quarta-feira, outubro 31, 2012

A ENTIDADE (Sinister)



Aproveitando o Halloween, mais um filme de horror. Desta vez, um que está em cartaz atualmente nos cinemas brasileiros: A ENTIDADE (2012). O filme tem pedigree: direção de Scott Derrickson, que havia dirigido O EXORCISMO DE EMILY ROSE (2005), e produção de Jason Blum, que havia produzido SOBRENATURAL (2010). Quer dizer, a expectativa de que A ENTIDADE fosse pelo menos muito bom era grande. De qualquer maneira, trata-se de um filme interessante, que tem os seus méritos e que conquistou boa parte dos fãs de filmes de horror. A mim, nem tanto.

O que há de positivo no filme: os sustos não são gratuitos e raramente apelam para o som, mas para as imagens, que eventualmente causam calafrios; os diálogos e a relação familiar do personagem de Ethan Hawke e sua esposa e filhos são bem desenvolvidos e bem-vindos; a pequena aula do uso de edição em super-8 é bem interessante e ajuda bastante na trama; a questão da força das imagens em cinema também contribui para dar ao filme um maior valor; e o uso da música não diegética é outro ponto a favor.

Contra: a história de um sujeito que vai para uma casa assombrada por causa de inúmeros assassinatos já está mais do que manjada; os sustos são poucos, embora o filme gere uma boa dose de tensão - o problema é que essa tensão pode ser atenuada, à medida que os sustos e o interesse podem ir se diluindo; outro clichê manjado é a busca de um especialista que saiba o significado dos símbolos e imagens que aparecem nos filmes dos assassinatos.

Pesando prós e contras, o filme fica no meio, já que a figura assustadora do demônio não chega a ser assustadora assim. Aliás, esse negócio de mostrar a cara do monstro nem sempre é uma boa ideia. Em SOBRENATURAL, o resultado funcionou, mas porque toda uma atmosfera foi muito bem construída antes. Enfim, é um filme a se conferir e tirar suas próprias conclusões.

No Blog de Cinema do Diário do Nordeste, escrevi uma pequena matéria sobre cinco filmes interessantes que vão (ou foram) direto para DVD. Confira AQUI

terça-feira, outubro 30, 2012

AMITYVILLE – A CIDADE DO HORROR (The Amityville Horror)



Foi conversando com um amigo que me acompanha nas caminhadas que ele acabou por deixar mais curioso a ver este filme que é tão popular e conhecido, mas que até então eu não tinha visto. Inclusive, se eu não me engano, eu deixei de ver o remake de 2005, que foi bem malhado pela crítica, por não ter visto o filme "original". E passou o tempo e só agora eu vi o hoje clássico AMITYVILLE – A CIDADE DO HORROR (1979), de Stuart Rosenberg.

E é impressionante como o filme antecipou tantos clichês que hoje vemos em filmes de horror atuais, sejam os mais genéricos, sejam aqueles que procuram inovar de alguma maneira. Não dá, por exemplo, pra não pensar na franquia ATIVIDADE PARANORMAL, que usa bastante o uso dos indicativos de tempo 1º dia, 2º dia etc. para ajudar a criar uma tensão e uma expectativa para o pior, que, se sabe, virá num crescendo.

AMITYVILLE ainda não é o filme que eu vi na televisão tempos atrás e que até hoje eu não sei o nome e que de fato me deixou com medo. Ainda assim, é uma obra e tanto dentro do subgênero "casa assombrada". Curiosamente, eu tenho em casa o romance que deu origem ao filme, de Jay Anson, mas nunca dei muita bola para o livro, que está bem velhinho e a capa meio estropiada.

Outra coisa que me tirou um pouco a atenção foi procurar saber quem era a atriz do filme. Não estava reconhecendo a Margot Kidder, vejam vocês! Só depois de uma meia hora é que fui lembrar que ela foi a Lois Lane na quadrilogia do SUPERMAN. Ela está bem mais bonita e sensual neste filme de horror, mesmo usando aqueles óculos enormes da década de 70, mas que hoje parece que voltaram à moda.

