sábado, novembro 30, 2013

JACKASS APRESENTA: VOVÔ SEM VERGONHA (Jackass Presents: Bad Grandpa)























Impressionante a transformação de Johnny Knoxville neste senhor de 86 anos. Por baixo de tanta maquiagem, o principal performer do programa JACKASS (2000-2002) e dos longas-metragens para cinema e vídeo posteriormente produzidos ganha o corpo de Irving Zisman, um senhor idoso que fica feliz da vida quando o médico lhe dá a notícia de que sua esposa faleceu. Finalmente ele se sente livre depois de tantos anos sob o julgo daquela velha chata, segundo suas palavras. O que pode atrapalhar um pouco essa liberdade que ele quer ter é o neto (Jackson Nicoll), que ele precisa entregar ao pai irresponsável porque a mãe do garoto foi para a cadeia.

Mas esse fiapo de história é apenas uma desculpa para que VOVÔ SEM VERGONHA (2013) mostre as tradicionais pegadinhas do programa. Com a cumplicidade de alguns atores, Knoxville deixa muita gente boquiaberta com as presepadas de seu personagem. O trailer já antecipa algumas cenas, como a do garotinho vestida de menina para um desfile de mini misses, ou a cena de Irving roubando pão no supermercado, ou fazendo uma confusão em pleno velório da esposa.

A preocupação de muitos é se essas já são as melhores piadas ou se há algumas ainda na manga. A boa notícia é que há, sim, cenas ainda mais engraçadas, como a visita de Irving a um clube para mulheres ou as várias cantadas que ele passa nas mulheres na rua. São momentos como esses que transmitem veracidade ao personagem, que parece mesmo um velho enxerido.

No entanto, VOVÔ SEM VERGONHA é bem irregular e algumas piadas não funcionam. Isso faz com que seja um filme assistível e divertido, mas nada imperdível. Uma das melhores coisas do filme é o garotinho que faz o neto, que dá um show e também tem os seus momentos de fazer pegadinhas, como quando pede a estranhos na rua para serem seus pais e deixando muita gente sem jeito. É ele o diferencial de um filme que tem por base as esquetes de pegadinhas levadas às últimas consequências características do programa. Se bem que aqui não pegam tão pesado em comparação com os filmes e os episódios de JACKASS.

sexta-feira, novembro 29, 2013

DOCE AMIANTO























Curiosamente, neste ano de 2013, a quantidade de filmes com temática gay, ou que tangenciam tal temática, aumentou consideravelmente. Além do já tradicional "novo trabalho de Almodóvar", no caso, OS AMANTES PASSAGEIROS, vimos chegar às telas o prestigiado DEIXE A LUZ ACESA, o pouco visto ESSE AMOR QUE NOS CONSOME, o premiado TATUAGEM e agora entra em cartaz DOCE AMIANTO (2013). Até o final do ano, ainda teremos os franceses UM ESTRANHO NO LAGO e AZUL É A COR MAIS QUENTE. Sinal de que boa parte desses filmes não estão restritos a festivais de diversidade sexual.

Mas o mais interessante dessa produção é que há um interesse, antes de tudo, em fazer cinema, acima do interesse em buscar um lugar ao sol dentro de um circuito que reflete uma sociedade ainda preconceituosa. O caso de DOCE AMIANTO, de Guto Parente e Uirá dos Reis, é representativo dessa vontade de fazer cinema. Os personagens, inclusive, embora se vejam como homens travestidos e cheios de purpurina e coisas do tipo, em nenhum momento têm sua sexualidade questionada. Amianto é uma princesa e Blanche é sua fada madrinha. Uma fada madrinha que, inclusive, é dita como uma pessoa morta. O fato de ela ter uma volumosa barba não faz muita diferença para a narrativa, embora seja elemento de estranheza fundamental.

É o caso de filme que tem um senso de humor todo próprio por apresentar as personagens dessa maneira, mas, paradoxalmente, como em vários trabalhos de Pedro Almodóvar, é também um filme que pede a seriedade e o respeito do espectador, já que se trata de um drama sobre uma princesa que foi rejeitada por seu grande amor e, depressiva, encontra consolo em Blanche, que a ajuda a passar por aquele momento difícil.

No entanto, essa pequena sinopse não representa exatamente o filme, já que há uma intenção muito mais de exibir cenários e cores diferentes do que de contar uma história. Ainda assim, um dos momentos mais fascinantes de DOCE AMIANTO, no que se refere à narrativa, é justamente a história dentro da história: Blanche conta sobre um homem que acorda verde e cheio de pintas vermelhas. Esse conto é tão interessante que até chega a eclipsar a narrativa principal, mas serve para reforçar o fato de que aquele conto de fadas está longe de apresentar um final feliz ou a ingenuidade típica do gênero.

Como cinema, a influência mais nítida é a de David Lynch, seja no uso das cores (o azul quando está presente torna o filme mais sombrio e triste), seja no uso dos fade ins e da estranheza. É um passo corajoso dos jovens realizadores do coletivo Alumbramento, sediado em Fortaleza, que aqui constroem também uma música interessante e que dialoga com a narrativa. O que pode incomodar ou pelo menos atrapalhar um pouco a apreciação dos momentos mais poéticos (o filme começa com uma citação de Walt Whitman), especialmente os declamados por Amianto, é o uso constante do falsete por parte da protagonista. Porém, é importante lembrar que se fossem atrizes no lugar de Deynne Augusto e Uirá dos Reis seria um outro filme. Provavelmente menos interessante e certamente bem mais convencional.

quarta-feira, novembro 27, 2013

QUATRO CURTAS
























Os curtas abaixo foram vistos, em sua maioria, porque serviram de ensaio ou de inspiração para longas-metragens que os sucederam. A exceção é NOITE E NEBLINA (1955), de Alain Resnais, que foi visto com um empurrãozinho da edição especial dedicada ao cinema da revista Superinteressante.

NOITE E NEBLINA (Nuit et Bouillard) 

Quem viu HIROSHIMA, MEU AMOR (1959) pôde sentir um arrepio causado pelas cenas que mostram o museu com os restos mortais de algumas vítimas da bomba atômica de 1945. Pois NOITE E NEBLINA é muito mais devastador para o nosso espírito. Pode-se dizer que é um filme de horror, com a diferença que tudo que está sendo mostrado é verdade. Imagens chocantes dos judeus esqueléticos e tratados como lixo, sejam vivos, sejam mortos, sejam empilhados em uma cova ou em um dormitório. A narração é do poeta Jean Cayrol, um sobrevivente dos campos de concentração, que torna tudo ainda mais incômodo, mas também lírico. Uma obra-prima que nos faz lembrar até que ponto a maldade humana é capaz de chegar.

MAMÁ

O cartão de visitas de Andrés Muschietti, MAMÁ (2008) é um curtíssimo filme sobre duas irmãs que se assombram com a chegada de uma criatura horripilante e misteriosa que elas chamam de "mamãe". O domínio do diretor na construção de uma atmosfera de horror em tão pouco tempo é admirável. E deixou admirado também Guillermo Del Toro, que o contratou para dirigir o belo e geralmente subestimado MAMA (2013), que pôde explorar não só o horror mas também o melodrama.

RITA 

Outro curta que se mostrou a base para um longa-metragem de estreia, RITA (2009), dos diretores Fabio Grassadonia e Antonio Piazza, conta a história de uma garotinha cega que teve sua casa invadida e sua família chacinada por um bandido mafioso. Posteriormente, ela acaba tendo uma relação de maior proximidade com o assassino. A trama foi ampliada em SALVO – UMA HISTÓRIA DE AMOR E MÁFIA (2013), que revela o apuro técnico cada vez mais sofisticado dos diretores, mas que ainda sofre de problemas de dramaturgia, construção de personagens etc.

