, morando por enquanto no apartamento da mãe, enquanto consegue outro lugar para morar. Enquanto isso, coisas estranhas começam a acontecer: as pessoas começam a desaparecer de sua vista e de seus ouvidos, como o motorista de taxi, que some misteriosamente. A única pessoa para quem ele conta isso é sua mãe (Irene Ravache). Nem mesmo seu melhor amigo (Marcos Veras) sabe de seu drama.

Infelizmente o resultado em si não é muito satisfatório e o que era para ter resultado em um drama com toques mais melancólicos ou cujos elementos fantásticos contribuíssem para uma obra instigante, acaba naufragando nas boas intenções, mesmo tendo gente boa como Irene Ravache em papel de destaque.

Isso se deve em parte ao roteiro pouco inspirado, que aposta em uma boa ideia, mas que não sabe como desenvolvê-la. O que também não quer dizer que ENTRE ABELHAS não valha a conferida nos cinemas. A mudança de tom e o estranhamento gerado acabam sendo, de certa forma, bem-vindos em um mercado que, ao que parece, está tentando se diversificar.

Recentemente, por exemplo, tivemos um ótimo exemplo de história de amor séria no cinemão, o drama PONTE AÉREA, e vêm aí mais exemplares do cinema de horror brasileiro para breve. Isso aponta uma saudável variedade que vai depender não só da qualidade do material, mas da boa disposição e do interesse do público.

segunda-feira, maio 04, 2015

NOITE SEM FIM (Run All Night)



Não falta estilo em Jaume Collet-Serra, o que já dava para notar em seus dois bons filmes de horror, A CASA DE CERA (2005) e A ÓRFÃ (2009), e em seus dois trabalhos anteriores com Liam Neeson, DESCONHECIDO (2011) e SEM ESCALAS (2014). Mas infelizmente ser estiloso não é tudo e por mais que a estética de NOITE SEM FIM (2015) seja agradável aos olhos, o filme é uma decepção, a julgar pelo bom diretor e todo o bom elenco envolvido, sem falar na possibilidade de fazer um thriller cuja tensão e violência fossem exploradas da melhor maneira possível.

Em vez disso, o que vemos é um filme que vai se tornando cada vez menos empolgante, à medida que se aproxima de sua conclusão. Muito por causa de um roteiro ruim, de um texto ruim. Collet-Serra não é suficientemente bom para salvar um roteiro ruim apenas com sua força na direção. O roteirista é o mesmo de TUDO POR JUSTIÇA (2013), de Scott Cooper, um bom filme, mas não exatamente memorável. Cooper ao menos fez um melhor trabalho.

Quanto a NOITE SEM FIM, interessante como ele tinha tudo para ser muito bom. O trailer é bastante convidativo e temos Ed Harris como um homem poderoso e pronto para matar, o que acaba por nos fazer lembrar de seu antológico papel em MARCAS DA VIOLÊNCIA, de David Cronenberg. Harris interpreta um homem de negócios que já teve muita relação com tráfico de drogas no passado, mas que agora quer manter-se limpo e lucrar honestamente.

O problema é que seu filho traz um traficante de heroína para sua casa, e como ele não aceita negociar com ele, o filho acaba pagando com a vida, enquanto o pai quer se vingar daquele que matou o seu garoto-problema, o seu velho empregado de longa data vivido por Liam Neeson, numa espécie de leão-de-chácara decadente.

Neeson faz o já velho papel de homem que não merece perdão, que cabe bem em heróis de ação maduros como ele. Uma pena que isso não é bem explorado, assim como também não é o seu relacionamento com o filho (Joel Kinnaman), que dirige uma limusine. O encontro dos dois acabou acontecendo justamente por causa do tal ataque dos traficantes ao filho do chefão. Kinnaman ainda segura a mesma persona meio malandro meio gente de confiança que assumiu no melhor papel de sua carreira até o momento, o do detetive Holder, da série THE KILLING.