Mas deixando de lado as distrações, um dos fatores que tornam AMITYVILLE uma obra e tanto é que não estamos falando aqui de espíritos desencarnados perturbando uma casa, como em OS OUTROS ou em tantos outros filmes de horror. Trata-se aqui de demônios. E isso acaba, de uma forma ou de outra, fazendo a diferença. O drama do padre (Rod Steiger) que é expulso da casa pelas forças demoníacas e a impossibilidade dele de se comunicar com a família são coisas que perturbam bastante e que também contam pontos a favor do filme.

Outro detalhe interessante é a hora em que foram cometidos os assassinatos do prólogo do filme: às 3h15 da madrugada. Esse horário não só aparece constantemente durante este filme, mas também em outros que vi anteriormente, como O AMIGO OCULTO, de John Polson, e O EXORCISMO DE EMILY ROSE, de Scott Derrickson, dois filmes que trabalham muito bem o medo do mal em sua forma sobrenatural. Pode ser pura superstição, mas isso deve ter saído de algum lugar. "Onde há fumaça, há fogo", diz o ditado.

segunda-feira, outubro 29, 2012

HORAS DE VERÃO (L'Heure d'Été)























Para um apreciador da obra de Olivier Assayas, até que eu tenho demorado a ver os seus filmes, mesmo tendo a oportunidade de vê-los em casa. Já adiei tantas vezes CARLOS (2010), que perdi a conta. Acho que foi a repercussão do nome do diretor com seu novo trabalho, APRÈS MAI (2012), que me chamou a atenção para ver outro filme dele que estava me esperando, em excelente qualidade de imagem: HORAS DE VERÃO (2008), que curiosamente foi o filme que eu menos gostei do cineasta até hoje, tendo visto apenas seis longas e mais dois segmentos em que ele participou – PARIS, TE AMO (2006) e CADA UM COM SEU CINEMA (2007).

Ainda assim, o diretor consegue prender a atenção num filme que trata de um assunto aparentemente pouco animador: discussões entre irmãos sobre o espólio deixado pela matriarca da família (Edith Scob), que já antecipa sua morte iminente em seu 85º aniversário e fala ao filho mais próximo (Charles Berling) para onde ela acha que deve ir os trabalhos artísticos de um membro da família já morto há algum tempo, entre outros objetos da casa.

Já se percebe que os demais filhos têm pouco interesse em "velharias" ou mesmo em questões da própria família. A personagem de Juliette Binoche (linda, loira, e sempre usando roupas casuais) se mostra um tanto indiferente ao que acontece naquela reunião bonita de família, em um lindo jardim. Ela é uma designer que segue a lógica do mercado - quer vender as pinturas do tio nos Estados Unidos. O outro irmão, que mora na China com a família (Jérémie Renier), também tem muito pouco interesse, até mesmo em ficar na França. Ele está entusiasmado com o crescimento econômico de seus negócios em Pequim. Apenas o personagem de Beling é mais idealista, mas não o suficiente para mudar a cabeça dos demais.

Assayas usa uma dramaturgia bem naturalista, que disfarça os ótimos e bem calculados diálogos. E sua característica globalizante, por assim dizer, é vista principalmente na família esfacelada, separada em lugares distantes do globo. O que não é muito diferente de outras famílias que moram no mesmo estado, mas em cidades distantes. Apenas as distâncias e o mundo em si parecem ter diminuído.

Um dos chamarizes, além de ser um filme do Assayas, pra mim, foi a presença de Binoche. Pena que, apesar de ela aparecer como a primeira nos créditos, ela não é exatamente a protagonista, mas o personagem de Berling. O que não deixa de ser um tanto desapontador para fãs da atriz, como eu. Ainda assim, foi mais do que válido conferir este filme, que lida com valores – sentimentais, de mercado, artísticos. Obras e objetos que são considerados valiosos são desconsiderados pelos filhos da matriarca, que só querem sua parte do capital e ir embora.