EMAK-BAKIA 

O que me fez ir atrás deste curta vanguardista de Man Ray foi um filme basco de título bem semelhante, EMAK BAKIA (2012), dirigido por Oskar Alegria e vencedor dos prêmios mais importantes do Cine Ceará 2013. O filme de Alegria é mais do que uma homenagem ao curta de Ray, mas falaremos do longa em outra ocasião. EMAK-BAKIA (1926) não é fácil de descrever em poucas linhas. Nem mesmo em muitas. A não ser se visto várias vezes e fazendo apontamentos. Uma das primeiras imagens já chama a atenção: um homem olhando em um microscópio e o seu olho aparecendo em uma lente, olhando em nossa direção. As imagens que sucedem este momento são aparentemente aleatórias (flores, luzes, imagens desfocadas, o mar, peixes, uma estranha mulher de máscara dirigindo um carro) num misto de inquietude e paz que o torna único. Não à toa, Man Ray é considerado um dos maiores nomes do surrealismo do início do século XX. Os cordeiros passando pela tela, inclusive, lembram o trabalho de outro mestre surrealista: Luis Buñuel e seu O ANJO EXTERMINADOR.

terça-feira, novembro 26, 2013

O BAILE DOS BOMBEIROS (Horí, Má Panenko)























Segundo Mark Cousins, em seu livro História do Cinema, a cinematografia mais inovadora da Europa Oriental era a produzida na Tchecoslováquia. O BAILE DOS BOMBEIROS (1967), de Milos Forman, foi visto por mim acidentalmente. Era um dos filmes que constava na lista de favoritos de Stanley Kubrick, e fiquei curioso em vê-lo, até por gostar de vários outros trabalhos posteriores do diretor, que fugiu para os Estados Unidos depois que o seu país foi invadido pelos soviéticos em 1968, na famosa Primavera de Praga.

O último filme que havia visto de Forman havia sido SOMBRAS DE GOYA (2006), que é sensacional. Mas O BAILE DOS BOMBEIROS tem outra pegada em comparação com o estilo narrativo mais clássico que ele adotou ao migrar para os Estados Unidos. Talvez isso se deva ao espírito da época, já que o ano de 1967 tem toda essa aura especial em torno de si, por ser um ano-chave para a contracultura. E O BAILE DOS BOMBEIROS é um filme engraçado à sua maneira, um tanto subversivo e que lembra também o cinema inglês da época, como SE..., de Lindsay Anderson.

Na trama, um grupo de bombeiros resolve fazer uma festa em comemoração aos 86 anos de seu comandante mais idoso. A cidade inteira é convidada, mas aos poucos alguém passa a roubar todos os presentes e o evento começa a perder o senso de ordem. Um dos momentos mais divertidos é o da seleção da rainha do baile, quando nenhuma das moças parece suficientemente bonita para receber o título e as que são bonitas não querem pagar tal mico.

Curiosamente, ainda que O BAILE DOS BOMBEIROS tenha sido realizado antes da Primavera de Praga, já havia uma censura forte no país e o filme quase não foi lançado. O próprio Forman costuma dizer que não havia intenção de sua parte em criticar o Governo utilizando metáforas, mas poucos acreditam nisso, até por ser uma característica do cinema do diretor essa vontade de denunciar as instituições. E isso vale tanto para a Igreja Católica, como no já citado SOMBRAS DE GOYA, quanto para as instituições psiquiátricas, no oscarizado UM ESTRANHO NO NINHO (1975), ou para a própria sociedade moralista americana, em O POVO CONTRA LARRY FLINT (1996).

segunda-feira, novembro 25, 2013

A CAÇA (Jagten)























A trajetória de Lucas, vivido com sensibilidade por Mads Mikkelsen, muito se parece com uma via-crúcis, já que sabemos de sua inocência. Em A CAÇA (2012), ele é um professor de jardim de infância que mora sozinho em uma pequena cidade, depois de ter se divorciado da mulher e tanto querer a guarda do filho, que prefere ficar com ele do que a com mãe. Ao mesmo tempo em que essa realidade passa a ser possível, ele começa um romance com uma das funcionárias da escolinha.

Porém, sua vida fica de pernas pro ar quando ele é acusado de pedofilia por causa da mentira de uma garotinha, que, tendo um sentimento confuso por aquele homem gentil, fica magoada quando ele lhe dá uma admoestação. Se tempos atrás uma acusação desse tipo não era tão considerada, nos dias de hoje, ser acusado de pedófilo é algo mais grave e doentio para a sociedade do que ser acusado de homicídio. O filme também leva em consideração a teoria de que crianças não mentem, principalmente no que concerne a esse tipo de assunto.

Uma das qualidades de A CAÇA é nos colocar nos sapatos de Lucas, fazer-nos ficar impotentes diante da situação, entender o seu momento de reclusão imposta pela sociedade e por ele mesmo, e torcer quando ele resolve ir à luta pelos seus direitos. A cena da briga no mercadinho é um dos momentos mais empolgantes do filme. Uma cena que é superada pela da igreja.

É neste momento que sentimos um pouco do Thomas Vinterberg de FESTA DE FAMÍLIA (1998), e vemos o quanto o diretor é bom em lidar com temas familiares, em especial os grandes e perturbadores atritos. Mas se em FESTA DE FAMÍLIA havia um olhar mais ácido para com aquela família, em A CAÇA, o que vemos é um carinho muito especial pelos personagens. Até mesmo pela garotinha, que até tenta voltar atrás com a história que mudou a vida daquele homem.

A figura de mártir de Mikkelsen certamente vai ficar guardada na memória dos espectadores ao saírem da sessão. E o ator que ficou famoso por viver alguns vilões do cinema e da televisão transforma-se em um homem bom, daqueles de quem gostaríamos de ser amigos. E como ele representa uma vítima do medo de nossa sociedade, podemos até nos sentir um pouco como culpados.

Como o Cristianismo, A CAÇA consegue dar um jeito de nos culpar pelo que aconteceu àquele homem bom, ao mesmo tempo em que nos passa sentimentos de solidariedade com sua dolorosa situação. Por isso não é nenhum exagero comparar o trabalho de Vinterberg a duas grandes obras de mártires de Mel Gibson: CORAÇÃO VALENTE e A PAIXÃO DE CRISTO. Embora a comparação deva guardar as devidas proporções.

sábado, novembro 23, 2013

SOBRENATURAL: CAPÍTULO 2 (Insidious: Chapter 2)























E ele conseguiu de novo. James Wan, o homem por trás do melhor título de horror do ano, INVOCAÇÃO DO MAL (2013), que recicla os clichês do gênero de forma brilhante e elegante em mais um filme sobre possessões e casas assombradas, agora retorna com a continuação de outro grande filme, SOBRENATURAL (2010). Embora sejam trabalhos com muitos elementos em comum, SOBRENATURAL e sua continuação, SOBRENATURAL: CAPÍTULO 2 (2013), são mais inventivos, criam um mundo novo, ideias novas, que até remetem em alguns momentos ao mundo sombrio e perturbador de TWIN PEAKS, com portas e universos espirituais que fazem com que a experiência de ver o filme seja mais do que sentir sustos.

Uma das características deste segundo filme é que ele não dá trégua para o espectador. Desde o prólogo, que remete à infância de Josh Lambert, o personagem de Patrick Wilson, passando depois para o retorno àqueles momentos perturbadores da conclusão do primeiro filme, em que o garoto foi salvo da entidade maligna, a vidente que auxiliou a família na recuperação do espírito do garoto morreu e Josh começou a apresentar uma estranha impressão de que estaria possuído.

Um dos aspectos mais interessantes deste segundo filme é que a ligação com o primeiro vai além de uma mera continuação linear da história. SOBRENATURAL: CAPÍTULO 2 chega a explicar alguns eventos confusos do primeiro filme, o que torna sua trama fascinante. Destaque também para a habilidade de Wan em construir uma atmosfera constante de medo com movimentos de câmera que valorizam os interiores com maestria. Em alguns momentos, há o medo de tomar um susto a qualquer momento como num filme de horror ordinário; em outros, o diretor pega mesmo o espectador de surpresa.

A montagem é outro aspecto de excelência do filme, especialmente nos momentos em que os personagens agem separadamente e vão sendo costurados e esclarecidos os motivos pelos quais a casa continua sendo assombrada, além do caso envolvendo a possessão de Josh. No elenco principal, tanto Rose Byrne quanto Barbara Hershey têm papéis ampliados em importância nesta segunda parte, sendo as verdadeiras heroínas do filme. Há dois detetives de fantasmas atrapalhados que tentam trazer um pouco de alívio cômico para a história, mas não sei se o humor funciona diante daquele clima opressor.