No fim, o que acaba contando mesmo é a correria desenfreada, a câmera que nos localiza geograficamente na cidade como se fosse em um videogame, a movimentação em torno da situação complicada do protagonista, ao estar fugindo dos capangas do chefe e também da polícia, boa parte dela corrupta. E não deixa de ser interessante ter também Vincent D’Onofrio, que fez Wilson Fisk na série do Demolidor, neste cenário em que a lei está contaminada. Ah, e destaque também para Common, como um matador profissional que se bem aproveitado seria assustadoramente perfeito no enredo. Pena que em se tratando de NOITE SEM FIM sempre ficamos no “se...”.

domingo, maio 03, 2015

A PAIXÃO DE JL



O título do filme de Carlos Nader já diz muito do que veremos no documentário vencedor do É Tudo Verdade 2015. A PAIXÃO DE JL (2015) nos apresenta à história contada pelo próprio José Leonilson, artista plástico cearense radicado em São Paulo, que ficou famoso por seus trabalhos íntimos e bastante ligados à sua vida privada e às suas inquietações. E essa história já se sabe que terá um final amargo. Afinal, como artista conhecido que é, muitos já sabem que Leonilson morreu em decorrência do vírus da AIDS, na década de 1990.

Em nenhum momento o diretor Carlos Nader utiliza depoimentos ou algo do tipo. A não ser por algumas imagens que situam a situação política do Brasil e do Mundo (a queda do Muro de Berlim, a eleição e o impeachment de Collor, o primeiro bombardeio dos Estados Unidos ao Iraque), todo o filme é contado através das gravações deixadas em fitas cassete por Leonilson.

São gravações muito íntimas. Falam de seus amores por rapazes, de seu medo em desapontar seus pais dizendo a eles ser gay, do medo da AIDS, de seu sentimento de solidão, entre outras coisas que lhe inquietavam ou em algum momento lhe alegravam. No começo, o tom é até alegre, pois a sombra do vírus HIV ainda não o assombrava tão fortemente, e o que mais era objeto de observação eram mesmo os homens que amou.

Esses sentimentos são entrecortados por trechos de filmes e clipes que ele viu e que o marcaram, como três filmes de Wim Wenders (PARIS, TEXAS; ASAS DO DESEJO; e UM FILME PARA NICK) e um videoclipe da Madonna ("Cherish"), que muito nos faz lembrar outro artista muito querido e que também tinha Peixes forte em sua carta natal, Renato Russo. E que também teve destino semelhante.

O signo de Peixes é mencionado diversas vezes no início do filme, como símbolo até mesmo de autoafirmação, mesmo se tratando do signo mais sensível e depressivo do zodíaco (vide a vida e a morte de outro pisciano célebre, Kurt Cobain). No clipe de "Cherish", inclusive, Madonna aparece de sereia. Nos desenhos e nos quadros de Leonilson, o símbolo de Peixes também é desenhado com frequência, assim como há imagens da água, numa alegoria da vastidão do mar e das emoções que ele leva e traz.

Um dos exemplos mais bonitos dessa sensibilidade extrema de Leonilson é quando ele chora ao imaginar as pessoas indefesas de Bagdá sendo mortas ou feridas pelas bombas dos americanos. Algo que a imprensa apresentou como luzes descendo sobre uma cidade à noite, sem destacar explicitamente a violência e a crueldade do ato, as pessoas mais sensíveis sabiam que ali estava acontecendo algo muito trágico.

O artista plástico também questiona a própria missão de Jesus para salvar a humanidade, principalmente quando se vê orando a Deus e depois se perguntando o porquê de Ele ter colocado nele um mal tão grande quanto a AIDS, algo que o fazia pensar dia e noite, desde o dia em que ele resolveu fazer o teste. A gravação da véspera do resultado do teste chega a ser perturbadora.