O final do filme, com uma mudança de ótica para os mais jovens da família, os adolescentes netos da matriarca, faz lembrar ÁGUA FRIA (1994), um filme que celebra a juventude. E o curioso é que é da boca de uma das garotas que sai uma impressão triste sobre a venda da casa, do quanto ela sentirá falta daquele lugar que tantas alegrias já trouxe em reuniões de família. Com a festa dos jovens, a vida está de volta àquele lugar. Impressionante como o futuro, representado pelas crianças e adolescentes, se conecta com a nostalgia do que é deixado para trás pelos adultos.

domingo, outubro 28, 2012

007 – OPERAÇÃO SKYFALL (Skyfall)























James Bond está fazendo 50 anos e teve uma sorte danada de ter um ótimo filme para homenagear este número tão bonito. Há vários fatores que fizeram de 007 – OPERAÇÃO SKYFALL (2012) um grande filme. E nem me refiro à direção de Sam Mendes, já que o cineasta, com o tempo, foi perdendo o toque autoral. E geralmente é isso mesmo que os produtores querem: bons diretores que não interfiram com seu toque pessoal na mitologia da cinessérie. Por isso que nenhum grande cineasta, um grande autor, para ser mais exato, dirigiu um filme de James Bond até hoje. Apenas ótimos artesãos, sejam especialistas em filmes de ação, sejam gente com sensibilidade dramática, como é o caso de Mendes, que tem cinco dramas acima da média no currículo.

Assim, há todo um cuidado para que não haja um excesso de mudança, por mais que muita gente até hoje torça o nariz para o atual Bond, Daniel Craig, que não tem a fleuma britânica de Pierce Brosnan. E nem tem tanta elegância. Seu James Bond é mais "porrada", por assim dizer. Mais apropriado aos nossos tempos. Mas a estrutura da série continua. Os créditos iniciais (em tempos de quase fim de créditos iniciais, uma pena), seguidos da canção pós-prólogo (um prólogo geralmente eletrizante e divertido) são sempre momentos bastante esperados pelos fãs. Felizmente o tema deste filme, com Adele cantando "Skyfall", até resgata nostalgicamente o clima dos filmes das décadas de 60 e 70.

Mas os tempos são outros. E o atual James Bond agora combate terroristas, os atuais inimigos dos países pertencentes ao bloco capitalista. Por isso, ao falar de terrorista, podemos esperar atentados de grande porte, como o que acontece no filme. SKYFALL começa tenso, com uma aura um tanto pessimista. Afinal, James Bond leva um tiro da própria parceira enquanto luta contra um inimigo em cima de um trem em movimento. E um tiro dado por ordens da própria M (Judi Dench). O erro de Dench a fará pagar caro por isso. Logo ela, que tem uma relação de afeto quase maternal com o seu principal agente.

Nunca um filme de 007 deu tanto destaque a M, a líder dos agentes "double 0". Pelo menos, não enquanto ela foi uma mulher, que começou com a era Pierce Brosnan, com 007 CONTRA GOLDENEYE (1995), dirigido pelo mesmo Martin Campbell que iniciou a era Daniel Craig, com 007 – CASSINO ROYALE (2006). E assim como CASSINO ROYALE, o novo filme tem esse tom mais carregado de tragédia. O que faz com que ele seja bem mais interessante, por exemplo, do que os passatempos descompromissados da era Roger Moore ou da era Pierce Brosnan.