Quem espera um filme de horror mais clássico e contido como INVOCAÇÃO DO MAL pode não gostar tanto assim deste novo trabalho, que não economiza em mostrar as fantasmagóricas criaturas do além assombrando o mundo dos vivos. Isso não tira os méritos do filme, que em sua primeira parte já havia mostrado o rosto do demônio de maneira explícita. Agora, então, não é motivo para ser sutil. Falando em poucas sutilezas, a interpretação de Patrick Wilson quando está totalmente possesso lembra Jack Nicholson em O ILUMINADO, de Stanley Kubrick, com certeza uma dentre várias referências pegadas de empréstimo para a construção de mais um belo trabalho desse diretor malasiano.

Wan, não abandona o horror, não!

quinta-feira, novembro 21, 2013

TRÊS FILMES EXIBIDOS NO PANORAMA ALEMÃO



Desde o início dos anos 1990 que o cinema alemão vem passando por uma crise criativa. Não é que não tenham ótimos filmes daquele tempo pra cá, mas faltam grandes realizadores, ou pelo menos cineastas que tenham não só prestígio mas também repercussão internacional. O cineasta alemão de maior prestígio atualmente é Werner Herzog, que nos últimos anos também tem feito filmes em Hollywood. Há Michael Haneke também mas ele nem filma na Alemanha, mas na Áustria ou na França. Por isso, uma mostra que exiba o novo cinema alemão é necessária para que possamos entrar em contato com novos filmes e, quem sabe, futuros mestres do cinema. Estes três filmes foram exibidos no Panorama Alemão em excelentes cópias em DCP, no Cinema do Dragão. A qualidade de imagem e som é tão boa que eu aguentei na boa a maratona com estes três filmes, mesmo já tendo visto um outro no Iguatemi.

A GAROTA DAS NOVE PERUCAS (Heute bin ich Blond)

Provavelmente o filme mais acessível da mostra, A GAROTA DAS NOVE PERUCAS (2013) certamente teria um bom sucesso comercial caso fosse lançado em circuito, já que não há obstáculos para o espectador não-cinéfilo e dialoga com todos os públicos. O filme acompanha a história de Sophie, uma jovem de 21 anos que descobre que tem um tipo raro e agressivo de câncer, situado próxima à pleura (difícil não lembrar de CINE HOLLIÚDY quando se fala em pleura agora). O diretor, Marc Rothemund, não se importa em abraçar o melodrama, oferecendo vários momentos de lágrimas, embora seja também uma obra otimista. Um dos diferencias de outros filmes sobre doenças está no uso das perucas por Sophie, quando seu cabelo cai. Ela resolve criar um blog e cada peruca representa uma personagem que ela incorpora a cada dia, durante o tratamento. Mas esse detalhe nem chega a ser assim tão importante. O que mais importa é o relacionamento com a família, os amigos e um namorado, e como ela lida com as possibilidades de morrer ou viver. Belo filme.

DUAS VIDAS (Zwei Leben) 


Candidato da Alemanha ao Oscar de filme em língua estrangeira, DUAS VIDAS (2012) se recente de uma trama um tanto confusa, que até tem o seu charme, já que flerta com o thriller de espionagem. Há também um tema interessante e curioso, que é o caso de esposas norueguesas de soldados nazistas que tiveram suas vidas destruídas após a guerra, chegando a perder seus filhos. Katrine, a protagonista, é a filha de uma dessas mulheres. Ela teria passado parte da infância em um orfanato na Alemanha Oriental sem poder ter contato com sua mãe. O filme acompanha a vida dupla dessa mulher, em um momento em que a Europa mudou, logo após a queda do muro de Berlim. O problema de DUAS VIDAS é que ele passa de thriller para novelão na cena da grande revelação e acaba perdendo as estribeiras e tendo um final bem ruim. Se ficar entre os cinco escolhidos pela Academia é por pura falta de noção dos votantes.

MAR SILENCIOSO (Meeres Stille) 

Para quem já achou a trama de DUAS VIDAS intrincada, imagina como não ficou a minha cabeça ao ter que encarar este MAR SILENCIOSO (2013), com seus 142 minutos de duração e uma trama que mais parece um quebra-cabeças. Mas desses que só entrega a solução para o espectador em seus momentos finais. Daí não é nenhuma surpresa algumas pessoas saírem da sala de exibição e desistirem do filme. Porém, por mais doloroso e difícil de acompanhar, não deixa de ser um trabalho interessante, parecendo em muitos momentos com um horror psicológico. A trama gira em torno de uma família em férias numa casa de praia. Ao mesmo tempo, há a trama de um garotinho que tenta salvar o pai da depressão. O problema do enredo é que a diretora Juliane Fezer parece não ter muito domínio do monstro que criou, confundindo mais do que intrigando. Daí a vontade de ver o filme chegar ao fim é maior do que o interesse pela sua resolução.

quarta-feira, novembro 20, 2013

TATUAGEM























Uma das coisas que mais fazem falta no cinema brasileiro contemporâneo é a ousadia, a capacidade de causar incômodo ao público mais conservador. Que nem era assim tão conservador nas décadas de 1970 e 1980. Felizmente ainda temos Julio Bressane, remanescente do Cinema Marginal e que ainda utiliza o sexo e a sensualidade em seus filmes sem medo de ser feliz, como fez em CLEÓPATRA e A ERVA DO RATO. Mesmo obras que tratam do assunto, como BRUNA SURFISTINHA, são bem comportadas, utilizando o sexo apenas como necessidade para a narrativa.

A exceção vem de Pernambuco, com o trabalho de Cláudio Assis, embora em seus filmes o sexo seja na maior parte das vezes sujo e perturbador. Mas é bom destacar que AMARELO MANGA (2002), BAIXIO DAS BESTAS (2006) e A FEBRE DO RATO (2011), todos de Assis, foram roteirizados por Hilton Lacerda, que agora estreia na direção de longas-metragens de ficção com o premiado TATUAGEM (2013), filme tão atrevido quanto os trabalhos de Assis, mas com menos violência e mais amor.

Amor é uma das palavras de ordem deste filme que trata sobre um relacionamento homoafetivo na década de 1970, durante o regime militar. TATUAGEM acompanha um grupo de artistas itinerantes que se apresentam de maneira ousada, boa parte deles travestidos e formados por gays. O líder do grupo denominado "Chão de Estrelas" é Clécio, vivido por Irandhir Santos.

Em meio àquele mundo estranho para os olhos da grande maioria, surge um jovem soldado que se torna a menina dos olhos de Clécio, Fininha, vivido por Jesuíta Barbosa. Os dois se apaixonam mas têm de lidar com o fato de que Fininha, por ser militar, pode ser considerado um espião por parte do grupo. Vale destacar também a família de Clécio: ele tem um filho com uma mulher e ambos continuam sendo bons amigos, além de o garoto gostar de frequentar o Chão de Estrelas.

As cenas de sexo são ousadas, remetendo a A LEI DO DESEJO, de Pedro Almodóvar. Pode até não ter sido intenção de Lacerda emular Almodóvar, mas é o que mais se aproxima de seu cinema em se tratando de filmes que chegam a um público maior. Tanto que, já neste primeiro trabalho, assim como o cineasta espanhol, Lacerda consegue fugir do gueto de "filme gay", ampliando o tema do seu filme, que trata, acima de tudo, de liberdade.

O momento de maior graça do filme, e provavelmente sua sequência mais memorável, é a cena da "Polka do Cu", que elege esta parte do corpo humano que todo mundo tem como instrumento libertário, de provocação e transgressão. Mas a música está presente também de maneira mais romântica, por exemplo, em "Volta", cantada por Johnny Hooker; a versão de "Esse cara", de Caetano Veloso, cantada por Irandhir; "A Noite de Meu Bem", de Dolores Duran, tocada na primeira dança do casal de protagonistas, entre outras canções selecionadas e/ou compostas por DJ Dolores.

Para finalizar, gostaria de destacar o fantástico desempenho de Irandhir Santos no papel de Clécio. Ator de primeira grandeza que já havia brilhado como o ativista político de TROPA DE ELITE 2, de José Padilha; o poeta febril de A FEBRE DO RATO, de Cláudio Assis; e o enigmático vigilante de rua de O SOM AO REDOR, de Kleber Mendonça Filho; em TATUAGEM ele imprime uma atuação tão intensa que, se por acaso há uma distância de excelência entre ele e os demais atores, é porque Irandhir chegou a um momento de sua carreira que fica difícil até superar a si mesmo.

segunda-feira, novembro 18, 2013

FINSTERWORLD























Dos quatro filmes que vi no Panorama Alemão, atualmente em cartaz no Cinema do Dragão, em Fortaleza, até o dia 21, o que mais apreciei foi este FINSTERWORLD (2013), que, apesar de ter algumas fragilidades no roteiro, é uma obra que mexe com a própria culpa alemã. Há um diálogo especialmente interessante, dentro de um carro, de um jovem e um casal que ele encontra pelo caminho, em que ele cita o quanto a Alemanha não tem um ícone a ser lembrado, como os Estados Unidos têm, como o Mickey Mouse. Enquanto isso, o maior ícone alemão é Adolf Hitler. O próprio casal, anteriormente, ao escolher um carro para aluguel, faz questão que não seja um carro alemão, chamando-os de nazis.