As cenas dos filmes citados por Leonilson também ajudam a compor um quadro bonito e poético. Quem viu os filmes sabe o quanto eles são impregnados de poesia e uma vez que o ligamos ao sentimento do protagonista, essa poesia se reverbera, como a figura de Harry Dean Stanton perambulando anos a fio pelo deserto em PARIS, TEXAS, sem saber para onde ir, depois de uma situação que o perturbou. Talvez seja preciso ter visto o filme de Wenders para entender essa dor.

Mas o filme não seria tão especial se não nos presenteasse com as obras de Leonilson, mostradas em paralelo com os acontecimentos de sua vida, e fazendo com que compreendamos melhor suas intenções e sua genialidade, ao utilizar recursos tão baratos e simples para criar uma obra de arte única, tanto os desenhos que costumam repetir a figura de um homem nu (ele mesmo) e as diversas telas com tecidos.

Ver A PAIXÃO DE JL, portanto, é não apenas acompanhar a jornada dolorosa dos quatro últimos anos de vida de Leonilson, mas é também ter a oportunidade de ouro de apreciar a sua arte com o privilégio de ter o próprio artista apresentando-a, através de uma mídia poderosa como o cinema.

sábado, maio 02, 2015

ELA VOLTA NA QUINTA



Interessante como o jovem cineasta mineiro André Novais Oliveira continua apostando na aparente simplicidade a fim de criar um corpo de trabalho inteligente e mais uma vez calcado no cotidiano como objeto de inspiração. Em seu primeiro curta, FANTASMAS (2009), ele utiliza um recurso inteligentíssimo para tratar de um assunto ligado a relações amorosas passadas. Em POUCO MAIS DE UM MÊS (2013), lá estava ele expondo a si mesmo discutindo relação com a namorada, que também aparece em sua estreia em longa-metragem, ELA VOLTA NA QUINTA (2014), que é ainda mais extremo nessa exposição, embora saibamos que há toda uma construção de ficção e de encenação ali, embora quase nos esqueçamos da câmera em alguns momentos.

Como o próprio André também é personagem da história protagonizada por seus pais, Norberto e Maria José, a câmera ganha um status bem convincente de onisciente. Até porque ela vê e nos mostra aquilo que André, o personagem, não sabe. Em alguns momentos é possível perceber um pouco da fragilidade dos (não) atores à frente das câmeras, como na cena da dança ao som de uma canção do Roberto Carlos, mas na grande maioria das vezes o método do diretor de deixar fluir – pelo menos aparentemente – a fala dos personagens, contribui para o seu caráter de verdade.

O melhor exemplo disso é uma cena em que a mãe de André está sozinha com ele no quarto. Ele confere sua pressão arterial, manifesta preocupação com sua saúde, e ela lhe conta algo sobre o pai dela, que segundo ela também era canceriano como André, gostava de sonhar, era pouco pragmático. Como do outro lado da tela sabemos que André é cineasta e que a vida de cineasta no Brasil não é fácil, por mais que isso não seja explicitado no filme, o diretor acaba por tornar a atividade de diretor de cinema no Brasil ainda menos glamorosa do que ela de fato é.

E glamour é uma palavra que está riscada do vocabulário de ELA VOLTA NA QUINTA, a não ser que seja para fazer uma negação, já que os personagens aparecem com seus trajes do cotidiano, sem maquiagem ou coisa do tipo. A fotografia também tem uma textura bem simples, sem o interesse de enfeitar a realidade. Uma fotografia cheia de filtros seria algo contrário às intenções do filme, cuja simplicidade só não é maior pois não se trata de uma obra que agradaria o grande público. É mesmo o caso de ser direcionado ao circuito alternativo, que já conta com um público mais preparado para o novo ou o diferente. Não sei o quanto a experiência de VENTOS DE AGOSTO, que foi exibido em cinemas de shopping, foi recompensadora. Ouvi depoimentos de pessoas revoltadas com o filme, inclusive. Se bem que é bem legal quando isso de vez em quando acontece. :)

Desses filmes que borram a realidade e a ficção em sua construção narrativa, talvez ELA VOLTA NA QUINTA encontre mais semelhanças com CASTANHA, de Davi Pretto, que também lida com um personagem real e mistura elementos de uma pessoa real com elementos inventados pelo roteirista/diretor. Mas o filme de Novais é bem menos sombrio e mais afetuoso.