Mas nada como um vilão de primeira grandeza para alavancar o filme. E isso eles conseguiram com o personagem de Javier Bardem. O ator espanhol, muito provavelmente, o mais versátil de sua geração, já havia feito um vilão horripilante em ONDE OS FRACOS NÃO TÊM VEZ, dos irmãos Coen. E desta vez, seu personagem destaca-se. A sequência com ele e Bond cara a cara, quando o agente do MI-6 está amarrado a uma cadeira, une tensão e humor, principalmente por suas insinuações homoeróticas. Acaba sendo um alívio cômico para o filme, pelo menos até vermos do que o antagonista é capaz. O jogo de gato e rato que constitui o ato final de SKYFALL é também louvável, tanto pela seriedade com que é tratado, como pelo amargo resultado.

007 – OPERAÇÃO SKYFALL talvez seja o filme em que as chamadas Bond girls têm menos destaque. Afinal, havia algo muito sério em jogo. Ainda assim, Naomi Harris, que faz Eve, a ajudante de Bond, tem carisma e rouba a cena nos poucos momentos em que aparece. A outra, a vivida pela francesa Bérénice Marlohe, mal tem tempo de mostrar a que veio. Trata-se de um filme de transição para a franquia. E de reflexão do atual momento político em que estamos vivendo.

sábado, outubro 27, 2012

GONZAGA – DE PAI PRA FILHO



Com a escassa renda nas bilheterias do cinema brasileiro em 2012, ainda é uma incógnita se o sucesso comercial de 2 FILHOS DE FRANCISCO (2005) se repetirá com GONZAGA – DE PAI PRA FILHO (2012), embora ambos os filmes tenham o mesmo diretor contando a história de ídolos populares da música. E com a diferença que Luiz Gonzaga e Gonzaguinha são artistas bem mais quistos por uma parcela, digamos, mais exigente do público. E eu, sinceramente, queria estar aqui dizendo o quanto adorei o novo filme de Breno Silveira, da mesma forma que me emocionei com a cinebiografia de Zezé de Camargo e Luciano e com o filme anterior do diretor, o belíssimo melodrama À BEIRA DO CAMINHO (2012), um trabalho que foi quase esnobado pelo público brasileiro.

Mas claro que torço pelo sucesso do filme, que tem momentos muito bons e um andamento muito gostoso, além de falar de dois homens tão importantes para a música brasileira. Em especial, Luiz Gonzaga, que é o principal foco do filme. Gonzaguinha também aparece bastante, mas sua história é vista sempre como a do filho rejeitado, não como a do artista de sucesso, que ele foi.

Aliás, essa relação entre pais e filhos é bastante presente nos filmes de Silveira. A figura do pai é sempre muito importante. Em À BEIRA DO CAMINHO, vemos um garoto à procura de um pai; em 2 FILHOS DE FRANCISCO, o pai já aparece no título do filme e é importantíssimo para alavancar a carreira artística dos filhos. Até o fraco ERA UMA VEZ... (2008), se não enfatiza a relação pai e filho, tangencia de certa forma a história de GONZAGA, já que há também uma história de amor impossível entre um menino pobre e uma garota rica.

Do elenco, Nanda Costa, que faz o papel de um dos amores de Gonzaga e mãe de Gonzaguinha, continua exercitando o seu sex appeal, tão bem acentuado em FEBRE DO RATO, de Cláudio Assis. Aqui, claro, como um “filme de família”, esse elemento é bastante atenuado. Júlio Andrade, o protagonista de um dos meus filmes brasileiros favoritos dos últimos anos - CÃO SEM DONO, de Beto Brant e Renato Ciasca - está ótimo representando Gonzaguinha. E o pouco conhecido músico Nivaldo Expedito de Carvalho, mais conhecido como Chambinho do Acordeon, fazendo a versão de Gonzagão no auge da popularidade, não faz feio e pegou uma responsabilidade e tanto. Também vale destacar a beleza encantadora de Cecília Dassi, a jovem moça que faz o papel do primeiro amor de Gonzaga, lá em sua terra natal, Exu, sertão de Pernambuco.

