quinta-feira, junho 06, 2013

A MONTANHA SAGRADA (The Holy Mountain)























A primeira vez que eu vi A MONTANHA SAGRADA (1973) foi em 2001 ou 2002, em uma cópia em VHS enviada pelo amigo Thomaz Albornoz. Ele havia conseguido essa cópia de um amigo estrangeiro. Não sei dizer se a matriz era de um laserdisc ou de um VHS mesmo. De todo modo, poder rever o filme em toda sua glória, com as cores vivas e a imagem nítida advindas de uma cópia em blu-ray faz toda a diferença. Notamos o quanto Alejandro Jodorowksy tinha um apego com o colorido e com a cuidadosa simetria nas imagens. Chega a ser próximo do que Stanley Kubrick fazia, nesse sentido.

A MONTANHA SAGRADA é desses filmes cuja interpretação é um tanto complicada, mas quem conhece um pouco de astrologia, de tarô, de numerologia ou de religiões orientais pode entender um pouco mais. O que não quer dizer que quem não está muito por dentro de esoterismo não vá curtir a viagem e achar o filme fascinante. Afinal, difícil dizer que ele não é.

Poderíamos dizer que Jodorowsky é um diretor com um estilo próximo do surrealismo de Luis Buñuel, mas o que o cineasta espanhol tem de anárquista e ateu, o chileno Jodorowsky tem de místico. E seu misticismo se confunde com sua arte (que não se concentra só no cinema, mas também na literatura e nos quadrinhos). Atualmente Jodorowsky voltou aos holofotes graças a um filme novo exibido em Cannes, LA DANZA DE LA REALIDAD (2013).

Título sugestivo para quem viu A MONTANHA SAGRADA e lembra de que maneira o filme termina. Ainda assim, o que é mais memorável mesmo é o início e o desenvolvimento. No prólogo, somos apresentados à figura do alquimista, vivido pelo próprio cineasta, e às duas gêmeas nuas que têm suas cabeças raspadas.

A seguir, um homem semelhante a Jesus chega a uma cidade mexicana, que celebra (ou relembra) os dias da conquista do México pelos espanhóis. Essa conquista é representada com sapos e lagartos vestidos de soldados e membros da Inquisição. Nesse início de filme também vemos o começo da amizade desse rapaz (o que parece com Cristo) com um anão sem braços e pernas, que parece ter saído direto do elenco de MONSTROS, de Tod Browning.

A viagem fica interessante mesmo quando vemos o encontro do protagonista com o alquimista. Fascinante o modo como ele transforma fezes em ouro. Para quem é ligado em astrologia, o momento mais interessante do filme é o da apresentação dos representantes de cada planeta de nosso sistema solar, apresentados engenhosamente a partir de seus simbolismos.

Assim, de Vênus (regente de Touro e Libra), destacam-se as roupas, os cosméticos, a sensualidade, o luxo, a preguiça, o culto ao corpo, o medo da morte e do envelhecimento, elementos mais relativos a Touro do que a Libra. De Marte (regente de Áries), há a masculinidade (mesmo sendo seu representante uma mulher), a guerra e a violência. Acaba sendo o planeta mais pobre. Poderiam ter explorado mais.

De Júpiter (regente de Sagitário), vê-se a bondade, a riqueza, a grandeza, as várias amantes e a inventividade sexual. De Saturno (regente de Capricórnio), vemos o Estado, a elegância, a velhice, o maquiavelismo. De Urano (regente de Aquário), se vê a loucura, o inesperado, o futurismo, a tecnologia.

De Netuno (regente de Peixes), vemos a renúncia ao sexo em prol da espiritualidade (de doer a cena do corte dos testículos com uma tesoura), o sacrifício, os livros sagrados. E finalmente, de Plutão (regente de Escorpião), vemos o débito (dinheiro que se deve), o sexo (o pênis gigante), o ânus (a citação às fezes), o caixão (a morte). Aliás, a morte é imediatamente associada ao sexo, os dois grandes símbolos desse signo.

Depois dessa sequência fascinante, o filme mostra a busca daqueles homens pela Montanha Sagrada, elemento comum a quase todas as religiões. E que para chegar até ela é preciso se despir de tudo: do ego, do dinheiro, do corpo, do desejo. E neste momento, impressionante a imagem de uma árvore cheia de galinhas brancas mortas. Como se elas fossem folhas dessa árvore. E lá em cima, a figura de uma velha parecida com uma bruxa de contos de fada. Parece uma imagem saída de um pesadelo e transposta para a pintura.

Há, enfim, muito a se falar ainda sobre o filme, mas os textos ficam vazios diante das imagens e do que fica grudado em nossa memória.

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