Outro momento interessante: um professor leva um grupo de estudantes para visitar um campo de concentração e fala para eles do absurdo daquilo, de como um povo não tem o direito de fazer aquilo com outro etc. Aí ele pede que alguém externe o sentimento em relação àquilo e todo mundo fica calado. O silêncio pode representar muita coisa ou não representar coisa nenhuma, já que havia ali alunos de todos os tipos.

Trata-se de um "filme coral", com tramas aparentemente independentes, mas que eventualmente se encontram. Assim, há o sujeito que é pedicure e que tem um estranho hábito; a velhinha que é abandonada pela família em uma casa de repouso; um guarda de trânsito que gosta de se fantasiar de urso; um grupo de estudantes que se dividem em jovens neonazistas e um casal que se veste como se fosse da Alemanha Oriental (segundo palavra dos outros jovens); uma cineasta frustrada; um homem que vive sozinho na floresta; e o casal rico do carro.

O filme, estreia da diretora Frauke Finsterwalder, tem como título um trecho do nome de sua criadora, o que não deixa de curioso para alguém que está ainda começando a carreira – Finsterwalder vem de dois documentários e de um episódio de uma série alemã. É como se ela já estivesse anunciando um estilo bem definido para toda sua carreira. Seu trabalho lida com questões muito interessantes e que são um tabu para o povo alemão, além da questão da solidão e da dificuldade de pertencimento.

Ainda que algumas das conclusões para as subtramas sejam frágeis, como o fato de o professor se permitir ser preso, isso pode ser visto tanto como uma aceitação da culpa (que seria coletiva e também pertencente a esta nova geração), como para corroborar o tom de fábula que FINSTERWORLD abraça.

Torço para que o filme encontre distribuidor brasileiro. Mais pessoas deveriam conferir este trabalho, que além de tudo tem uma beleza plástica de dar gosto. As ótimas cópias em DCP oferecidas pelo German Films e a boa aparelhagem da sala contribuem para uma melhor apreciação.

domingo, novembro 17, 2013

BLUE JASMINE























É curiosa a quantidade de críticas dizendo que Woody Allen se recuperou com BLUE JASMINE (2013). Mas se recuperou de quê, se ele nunca esteve ruim? Até podem dizer que o trabalho anterior, PARA ROMA, COM AMOR (2012), é um filme menor, mas o cineasta, principalmente a partir do início de sua "fase europeia", iniciada com PONTO FINAL – MATCH POINT (2005) e que prosseguirá no próximo ano com MAGIC IN THE MOONLIGHT, em fase de pós-produção e rodado na França, está em um de seus momentos mais inspiradores.

O que destaca BLUE JASMINE, o segundo retorno aos Estados Unidos dentro dessa fase atual, dos demais filmes recentes de Allen é trazer não um personagem neurótico ou hipocondríaco, como é comum de se ver em seus trabalhos, mas alguém que está verdadeiramente no fundo do poço, um caso clínico. A Jasmine do título, que ganha o adjetivo "blue", especificando o aspecto triste da personagem de Cate Blanchett, é uma mulher que perdeu o chão, não sabe o que fazer da vida, uma vez que se acostumou com uma vida de luxo, quando vivia com o marido cafajeste vivido por Alec Baldwin.

O filme se passa em São Francisco, mas Nova York está presente na pele da personagem, que, sem ter para onde ir, resolve ficar uns dias na casa da irmã Ginger (Sally Hawkins). Desprovida de luxos ou exigências com roupas e homens, Ginger é o extremo oposto da irmã, que carrega consigo ares aristocráticos. Mesmo sem ter nenhum dinheiro, veio de primeira classe para São Francisco, o que fez com que a irmã ficasse um tanto revoltada com isso.

BLUE JASMINE alterna presente e passado para ir construindo a história de Jasmine e isso funciona muito melhor do que se adotasse uma estrutura narrativa linear. Do jeito que ficou, fragmentado como a personagem, cria-se um leve suspense sobre o que aconteceu com ela antes de seu marido partir, ao mesmo tempo que estabelece uma dualidade: o mundo rico de Nova York versus o mundo pobre dos bairros populares de São Francisco.

Curiosamente, Allen traz para seu novo alter-ego uma característica que lhe é conhecida: o fato de não saber operar um computador, já que ele nunca quis largar sua velha máquina de escrever. Um fato, aliás, que deixa o filme um tanto anacrônico. Assim também é Jasmine, que vê uma possibilidade na vida profissional de ser decoradora de interiores, mas para isso teria que fazer um curso. Para fazer um curso, teria que ter dinheiro. Para ter dinheiro precisaria arranjar um emprego ainda que modesto para custear o curso de computação e futuramente o curso de decoração à distância.

Tomando comprimidos e mais comprimidos para se livrar de depressões, ansiedades, síndromes de pânico, claustrofobia etc., Jasmine é um produto dos tempos atuais, em que entrar em colapso se tornou algo comum, embora ninguém queira ficar perto de alguém que fica falando sozinha pelos cantos. Perder o controle de sua mente e ficar louco é algo que coloca o homem numa situação de pária na sociedade.

E embora Allen já tenha feito trabalhos ainda mais pesados no tempo em que era casado com Mia Farrow, como A OUTRA (1988), CRIMES E PECADOS (1989), MARIDOS E ESPOSAS (1992), e as tragédias ambientadas em Londres, PONTO FINAL – MATCH POINT e O SONHO DE CASSANDRA (2007), além de uma experiência metade comédia, metade drama com MELINDA E MELINDA (2004), é com BLUE JASMINE que o cineasta apresenta uma personagem tão desequilibrada e frágil psicologicamente. Há alguns momentos cômicos, já que não se trata de um de seus filmes bergmanianos e o bom e velho jazz parece querer animar um pouco o ambiente, mas o riso aqui é amarelo e o tom é amargo.

sábado, novembro 16, 2013

JOGOS VORAZES – EM CHAMAS (The Hunger Games – Catching Fire)























Com o final tão redondinho de JOGOS VORAZES (2012), o primeiro filme, ficou a impressão de que a franquia não teria muito mais a oferecer a não ser lucrar em cima do belo resultado inicial, repetindo outros jogos em filmes seguintes. Surprise, surprise: JOGOS VORAZES – EM CHAMAS (2013) consegue superar o primeiro filme em praticamente todos os quesitos. Aliás, é, até o momento, o filme que salva a safra de blockbusters do ano. Desses de se assistir com atenção, empolgação e encanto. E como se trata de uma franquia que só cresceu com o tempo, o número de espectadores aumentou em progressão geométrica. E são participativos, no bom sentido, também. Com direito a palmas em determinado momento, por exemplo.

A mudança de direção, saindo Gary Ross e entrando Francis Lawrence, de CONSTANTINE (2005) e EU SOU A LENDA (2007), não prejudicou em nada. Na verdade, Lawrence conservou o bom andamento narrativo do filme, enfatizando a questão da revolução iminente de um povo que não aguenta mais a violência e a humilhação que sofre por parte do Governo. A gota d'água são os tais jogos vorazes, um reality show em que jovens dos vários distritos têm que duelar até a morte entre si, para satisfazer os criadores e entusiastas do programa, como o presidente, vivido por Donald Sutherland, além dos espectadores mais sádicos.

Porém, alguma coisa mudou depois que Katniss Everdeen (Jennifer Lawrence) ganhou a última edição dos jogos e se tornou querida por muitos, ainda que odiada pela família daqueles que morreram em combate. Essa é uma das razões da cena do primeiro discurso – em que ela e seu parceiro de sobrevivência, Peeta Mellark (Josh Hutcherson), resolvem improvisar – ser tão emocionante. Ali vemos a chama da revolta, simbolizada pelos três dedos levantados, que podem remeter à liberdade, à igualdade e à fraternidade da Revolução Francesa.