Quando o filme termina a gente quer mais. Mas também não dá para negar que a obra tem os seus problemas. A começar pela própria relação entre pai e filho, principalmente perto do final, quando eles reatam. É como se Silveira tivesse perdido a mão naquele momento. O diretor se deixou levar por um tipo de dramaturgia próxima da televisão brasileira, com tudo narrado de maneira rápida, sem tempo para respirar e chorar. E isso, vindo de um diretor que costuma abraçar os sentimentos nos filmes, não ficou, digamos, legal.

Senti falta também de uma maior presença de Humberto Teixeira, o principal parceiro das composições de Gonzaga, que aparece muito pouco e que foi uma presença importantíssima para dar densidade às canções do Rei do Baião. Suas duas pequenas participações chegam a ser ridículas. Pode-se dizer que isso acontece porque a intenção do filme é enfocar a relação entre pai e filho, mas o diretor procura contar a história da trajetória de Luiz Gonzaga, e de maneira até bastante didática. Logo, seria uma falha.

Como a Globo vai exibir o filme como minissérie, com cenas extras, pode ser que essas cenas ajudem o filme a respirar melhor. Mas, por outro lado, ver o filme em pedaços não é tão interessante como vê-lo de uma só tacada. Até porque ele não é longo. Portanto, a sala escura ainda é o melhor lugar para apreciá-lo.

sexta-feira, outubro 26, 2012

PARAÍBA MEU AMOR



Antes de mais nada, é sempre bom esclarecer uma coisa: eu não gosto de forró. Aliás, até gosto, embora não me identifique. Mas com o forró tradicional, aquele que aqui chamam de "forró pé-de-serra" e que ainda tem uma ligação com a vida no campo e especialmente com a música do genial Luiz Gonzaga. Não com esse lixo que é despejado nas festas todos os dias e que saem nos carros, perturbando os vizinhos. Esse lixo que toma descaradamente canções estrangeiras de vários artistas e fazem suas versões horrendas.

E tempos atrás eu namorei uma moça que gostava muito de forró. A gente fazia um acordo tranquilo: ela ia para os forrós; eu ia para as festas de rock com os meus amigos. Não era um acordo muito justo, mas fazer o quê? Com o esfrega-esfrega dos corpos de quem dança forró, era muito mais fácil eu receber chifre na história. Aliás, é uma das grandes vantagens do forró em relação a outras festas: essa possibilidade de você abordar mais facilmente uma mulher. Mas fazer o quê se eu não aguento ficar dez minutos numa festa dessas?

Quanto a PARAÍBA MEU AMOR (2008), o filme que abriu a Mostra Bernard Robert-Charrue, é uma obra que eu vejo até com certo distanciamento. E com estranheza, por incrível que pareça, pois não vejo Chico César como cantor de forró nem como autoridade no assunto. Ter colocado ele como "personagem" de destaque do documentário não foi das melhores ideias. Ele, inclusive, comete alguns deslizes ao falar sobre o significado da letra de "Paraíba", de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira. Mas ele é um artista eloquente e até chega a convencer.

Se o filme peca pela presença excessiva de Chico César, ele acerta ao mostrar os duetos entre Dominguinhos e o músico francês Richard Galliano, que afirmou ser aquele momento ao lado de seu ídolo Dominguinhos o melhor dia de sua vida. A fotografia do filme é bem cuidada e as locações para as apresentações musicais quando em interiores acontecem sempre dentro de casas de taipa. Pode soar meio estereotipado, mas acaba ficando plasticamente interessante.

O pouco histórico que há sobre o forró, trazendo de volta o mito do "for all" e à importância de Luiz Gonzaga para a disseminação do gênero no Brasil a partir da década de 1940 não é o bastante, mas ajuda. Até mesmo a busca de outros músicos paraibanos seria interessante para enriquecer o trabalho, mas se ele assim o fizesse correria o risco de não dar conta de tanta coisa. Assim, os melhores momentos são os que mostram Pinto do Acordeon e Aleijadinho de Pombal, além do próprio Dominguinhos, já velho conhecido. Uma pena ter mostrado pouco do grupo "Os três do Nordeste". No fim das contas, não deixa de ser curioso ver o olhar de um estrangeiro diante de algo tão próximo da gente.