Aqui, fica no ar até que ponto a crise no casamento de seus pais foi um elemento puramente fictício ou se foi inspirado em algo que já estava mesmo ocorrendo. Ou se a saúde frágil de sua mãe também já estava de alguma maneira presente.

As respostas para essas questões até seriam interessantes numa entrevista com o diretor, mas seria mais algo a acrescentar às nossas curiosidades em relação à vida alheia do que de fato um elemento que contribuiria para melhorar nossa admiração pelo trabalho do diretor, que se revela um autor de primeira linha que merece toda nossa atenção. Pra quem é fã de John Cassavetes, inclusive, eis mais uma razão para acompanhar seus trabalhos.

sexta-feira, maio 01, 2015

PERMANÊNCIA



Mais um belíssimo exemplar do cinema pernambucano pôde ser visto nesta noite de sexta-feira no Cinema do Dragão. PERMANÊNCIA (2014) é o primeiro longa-metragem de Leonardo Lacca, que já havia ensaiado este trabalho no curta DÉCIMO SEGUNDO (2007), também com Irandhir Santos e Rita Carelli. Inclusive no curta, os silêncios são mais incômodos, há uma tensão até maior em uma obra que foi feita inicialmente com a vontade de ser um longa, mas que funciona bem naquele modelo também.

Lacca, como bom preparador de elenco que também é, afirmou em debate após a sessão que teve cerca de um mês para ensaiar com os atores as cenas. E nota-se que isso contribuiu bastante para o resultado. Os diálogos são pontuados por espaços de silêncios, mas eles são importantes, especialmente ao mostrar uma insegurança por parte dos personagens diante de situações desconfortáveis.

No caso, a situação incômoda se estabelece quando Ivo, personagem de Irandhir, se hospeda no apartamento de Rita (Carelli), sua ex-namorada, mas que agora está casada. O sentimento entre os dois, porém, continua latente e prestes a explodir. Uma vez que se vê DÉCIMO SEGUNDO, fica-se até um pouco surpreso ao ver o quanto essa explosão pode se apresentar repentina, embora a sensação de paralisia, no sentido joyciano do termo, se aplique ao longo de boa parte do filme.

PERMANÊNCIA também lida com questões que permeiam o título, ao trazer Ivo como sendo um fotógrafo que veio de Recife para São Paulo para a sua primeira exibição pública de um trabalho individual em uma galeria. A permanência, no caso, também poderia se relacionar à própria característica da arte fotográfica, embora também se estenda para outros aspectos no filme.

Interessante como o filme parece uma obra viva, que ganha vida própria à medida que outros elementos são acrescentados, como a figura do pai de Ivo, que é apresentado inicialmente em uma agradável cena de passeio noturno, e principalmente da aventura amorosa e/ou sexual, durante a passagem de Ivo pela cidade. Essa nova garota, por exemplo, acaba ajudando a tirar o foco do protagonista na amiga casada. Nem que seja por alguns instantes.

A presença de Ivo lá naquele apartamento pode ser também para enfrentar velhos temores (o filme já começa com o seu medo de elevador), ou antigas paixões que teimam em permanecer. Se bem que o filme deixa espaço para interpretações que podem fazer pensar sobre as motivações de Ivo, especialmente nos instantes finais.

Aliás, há no filme todo um certo ar de mistério, que talvez seja o segredo de sua força. Claro que há todo um trabalho de dramaturgia e de posicionamento e elegância dos planos que contribuem para sua beleza. Mas o filme de alguma maneira transcende a mera história sobre amores passados e isso se deve ao ser caráter discretamente misterioso. E isso pra mim é marca de grande cinema.