Assim, se o primeiro filme parecia uma versão americana de BATALHA REAL, de Kinji Fukasaku, que por sua vez foi inspirado em um romance juvenil como a própria adaptação de JOGOS VORAZES, o novo filme amplia o cenário, oferece um gostinho de O IMPÉRIO CONTRA-ATACA, deixando uma vontade enorme de ver a conclusão da narrativa, que infelizmente (ou felizmente, quem sabe) será dividida em duas partes, assim como aconteceu com os finais das franquias HARRY POTTER e CREPÚSCULO. Sabemos que isso dá dinheiro e que esse é o principal motivo, mas é possível que isso seja usado de maneira inteligente e criativa, como até agora vem sendo.

Neste segundo filme, para arranjar um jeito de matar Katniss Everdeen, o presidente resolve chamar todos os vencedores das últimas edições para que possam duelar entre si. Seria, supostamente, uma comemoração dos 75 anos dos jogos. E o filme oferece duelos bem empolgantes entre si, além de obstáculos colocados pela própria prova, que rende cenas memoráveis como a do ataque dos macacos, que chegam a ser impressionantemente assustadores.

Quanto a Jennifer Lawrence, ela continua sendo aquela força da natureza. Linda, selvagem, humilde, dividida entre dois amores, com medo de ter sua família atingida por qualquer ação sua, de ter que magoar seu namorado (Liam Hemsworth), que inclusive participa de uma das cenas mais dramáticas deste filme. E que serve para atiçar também o espectador, deixando todo mundo revoltado e pronto para abraçar a revolução.

Além do mais, que outro blockbuster consegue trazer um elenco de apoio tão fantástico (Woody Harrelson, Donald Sutherland, Elizabeth Banks, Stanley Tucci, Philip Seymour Hoffmann, Jeffrey Wright) e usá-los todos dignamente, e não como uma mancha na carreira do ator como fazem outros filmes por aí? Afinal, os diálogos são bem construídos e os personagens são todos envolventes e interessantes. Quem diria que aqueles livrinhos de aspecto tão modesto de Suzanne Collins renderiam uma das melhores franquias juvenis dos últimos anos?

OBS.: JOGOS VORAZES – EM CHAMAS está sendo exibido em algumas salas do país com uma nova tecnologia de som, o dolby ATMOS, em cópias digitais DCP. Porém, não percebi muita diferença em relação ao som dolby convencional. Provavelmente isso se deve ao número de caixas de som que o sistema requer para que seja melhor aproveitado, como se pode ver neste link. No Iguatemi, duas salas estão exibindo o filme com este sistema, somente em cópias legendadas.

quinta-feira, novembro 14, 2013

BLING RING – A GANGUE DE HOLLYWOOD (The Bling Ring)























Acusado por muitos de vazio como seus personagens, BLING RING – A GANGUE DE HOLLYWOOD (2013) é o filme de Sofia Coppola que mais sofreu ataques, embora seja o seu trabalho mais badalado comercialmente, até pela presença de Emma Watson como uma das garotinhas ricas a ingressar no grupo de ladrões de joias, roupas e outras bugingangas chiques de celebridades de Los Angeles.

O grupo é formado por Marc, um rapaz gay e deslocado na escola, vivido por Israel Broussard, e Rebecca, a verdadeira líder da gangue, interpretada por Katie Chang, tão bela e atraente quanto Emma Watson. É ela quem descobre as facilidades de adentrar as casas das celebridades que vivem em luxuosas mansões. É Rebecca quem encoraja a turma a invadir as casas, sem muita preocupação em ser pega no ato.

O filme é uma delícia de se assistir, mas parece não ir além do vazio das almas de seus personagens, como acontece tão belamente em outras obras de Sofia Coppola, tendo atingido o ápice desse sentimento em forma de estética com UM LUGAR QUALQUER (2010). Porém, sempre fica uma pergunta no ar: é isso mesmo? BLING RING é o filme menos brilhante de Sofia? Ou é uma dessas obras subestimadas ou incompreendidas que precisam de um olhar mais carinhoso?

De uma forma ou de outra, trata-se de um filme bastante coerente com o autorismo de sua diretora, bem como representativo de uma geração que se deixa levar pelo glamour das celebridades, que por sua vez podem ser tão vazias quanto as próprias invejosas, caso, por exemplo, de Paris Hilton, uma das que têm a casa invadida. Aí entra outra questão, que é a da ambiguidade do filme, que ao mesmo tempo em que parece tratar com carinho suas personagens, parece fazer também uma crítica à sociedade consumista americana. Daí a confusão que ele causa e daí ser um filme que merece ser visto e revisto para que essas e outras questões sejam levantadas, a fim de que possamos compreender melhor sua proposta.

BLING RING – A GANGUE DE HOLLYWOOD é baseado em fatos reais ocorridos entre os anos de 2008 e 2009. Entre as coadjuvantes, vale destacar a presença de Taissa Farmiga, que atualmente está brilhando como uma jovem bruxa em AMERICAN HORROR STORY – COVEN.

quarta-feira, novembro 13, 2013

PAI E FILHA (Banshun)























Fiquei tão encantado com PAI E FILHA (1949) que eu acho que com apenas dois filmes vistos já posso me considerar um fã de Yasujiro Ozu. Impressionante o cuidado visual que o diretor tem com cada enquadramento, com seu tradicional uso da câmera na altura do umbigo, como se em posição de humildade em relação aos personagens e ao próprio mundo. Há também uma economia de diálogos e de planos, embora seja um filme cuja história se construa muito em cima desses diálogos.

O que mais marca o início do filme é o sorriso encantador de Setsuko Hara, que interpreta Noriko, uma moça de 27 anos feliz da vida por ser solteira e cuidar com muito amor de seu pai viúvo. Mas a sociedade cobra dela um casamento. Com essa idade, ficar solteira é inadmissível naquela sociedade tão tradicional. E Ozu não parece fazer crítica alguma a essa estrutura social. A intenção do filme é mesmo mostrar o amor existente entre pai e filha. E isso é muito bonito. Só podia mesmo render um final tão lindo que chega a ser difícil conter as lágrimas. E isso dentro do classicismo de Ozu, de sua tendência a não exagerar no sentimentalismo. Em PAI E FILHA, é como se tudo estivesse no seu devido lugar.

Inclusive, as inserções de paisagens que são mostradas eventualmente nos fazem aceitar que essa é a ordem natural das coisas. Ozu traz o equilíbrio da natureza para o seu trabalho, e isso gera uma leve tensão com os dilemas dos personagens, em particular Noriko, já que é ela que enfrenta a maior dificuldade de sua vida: afastar-se de seu pai e tomar um novo rumo. Utilizar o termo "tensão" talvez até seja um tanto exagerado para designar os problemas de Noriko e de seu pai, já que o filme segue com uma serenidade admirável, mas essa leve tensão é um dos motivos para que o filme conquiste o espectador a cada progressão de sua narrativa, até chegar à linda sequência em que o pai vê a filha vestida de noiva. O filme até poderia ter acabado ali, mas consegue ser ainda mais perfeito em sua conclusão.

PAI E FILHA faz parte da chamada trilogia de Noriko, em que a mesma atriz faz diferentes Norikos. Os filmes seguintes são TAMBÉM FOMOS FELIZES (1951) e ERA UMA VEZ EM TÓQUIO (1953), mas esses ainda me falta experienciá-los. Acredito que me trarão tanto prazer e emoção quanto PAI E FILHA.

terça-feira, novembro 12, 2013

MEU PASSADO ME CONDENA – O FILME























Gosto do Fábio Porchat. Aprendi a gostar com os vídeos do Porta dos Fundos e com o sucesso de seu roteiro e seu timing para comédia, especialmente em VAI QUE DÁ CERTO. Infelizmente não é sempre ele que está por trás dos roteiros e acaba entrando em alguma roubada. Ainda assim, estar em três comédias lucrativas no mesmo ano não é pra qualquer um. Podem até falar mal dos filmes, e O CONCURSO merece mesmo algumas pedradas, ainda que seja quase inofensivo, mas o fato é que o jovem comediante está cada vez mais popular. E é preciso ter carisma pra isso.