Ah, e hoje, coincidentente, estreia GONZAGA – DE PAI PRA FILHO. O documentário de Robert-Charrue acabou servindo como um aquecimento para a cinebiografia do Rei do Baião.

P.S.: Pesquisando sobre o filme, encontrei essa interessante análise que não se limita ao filme, mas à própria história do forró. Texto muito gostoso e feito por quem, pelo visto, entende do riscado. AQUI.

P.P.S. Confira a programação da Mostra Bernard Robert-Charrue AQUI.

quarta-feira, outubro 24, 2012

O SEGREDO DA CABANA (The Cabin in the Woods)



Eu adoro ver filme no cinema. E faço questão de ver na salinha escura aqueles que eu mais aguardo, mesmo quando eles já existem para download em excelente qualidade na rede. Eu fui um dos poucos que esperou por À PROVA DE MORTE, do Tarantino, no cinema. Foi quase uma prova de fé e paciência. Lembro que houve uma mobilização entre blogueiros para que o filme chegasse às salas e a distribuidora não dizia de uma vez se iria ou não lançá-lo direto em DVD. Até que resolveram lançar, em poucas e porcas cópias. No fim das contas, ao chegar em casa, eu preferi revê-lo, pois a cópia digital estava mutilada.

Todo esse prólogo é para falar do quanto eu esperei por O SEGREDO DA CABANA (2011). Não foi tanto quanto o filme do Tarantino, claro, mas desde o ano passado que existe um burburinho em torno do filme entre fãs de cinema de horror. E a Universal, que estava com ele programado para o dia 2 de novembro deu pra trás e resolver mandar tirar os trailers e cartazes de todos os cinemas. Ainda não li nenhum comunicado oficial, mas é o que dizem os amigos que têm mais contato com essas distribuidoras. Se ainda havia dúvida, ela foi sanada com a saída do filme do calendário do site Filme B.

Então, fui de torrent. Dei preferência a um arquivo mkv em 720p com áudio 5.1. Não é tão gostoso quanto no cinema, mas foi o melhor que eu pude fazer para simular uma sessão. Tanto é que não quis ver o filme depois da meia-noite, pois sabia que o barulho poderia incomodar os vizinhos. E o filme é isso tudo que dizem mesmo? Creio que sim, embora tenha lido rapidamente comentários diversos a respeito. Só acho que a Universal perdeu a oportunidade de lançar o que poderia ser o melhor filme de horror do ano.

O SEGREDO DA CABANA é filme de diretor estreante (Drew Goddard), mas o sujeito é quase um veterano em roteiros, tendo colaborado em séries como BUFFY – A CAÇA-VAMPIROS, ANGEL, ALIAS e LOST. Faz todo o sentido ver o seu nome relacionado a essas séries, junto com o amigo Joss Whedon, que colaborou no roteiro e que tornou os diálogos simples e eficientes.

O SEGREDO DA CABANA une o tradicional filme de jovens indo passar um fim de semana numa cabana isolada e vendo-se diante de situações aterrorizantes - que remete principalmente a EVIL DEAD – e algo mecânico ou eletrônico, que justapõe com o lado sobrenatural. Quem viu LOST sabe muito bem como é. Mas a vantagem do filme é que ele é redondinho. Os personagens, se são estereótipos, é porque deveriam mesmo ser. E ainda assim gostamos da turma. E sabemos que boa parte deles serão mortos ao longo do filme.

