domingo, novembro 09, 2014

MAIS UM ANO (Another Year)























Os filmes de Mike Leigh se caracterizam basicamente por mostrar, de maneira muito delicada, a melancolia na vida dos personagens. De vez em quando ele coloca personagens que fogem a esse universo, como em SIMPLESMENTE FELIZ (2008), em que a protagonista tem uma alegria de viver que desconcerta os demais personagens.

Esse universo pesaroso do diretor aparece logo na primeira cena de MAIS UM ANO (2010), em que vemos uma senhora que simplesmente não vê sentido na vida e só quer apenas remédios para dormir. Ela é interpretada por Imelda Staunton, que já havia protagonizado um outro trabalho de Leigh, O SEGREDO DE VERA DRAKE (2004). Trata-se de uma personagem interessante e é uma pena que ela fique para trás nos demais capítulos.

Os protagonistas aqui são pessoas mais felizes e equilibradas: o casal Tom (Jim Broadbent) e Gerry (Ruth Sheen). Eles são os anfitriões que, ao longo de quatro estações, recebem amigos e familiares, num recorte que não confunde o espectador com as elipses. Não é por causa delas que o filme vai ficar mais difícil. Pode ser difícil para um espectador que não tenha paciência para filmes lentos e reflexivos, como é bem o caso de MAIS UM ANO.

Uma personagem que é bem típica dos filmes melancólicos de Leigh é a melhor amiga de Gerry, a atrapalhada Mary (Leslie Manville). Trata-se da personagem mais interessante do filme, com sua vida cheia de decepções e sua fuga da realidade através da bebida ou da negação. Nem sempre ela consegue disfarçar, como quando um jovem de quem ela gosta apresenta a nova namorada. Mary está presente em todas as estações do filme e por isso é tão importante e fácil de o espectador ser solidário com seus problemas e aflições. No final, tudo parece se resumir à solidão, já que os demais, quando estão juntos com alguém ou namorando, parecem estar mais felizes.

Em MAIS UM ANO, Leigh não se importa em filmar longos planos e longas conversas em torno de apenas um único espaço físico. Se o texto não fosse tão bom e não houvesse um trabalho tão bem desenvolvido com os atores certamente o filme seria um desastre. Mas Leigh faz um filme que poderia ter sido derivado de uma peça de teatro, mas que não é. Trata-se de uma autoafirmação de um cinema intimista e humano que pouco se vê atualmente. Há um equilíbrio de forças entre aquelas pessoas felizes com a vida que levam e aquelas infelizes (Mary e o amigo bêbado do casal, por exemplo) e por isso o filme não se transforma num muro de lamentações, como acontece, por exemplo, com AGORA OU NUNCA (2002).

Uma pena que essa belezura de cinema para gente adulta só tenha sido distribuído no país quatro ano depois de seu lançamento no Reino Unido. E se não tem como ser um sucesso do pequeno circuito como foi SEGREDOS E MENTIRAS (1996), trata-se de um dos filmes mais cultuados do cineasta por muitos cinéfilos que acompanham a sua obra. Afinal, só o plano final já é de uma beleza agridoce extraordinária. MAIS UM ANO bem que mereceria ser mais reconhecido.

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