MEU PASSADO ME CONDENA – O FILME (2013) é uma grande bobagem. Mas uma vez que já se sabe disso, o que dá pra perceber é justamente o quanto o ator consegue fazer dessa bobagem algo quase sempre bem divertido. Há um fiapo de história e, tirando a Miá Mello, a moça que faz a sua noiva, até os demais coadjuvantes são bem ruins, embora funcionem para o andamento da trama.

A boa química de Porchat com Miá claramente já se sabe de onde veio: da série que deu origem ao filme. É mais um caso curioso de série de canal fechado que gera filme que explode nas bilheterias num mesmo ano. Funcionou com MINHA MÃE É UMA PEÇA. E agora funcionou também com MEU PASSADO ME CONDENA. Talvez o sucesso do filme do cara travestido de mãe chata seja até mais surpreendente, pois o ator nem era tão famoso. Mas Porchat é. E por isso não chega a ser tanta surpresa assim que MEU PASSADO ME CONDENA tenha gerado a segunda melhor estreia de um filme brasileiro em 2013, perdendo apenas para SOMOS TÃO JOVENS.

A trama de MEU PASSADO ME CONDENA – O FILME até lembra a de algumas comédias hollywoodianas tradicionais: Fábio e Miá (eles usam os próprios nomes no filme) formam um casal que vai para uma lua de mel em um cruzeiro de luxo quando descobrem que o ex-namorado da moça está lá e é um cara bem-sucedido; e que a moça por quem Fábio era apaixonado na infância é namorada do tal sujeito. A partir daí é só brincar com as possibilidades e com as confusões desse quadrado amoroso.

O que acaba deixando o filme ainda mais bobo é sua tentativa de ser uma comédia romântica. Mas ainda assim a diretora Julia Rezende até que não deixa tudo virar um pote de água com açúcar. No fim de tudo, trata-se de apenas mais um filminho descartável para rir durante a sessão e depois esquecer. Não é muito animador saber que é esse tipo de filme que comanda as bilheterias atualmente no Brasil, mas também não sou eu quem vai jogar as pedras. Até porque vem filme com a turma do Porta dos Fundos por aí e eu torço para que dê certo.

domingo, novembro 10, 2013

EU NASCI, MAS/EU NASCI, PORÉM/MENINOS DE TÓQUIO (Otona no Miru Ehon - Umarete wa Mita Keredo)























Muito interessante a classificação que o historiador de cinema Mark Cousins faz dos estilos utilizados por diversos cineastas ou cinematografias. Ele questiona, por exemplo, chamarem de "clássico" o cinema que se fazia em Hollywood no período anterior ao advento da contracultura. Segundo ele, nada daquilo é clássico, no sentido equilibrado do termo. Ao invés disso, ele prefere chamar de "realismo romântico fechado". Clássico, para ele, é o cinema de Yasujiro Ozu. Esse sim é um exemplo perfeito do termo. Por esse e por outros motivos o cineasta japonês recebe um número generoso de páginas do livro História do Cinema.

No referido livro, EU NASCI, MAS (1932), ou qualquer dos três títulos que o filme possui aqui no Brasil, é considerado o primeiro grande filme de Ozu, seu primeiro sucesso de bilheteria e seu ponto de partida para um estilo e uma temática que ele seguiria a partir de então. Um dos detalhes curiosos sobre Ozu é o fato de ele nunca ter casado e, no entanto, ter uma preferência por adotar temas sobre famílias, relacionamentos entre pais e filhos etc. Pelo menos é o que eu já li a respeito, já que EU NASCI, MAS foi o primeiro trabalho de Ozu a que tive contato. Eu e minha resistência besta aos filmes japoneses...

Em EU NASCI, MAS, dois garotos mudam de escola e têm de lidar com o bullying dos outros meninos metidos a valentões. Por causa disso, eles têm medo de ir até a escola, já que os garotos são muitos e andam em gangue. Assim, nos primeiros dias eles faltam à escola, e até inventam um trabalho de caligrafia para enganar os pais. O pai, inclusive, é o exemplo de pessoa extremamente respeitosa para esses meninos. E, de fato, a imagem que o pai passa no filme é de um homem honrado casado com uma esposa também honrada, ambos cheios de uma serenidade que pouco ou nada se vê no cinema ocidental.

O que justamente quebra essa serenidade no lar é o comportamento dos garotos quando descobrem que o pai é subserviente ao pai de um de seus colegas, isto é, ao seu patrão. Para eles, ver o pai sério desempenhar papel de palhaço em filmes projetados é extremamente desapontador. Daí a entenderem o que é ser uma pessoa importante, a necessidade do dinheiro para o sustento do lar etc., isso demora um pouco. Mas são justamente esses momentos finais que reservam as cenas mais tocantes do filme. E por mais que Ozu seja contido nos sentimentos, esses momentos de reconciliação são capazes de nos deixar com os olhos marejados.

Vale destacar também a beleza da narrativa do filme, que poderia ser falado, mas naquela época a indústria cinematográfica japonesa rejeitou o quanto pôde os filmes falados. Mas por isso mesmo havia um domínio narrativo de dar gosto no trabalho dos melhores cineastas. E com um diferencial de destaque no cinema de Ozu: o uso da câmera na altura do umbigo. Não se trata aqui do ponto de vista das crianças, como nos desenhos de Charlie Brown, já que mesmo quando as crianças estão numa posição mais alta, a câmera os mostra de baixo pra cima. Enfim, é um detalhe importante que, para Cousins, é comparável ao Estudo de Proporções, de Leonardo Da Vinci. Provavelmente escreva mais sobre essa característica do cinema de Ozu na apreciação de demais filmes do mestre.

sábado, novembro 09, 2013

CAPITÃO PHILLIPS (Captain Phillips)























Paul Greengrass volta ao caráter urgente de seu estilo de câmera nervosa e muitas vezes tremida que se tornou famoso do grande público nos dois filmes que ele fez para a franquia Bourne: A SUPREMACIA BOURNE (2004) e O ULTIMATO BOURNE (2007). Porém, o que de melhor ele fez ainda foi o angustiante VOO UNITED 93 (2006), que é o filme que mais se assemelha a este CAPITÃO PHILLIPS (2013), que também parte de uma história real e extremamente tensa.

No começo dá até para se sentir incomodado com a câmera tremida. Como se o diretor tivesse entregado a câmera para alguém com Mal de Parkinson. Depois, ao mesmo tempo em que a gente se acostuma, esses efeitos nocivos à visão só são usados em situações verdadeiramente tensas da narrativa, quando já estamos devidamente envolvidos com o drama de Richard Phillips, comandante de um navio que tem seu cargueiro sequestrado por piratas somalis.

O filme não perde muito tempo apresentando seus personagens. Já mostra Richard Phillips, vivido por Tom Hanks, se preparando para mais um serviço. Dessa vez ele teria que passar por zonas já conhecidas por ataques de piratas, próximas da costa africana. São apresentados também os somalis que irão atacar o cargueiro americano.

Curiosamente, na sequência em que eles são mostrados, a fotografia adquire outras tonalidades, tendendo para o amarelo, com uma luz estourada. Algo que já está virando até clichê em algumas produções que querem diferenciar lugares quentes e pobres de lugares ricos. Foi assim, por exemplo, em TRAFFIC, de Steven Soderbergh.

A aparência dos piratas também pode até ser tida como um tanto racista, separando-os da limpeza e civilidade do personagem de Phillips e sua tripulação. Porém, deve ter havido pesquisa para buscar personagens que se assemelhassem aos verdadeiros piratas. Além do mais, o ator que faz Muse, o chefe dos piratas somalis, vivido pelo estreante Barkhad Abdi, personifica muito bem o aspecto ao mesmo tempo agressivo e ingênuo do vilão, que pretende encontrar milhões de dólares para ele e seus companheiros naquele cargueiro. Aliás, fica claro também que chamá-lo de "vilão" seria bastante simplificador.

Há um momento, inclusive, em que Greengrass parece fazer uma leve crítica aos Estados Unidos e aos países mais ricos, quando Muse questiona o fato de Phillips e sua tripulação estarem levando suprimentos para países carentes da África. Como se ele visse esses atos como uma esmola dada por aqueles que poderiam ajudar mais ou de outra maneira.

No entanto, por mais que o filme tenha essas conotações políticas fortes, como já é característico do cinema de Greengrass, o que é mais enfatizado mesmo é a tensão da situação complicada do Comandante Phillips ao se ver cada vez mais perto da morte, junto àqueles homens que se encontram acuados, especialmente quando a Marinha dos Estados Unidos entra em cena, a fim de salvar o comandante e não pensar duas vezes se precisar matar os piratas.