Dos atores jovens, o único realmente conhecido é Chris Hemsworth, que ficou famoso como o Thor. Mas lá do outro lado dos controles, temos Richard Jenkins e uma atriz bem conhecida que aparece no final e que eu imagino que não seja boa ideia dizer quem é. Afinal, é para ser uma surpresa. No mais, é filme de sustos, de gore, de surpresas, de monstros, de zumbis, de fantasmas, de jovens querendo namorar, de pessoas más e de reality show. Só isso já é muita coisa para um filme de uma hora e meia. Mas Goddard consegue pegar essa salada de opções e fazer um belo trabalho.

terça-feira, outubro 23, 2012

O VINGADOR DO FUTURO (Total Recall)



O termo “refilmagem desnecessária” já deve ter sido dito inúmeras vezes, mas poucas vezes teve tanta razão de ser como em relação a este filme. O VINGADOR DO FUTURO (1990), de Paul Verhoeven, beirava à perfeição e deixou muita gente fritando os neurônios para entender a trama, que era ousada demais para o público mal acostumado com os filmes estrelados por Arnold Schwarzenegger. Eu tenho a lembrança de estar no cinema na época e de ver um sujeito desesperado, sentado na fileira da frente dizendo “cara, eu não tou entendendo nada!”. Vendo hoje em dia, vemos que o filme nem é tão complicado assim. Enfim, um filme que marcou época, e que ainda trazia a Sharon Stone em momento pré-INSTINTO SELVAGEM.

Se uma coisa que O VINGADOR DO FUTURO (2012), o remake de Len Wiseman, tem de bom é a presença de duas beldades: Kate Beckinsale, que reprisa o papel de Sharon Stone e ganha mais tempo de cena, e Jessica Biel, como a parceira revolucionária do desmemoriado Douglas Quaid, que descobre não ser ele mesmo, mas o perseguido pelo Estado, Hauser, vivido por Colin Farrell. O novo filme enfatiza a questão da falta de sentido na vida do protagonista, que trabalha numa fábrica literalmente do outro lado do mundo.

Isso porque o filme substitui o planeta Marte por um elevador que vai da Grã-Bretanha, o lugar mais decente de se viver numa Terra devastada, até a Oceania, onde vivem os trabalhadores. É lá que trabalha também o personagem de Farrell. E para passar de um lugar para outro, eles usam um elevador que atravessa o centro da Terra. Dentro de um planeta devastado, até que a vida dele não é ruim. Sua casa é decente e a esposa é linda e carinhosa. Ou pelo menos interpreta muito bem o papel, como mais tarde ele vai descobrir. E é justamente ao ver Kate Beckinsale fazendo o papel de vilã que o filme ganha uns pontinhos.

Além do mais, por mais que Len Wiseman continue sendo diretor de segunda categoria, vejo-o mais esforçado. Até já fez DURO DE MATAR 4.0 (2007), fugindo um pouco da eterna ligação com a desinteressante cinessérie ANJOS DA NOITE (2003-2012). Assim, em O VINGADOR DO FUTURO, por mais ingrato que seja o trabalho, pois sempre vão comparar com o incrível filme de Verhoeven, até que ele não se saiu tão mal assim. Diria que o filme cai um pouco lá pela segunda metade, mas, levando em consideração todas as (baixas) expectativas, imaginei que fosse muito pior.

segunda-feira, outubro 22, 2012

DREDD 3D



A nova adaptação dos quadrinhos do herói justiceiro Juiz Dredd, que em 1995 ganhou uma adaptação estrelada por Sylvester Stallone, foi muito bem sucedida. Pelo menos do ponto de vista artístico, já que o filme, uma produção Reino Unido-Estados Unidos-Índia, não obteve o sucesso comercial pretendido, mesmo tendo sido filmado em 3D, o que geralmente ajuda nas receitas.

O que é uma pena, pois DREDD 3D (2012) traz uma das melhores utilizações da tecnologia em três dimensões que se pôde ver até o momento. Assim, poucos puderam conferir o filme enquanto ele esteve em cartaz. O fracasso comercial talvez se deva à falta de popularidade do personagem, bem como de uma maior divulgação. O fato de não ter também nenhum astro famoso contribui. Há também o fato de o filme ter recebido aqui classificação indicativa 18 anos.

