quarta-feira, abril 22, 2015

DEMOLIDOR – A PRIMEIRA TEMPORADA COMPLETA (Daredevil – The Complete First Season)



E até que enfim a Marvel consegue chegar a um nível de verdadeira excelência em um de seus produtos audiovisuais. Sem querer reclamar dos bons e divertidos filmes, principalmente os mais sérios, como os dois protagonizados pelo Capitão América, o cinema traz muitas imposições para os filmes, a fim de atingir uma fatia maior de público, como os adolescentes, que, merecidamente, querem ver seus heróis dos quadrinhos na telona.

O que aconteceu com DEMOLIDOR (2015), a primeira de quatro séries que a Marvel lançará até o ano que vem (as outras são A.K.A. JESSICA JONES, LUKE CAGE e PUNHO DE FERRO, e em seguida os quatro heróis juntos em uma minissérie), foi quase um milagre. A série criada por Drew Goddard, diretor de O SEGREDO DA CABANA (2012), é um reflexo do que foi a fase de ouro do herói da Cozinha do Inferno nos quadrinhos, quando Frank Miller passou a assumir os roteiros. Toda a tragicidade que o personagem carrega foi acentuada por escritor e desenhista de maneira mais intensa e violenta em sua passagem pelo título do herói nos quadrinhos a partir do final da década de 1970.

E violência não falta nesta série produzida para a Netflix, com direito a mãos e cabeças decepadas, uma luta com um ninja de arrancar pedaços de carne, brigas corporais brutais etc. É como se toda aquela leveza e aquele humor incômodos dos filmes da Marvel recebessem uma resposta à altura por alguém que quer mudar o estado das coisas. E isso é motivo de celebração. Afinal, DEMOLIDOR não é apenas a melhor série de super-heróis já feita, mas a melhor série dramática do ano até o momento, pelo menos em comparação com as demais que acompanho.

A escalação de atores foi muito feliz. Charlie Cox convence muito bem como o advogado cego e vigilante do crime Matt Murdock, assim como é uma alegria ter Deborah Ann Woll (a adorável vampira Jessica, de TRUE BLOOD) no papel de Karen Page. Elden Henson faz um Foggy, o melhor amigo de Matt, muito bem e até a escolha de um ator negro para viver Ben Urich (Vondie Curtis-Hall) foi feliz. Enxergamos o repórter investigativo naquele ator. Mas de que adiantaria tanta gente boa se Vincent D’Onofrio não encarnasse um Wilson Fisk tão majestoso?

A série é também um manancial de informações e deixas para fãs do herói cego perceberem, como, por exemplo, a citação de uma certa moça grega que Matt conheceu na faculdade. Não que essas informações tornem a série exclusiva para os iniciados do herói nos quadrinhos. Não. Qualquer pessoa que não conhece nada a respeito do Demolidor pode muito bem se deliciar com uma trama narrada em episódios que vão num crescendo de qualidade, excitação e angústia. Justamente como tem que ser.

E o interessante é que não sentimos falta do uniforme vermelho, que talvez até estrague um pouco o clima mais realista que a série adota durante a primeira temporada, em que Matt Murdock usa apenas um pano preto amarrado ao rosto. Assim, ele fica conhecido como o misterioso homem mascarado da região e o principal inimigo de Wilson Fisk, o poderoso chefão que comprou a polícia, os jornais e quem mais ele puder.

Alguns episódios são particularmente especiais, como "Stick", quando a série introduz na narrativa a figura do homem cego que ensinou as artes marciais para Matt quando ele era uma criança e vivia em um orfanato. O episódio "Speak of the devil" traz uma das lutas mais viscerais de toda a série, com Matt lutando com uma espécie de ninja japonês armado com uma lâmina mortal que o deixa em pedaços. É o tipo de luta que não se costuma ver em filmes americanos. Como as séries de televisão estão mais abertas para a violência, esse tipo de coisa acabou passando e é muito bem-vindo.

Outro episódio marcante é "Nelson v. Murdock", que lida com a relação entre os dois amigos e parceiros na firma de advocacia. Por uma situação x, a amizade dos dois passa por uma crise inédita e somos apresentados a momentos do passado dos dois, em um flashback dos tempos da faculdade. A série enfatiza o forte sentimento de amizade de maneira tocante. É mais um indicativo de que não estamos vendo uma série qualquer, mas uma que sabe lidar muito bem com o enredo, com os personagens e com os sentimentos envolvidos.

Enfim, daria para falar de cada um dos episódios e de vários outros personagens interessantes, mas uma coisa é certa: a Marvel agora pode se orgulhar de ter em seu currículo um material de alto nível, e de ter adaptado um herói tão querido para uma mídia que certamente alcançará a um público maior.

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