No final, quando toda essa tensão termina, é possível até mesmo chorar junto com Phillips, diante de situação tão desesperadora. E nisso entra a ótima interpretação de Tom Hanks, que pode mais uma vez ser indicado ao Oscar. Aguardemos o anúncio dos indicados ao prêmio da Academia para conferir essa possibilidade.

quinta-feira, novembro 07, 2013

TRÊS CINEBIOGRAFIAS



Quem viu SOMOS TÃO JOVENS e reclamou precisa ver o que anda sendo feito de cinebiografia por aí afora. E cinema feito em países de grande tradição no gênero. É até possível listarmos bons ou até ótimos títulos, mas é frequente encontrarmos filmes fracos, que tropeçam até mesmo como mera narrativa da vida do objeto de estudo, mesmo quando focam apenas em determinado momento. Vejamos os casos destes três títulos.

JOBS (jOBS)

Quando o filme começa, mostrando um já maduro Steve Jobs segurando um iPod e dizendo o quanto aquilo ali é revolucionário, já dá pra perceber que vem muita presepada pela frente. Em seguida, JOBS (2013) volta aos tempos de estudante do biografado, quando ele ficou fascinado quando um amigo lhe mostrou pela primeira vez uma placa-mãe de um computador da década de 70. Não deixa de ser curioso ver a evolução do personagem e da própria informática ao longo do filme, bem como o modo como Steve Jobs se fecha como um gênio e acaba perdendo os amigos. Mas apesar de mostrar esse lado um tanto sombrio do personagem, o filme é bem chapa branca e não tem como não imaginá-lo como sendo uma grande propaganda da Apple. Bem mais do que OS ESTAGIÁRIOS é propaganda do Google. Quanto a Ashton Kutcher, não foi dessa vez que um personagem dramático lhe trouxe prestígio da crítica e do público mais exigente.

DIANA 

Diferente de JOBS, que procurou abarcar um período bem longo da vida do cientista, DIANA (2013) acompanha a vida da Princesa Diana em um momento em que ela já havia declarado sua separação com o Príncipe Charles, mostrando a sua dificuldade em ter uma vida privada, longe dos benditos paparazzi. As coisas se complicam ainda mais quando ela se apaixona por um cirurgião, vivido no filme por Naveen Andrews, o eterno Said, de LOST. Naomi Watts até está bem no papel da princesa do povo, mas o filme não ajuda e em nenhum momento sentimos um pouco da paixão entre os dois personagens, por mais que haja diversas situações que contribuam para isso. O diretor Oliver Hirschbiegel, de A QUEDA! AS ÚLTIMAS HORAS DE HITLER (2004), parece que vai ficar famoso mesmo pelo trecho de Hitler que até hoje é usado em diversas paródias. De DIANA, salva-se a reconstituição de época. Mas isso já é uma obrigação de quem faz filme com um orçamento considerável.

HANNAH ARENDT

Eis um caso típico de filme endereçado a públicos bem específicos. No caso, o público conhecedor do trabalho da filósofa política que experimentou o campo de concentração por ser uma judia, mas também foi bastante criticada pelos próprios judeus por questionar o grau de vilania de um nazista que estava na posição de réu no famoso julgamento de Nuremberg, ocorrido em Jerusalém. HANNAH ARENDT (2012) foca apenas este episódio da vida da personagem e em muitas ocasiões é uma obra um tanto aborrecida, sem muito vigor cinematográfico. O maior vigor do filme está nas palavras sábias de Hannah e nas sequências que mostram o julgamento, com imagens reais do acusado. Deu até vontade de ver JULGAMENTO EM NUREMBERG, de Stanley Kramer. Fica faltando organizar o meu tempo e as prioridades. Quanto ao filme de Margarethe von Trotta, diretora de ROSA LUXEMBURGO (1986), tem os seus momentos, destaque para a ótima interpretação de Barbara Sukowa, lembrada no passado pelo seu papel em LOLA, de Rainer Werner Fassbinder.

terça-feira, novembro 05, 2013

RINCÓN DE DARWIN























Penúltima das produções vistas no Cine Ceará que ainda estou devendo algumas palavras aqui no blog, o uruguaio RINCÓN DE DARWIN (2013), de Diego Fernández Pujol, é um desses filmes bem saborosos de se assistir, especialmente enquanto road movie. O início, quando são apresentados os três protagonistas que seguirão viagem juntos em uma caminhonete, é até um tanto descartável, mas é só os três pegarem estrada e o filme mostrar o seu trajeto e suas diferenças de personalidade que o enredo ou mesmo o destino acabam deixando de ser verdadeiramente importantes.

Durante a coletiva de imprensa do filme, estavam presentes o diretor e um dos atores, Carlos Frasca, que interpreta o personagem mais velho, Américo. Foi questionado se existe mesmo uma característica no cinema uruguaio que é o que chamaram de "minimalismo melancólico". O diretor não chegou a negar que haja mesmo esse ponto em comum entre os filmes uruguaios, dizendo que eles não são brasileiros, que não são eufóricos, mas que há, sim, uma diversidade de produções no país.

Em RINCÓN DE DARWIN, dos três protagonistas, Gastón é o mais jovem. É bastante conectado com as novas tecnologias, como o uso dos smartphones. O problema é que acaba a bateria e isso já serve para que o mais velho, Américo, condene esses novos bens de consumo, preferindo aquilo que é de seu tempo. O terceiro, Beto, é mais maduro que Gastón, e tem uma vida desligada de tudo. De família, de amigos, de uma atividade profissional fixa. Representa quase um velho hippie, inclusive no uso da maconha.

O título do filme se refere a uma região do Uruguai que foi visitada por Charles Darwin, quando o naturalista passou pela América do Sul, e é o caminho que será um dos pontos finais da viagem, que se prolonga por uma série de motivos, como o fato de o carro quebrar e precisar de um mecânico, por exemplo. No meio de tudo, há desavenças entre os três, conversas sobre as mulheres de suas vidas, e há também reconciliações depois de discussões. É um filme bem simples e bonito, que talvez seja esquecido com o tempo, mas enquanto dura é um agradável alimento para o espírito.

domingo, novembro 03, 2013

UMA NOITE DE CRIME (The Purge)























Procurando pelo histórico do diretor James DeMonaco no IMDB não deixa de ser uma surpresa e ao mesmo tempo algo lógico o fato de ele ter sido roteirista dos filmes A NEGOCIAÇÃO (1998) e ASSALTO À 13ª D.P. (2005), dois filmes que se caracterizam pela tensão, ainda que em perspectivas diferentes. Mas em ambos há sempre alguém do lado de fora forçando uma situação com alguém que está no interior.

Não chega a ser algo novo. Pode ser visto no terceiro ato de ONDE COMEÇA O INFERNO, de Howard Hawks, e repercutir em outros dois filmes do próprio Hawks e em trabalhos de John Carpenter, como a primeira versão de ASSALTO À 13ª D.P. ou mesmo FANTASMAS DE MARTE. Mas o filme que mais encontra paralelo com UMA NOITE DE CRIME (2013), de DeMonaco, é mesmo SOB O DOMÍNIO DO MEDO. Pensemos na versão de Sam Peckinpah, e não no remake fajuto e que passou batido até.

É possível ver UMA NOITE DE CRIME como uma espécie de variação de SOB O DOMÍNIO DO MEDO, mas que parte de uma premissa diferente e interessante: a de que, no futuro, o Governo dos Estados Unidos, a fim de conter os crimes cada vez mais alarmantes, resolve deixar uma noite em que todo e qualquer crime é permitido, das 7 da noite até as 7 da manhã. Assim, fica a critério da população sair às ruas para matar ou roubar ou ficar trancafiado em sua casa a fim de sobreviver àquela noite.

"Purge", no título original, significa "expurgo", "limpeza". Assim, o ato de matar aquela pessoa que você odeia e alimentou o ódio durante o ano inteiro é uma maneira de expurgar aquele sentimento. O curioso é que a noção de pecado ou de moral fica totalmente deixada pra trás, uma vez que a lei permite aquela abominação. Nos noticiários, a noite é tida como algo bem-sucedido e um bem para a sociedade, já que coisas como essa ficam restritas apenas àquela noite especificamente.

Na trama, James Sandin, o personagem de Ethan Hawke, é um pai de família que construiu um sistema de segurança tão bom que acabou sendo adquirido por toda a vizinhança. Lena Headey (a Cersei de GAME OF THRONES, cada vez mais presente em produções cinematográficas) é sua esposa. E na casa há dois filhos adolescentes. Um deles, o garoto, com seu cabelo comprido, tem uma aparência quase andrógina. Esse detalhe pode não ser gratuito, já que no final do filme podemos inferir que esse mundo cheio de ódio e guerra foi construído pelos homens, com as mulheres tentando trazer a paz, não aceitando a crueldade e a frieza imposta pelas leis. Isso pode soar um tanto simplista e até sexista, mas é algo a se pensar.

Falando no garoto adolescente, é dele a resolução de colocar para dentro de casa um rapaz sem teto que está sendo perseguido por um grupo de "expurgadores". Assim, é a partir desse sentimento de solidariedade perante a vida do outro que a trama de UMA NOITE DE CRIME toma forma. Pena que o filme deixe um pouco a desejar na construção de uma atmosfera de suspense. A turma de jovens que fica do lado de fora da casa exigindo a devolução do rapaz negro não é tão ameaçadora assim.

Provavelmente isso se deve à pouca capacidade do diretor em saber construir esse tipo de tensão, mesmo com algumas surpresas que acontecem com o desenrolar da trama. É só pensar em SOB O DOMÍNIO DO MEDO, do Peckinpah, e das duas versões de ASSALTO À 13ª D.P. para ver que muito melhor já foi feito para deixar o espectador com os nervos à flor da pele. O que DeMonaco fez foi pouco nesse sentido. O que há de interessante é justamente a discussão sobre moral que o filme traz.

sábado, novembro 02, 2013

DEPOIS DE MAIO (Après Mai)























Cineasta da globalização, do rock, da inquietude, Olivier Assayas retorna ao tema da juventude de sua época, iniciado em ÁGUA FRIA (1994). Inclusive, em DEPOIS DE MAIO (2012), Assayas apresenta sequências bem semelhantes às mostradas em seu filme-irmão, como as cenas de destruição juvenil em uma festa. Os jovens do novo filme são os continuadores daqueles que fizeram História em maio de 1968, em Paris, e estão antenados com o que está acontecendo no mundo, como pode se inferir com a cena em que Gilles, o protagonista, vivido por Clément Métayer, compra vários jornais em uma banca.

Gilles é pintor, apreciador de um bom rock (no filme ouvimos Soft Machine, Syd Barret, Nick Drake, entre outros), sabe criticar até mesmo escritores de prestígio e acaba por enveredar pela indústria do cinema, o que faz com que o tenhamos como um alter-ego de Assayas. Como ele, os outros jovens apresentados em DEPOIS DE MAIO não são muito diferentes de tantos outros com ideias anarquistas e/ou revolucionárias daquela época em que se debatiam alternativas para o sistema político vigente.

Providencial o filme estrear em um momento em que o Brasil e boa parte do mundo estão vivendo tensões políticas e sociais que contrariam a ideia de que vivemos o fim das utopias. Na verdade, elas renascem em diferentes gerações, a partir de uma vontade de mudanças. DEPOIS DE MAIO, porém, não é só um filme sobre jovens fugindo da polícia, pichando muros, respirando gás lacrimogêneo e distribuindo jornais militantes. Assayas também traz à tona discussões sobre o embate entre política e arte.

Outro tema em destaque é a angústia dos jovens, que vivem momentos decisivos em suas vidas. Aqui, no caso, é oferecida a eles uma pluralidade de opções, de profissões,de lugares para ir, no mundo globalizado do diretor. "Viver o presente ou se preparar para o futuro?" é uma pergunta que surge em uma conversa entre Gilles e um de seus interesses amorosos, Laure (Carole Combs).

Falando em personagens, curioso notar que alguns membros da turma de Gilles não despertam o mesmo interesse do espectador, como é o caso do amigo pintor e sua namorada, estudante de danças orientais. Mas esse é um problema natural em um filme que escolhe não se prender apenas a uma única história. Nesse sentido, Christine, a personagem de Lola Créton, é uma das mais interessantes.

DEPOIS DE MAIO oferece uma excitação, muitas vezes associada à trilha sonora rock e a seus agregados, como o sexo e as drogas, mas sem nunca deixar de ser um filme que provoca reflexões sobre a vida, a arte, a política, o amor e as escolhas.

sexta-feira, novembro 01, 2013

THOR – O MUNDO SOMBRIO (Thor – The Dark World)























Tempos atrás se sonhava com várias adaptações de aventuras dos heróis Marvel para o cinema e eis que finalmente o sonho se torna realidade. E em um universo único, com heróis participando em outros filmes, que por sua vez seguem uma cronologia. Mais ou menos como nos quadrinhos. Até um filme dos Vingadores foi realizado, veja só. A criação dos Estúdios Marvel se tornou uma realidade e fatura milhões para seus produtores e para a Disney, que comprou os direitos da "Casa de Ideias" para o cinema alguns anos atrás.

Porém, nem tudo é um mar de rosas. Apesar de ainda serem aguardados por muitos e de estarem faturando alto nas bilheterias (HOMEM DE FERRO 3 ainda é o campeão de 2013), esses filmes acabam deixando uma sensação ruim no ar, por não saírem da mediocridade. Principalmente os produzidos pelos estúdios Marvel. Os personagens que ainda estão sob a mão da Fox (X-Men) ou da Sony (Homem-Aranha) até que têm conseguido trazer melhores resultados.

Quer dizer, há uma boa vontade, mas não há um capricho artístico na construção de roteiros e os diretores contratados acabam ficando numa espécie de camisa de força, sem poder deixar rastros de sua autoria, ainda que seja possível verificar um pouco disso no esquizofrênico HOMEM DE FERRO 3.

Para não dizer que eles não se importam com quem dirige os filmes, para o primeiro THOR (2011), pensaram em Kenneth Branagh, cineasta cujas glórias estão já no passado, quando dirigia ótimas adaptações de Shakespeare, como HENRIQUE V e HAMLET. Seguindo mais ou menos o mesmo raciocínio, para o segundo filme, THOR – O MUNDO SOMBRIO (2013), foi escalado um diretor de televisão, Alan Taylor, mais conhecido por sua frequência na ótima série GAME OF THRONES. Porém, a única coisa no segundo filme solo de Thor que lembra a ousada série da HBO é a cena de um funeral viking. E só.

Tudo o mais é apenas uma história boba e cansativa envolvendo um velho inimigo dos tempos do pai de Odin (Anthony Hopkins) como o vilão da vez. Trata-se de Malekith, conhecido de quem acompanhou a fase do Thor nos quadrinhos quando os roteiros eram escritos por Walt Simonson. Se o vilão é interessante nos quadrinhos, no cinema se torna mais um desses malvadões genéricos e chatos, sem a graça do ardiloso Loki (Tom Hiddleston), que aqui retorna como prisioneiro, depois do que ele fez em OS VINGADORES – THE AVENGERS (2012). Logo em seguida, porém, o meio-irmão de Thor é recrutado para enfrentar Malekith pelo próprio deus do trovão.

No mais, as sequências de luta são enfadonhas, o papel de Natalie Portman é extremamente bobo e o romance de sua personagem com Thor é quase nulo em química ou qualquer coisa parecida. Um total desperdício de uma atriz tão bonita e talentosa. E nem dá pra botar a culpa no ator que faz o Thor, Chris Hemsworth, que já provou seu talento em RUSH – NO LIMITE DA EMOÇÃO, de Ron Howard.

Outro problema do filme está na trama, que parece ter sido feita de qualquer jeito, sem nada que faça o espectador ficar minimamente intrigado. Como se houvesse uma necessidade de fazer um novo filme com o herói, mas sem saber direito o que fazer com ele. A não ser estabelecer uma ligação com o filme dos Vingadores e o que virá a seguir.

Sendo esperançoso, é possível imaginar um trabalho bem melhor no próximo ano, com CAPITÃO AMÉRICA 2 – O SOLDADO INVERNAL, que contará com a direção de dois especialistas em séries cômicas no comando. Pode ser o filme que salvará a chamada "fase 2" da Marvel, que até o momento tem deixado a desejar, ainda que o dinheiro que esteja entrando no caixa diga justamente o contrário.