Na trama, o Juiz Dredd (Karl Urban, que nunca tira o capacete) é um dos vários juízes que operam num futuro distópico, onde a maioria das pessoas vive em situação de miséria. Atualmente eles têm que enfrentar um grupo que opera com uma nova droga, a slo-mo, que faz com que o usuário veja tudo como em câmera lenta. Um dos sujeitos que foi assassinado pela máfia do filme foi jogado do alto do prédio logo depois de ter tomado a droga. Logo, a queda para ele foi como se tivesse durado uma eternidade. A máfia é chefiada pela Ma-Ma, vivida por Lena Headey, mais conhecida como a perversa Cersei Lannister de GAME OF THRONES.

Dredd é incumbido de treinar a jovem Cassandra Anderson (Olivia Thirlby), que tem a habilidade de ler pensamentos. O que ele não gosta é da ideia de ir logo para um local bastante perigoso de uma cidade que por si só já é perigosa, uma espécie de favela vertical de 200 andares, comandada pela Ma-Ma. E é lá que se passa a maior parte da trama.

A violência do filme é bem gráfica e impactante e isso ajuda a tornar a trama mais interessante e envolvente. Uma das qualidades de DREDD é ir direto ao ponto. O filme não perde muito tempo com prólogos, apresentações ou introduções. Os personagens são apresentados bem rapidamente e a ação se não é tão rápida é porque há também a intenção de se criar um clima quase de film noir, com uma fotografia bastante escura. Vale a experiência.

domingo, outubro 21, 2012

EMMANUELLE



Ah, os anos 70. Sorte teve quem viveu aquela época de maior liberação. Quando se podia fazer sexo sem se preocupar em contrair HIV. Mas aqui no Brasil, a liberdade foi um pouco castrada por causa da ditadura. Na época que EMMANUELLE (1974) estreou na Europa, o filme foi proibido no Brasil, tendo sido liberado apenas em 1980. Hoje em dia o filme não tem nada de muito escandaloso, a não ser para as pessoas totalmente desacostumadas com qualquer erotismo nas telas, o que deve se restringir a religiosos xiitas - se bem que eu nunca tinha visto mulher fumando cigarro pela vagina antes. Hoje em dia é possível ver o filme até com certo distanciamento. Para o bem e para o mal, já que seria interessante se a obra ainda tivesse um efeito excitante. Há, é verdade, alguns momentos levemente excitantes, como a sequência da jovem Marie-Ange (Cristine Boisson) se masturbando no alpendre na frente de Emmanuelle (Sylvia Kristel).

Recém-chegada a Tailândia, Emmanuelle recebia conselhos do marido para que fosse livre. Ele dizia que era importante para ela ter experiências sexuais com outras pessoas. Seria, então, um relacionamento aberto. Mas Emmanuelle não parece muito entusiasmada com essa liberdade. E não vê muita graça quando a apresentam a Mario (Alain Cuny), um velho Dom Juan que tem a fama de ser um mestre do erotismo.

O mais bonito do filme – além das locações exóticas - é quando Emmanuelle é levada pelos sentimentos, não pelos sentidos. Isso acontece quando ela conhece a bela loira Bee (Marika Green), por quem se apaixona e resolve seguir os seus passos. As cenas de amor entre as duas nem são tão convincentes assim, talvez porque o cinema erótico softcore ainda estivesse engatinhando, por isso o destaque é a beleza plástica da fotografia, de ver as duas juntas, e principalmente de mostrar Emmanuelle linda e de coração partido.

Sylvia Kristel, a eterna Emmanuelle, tinha então apenas 22 anos quando o filme foi lançado, fazendo um sucesso de público tremendo. Ela faria mais três continuações de seu filme mais famoso nas décadas de 70 e 80. E na década de 90 ela faria uma série de telefilmes em que seria uma Emmanuelle experiente, contando suas aventuras e sempre com uma Emmanuelle mais jovem fazendo as cenas mais picantes. Infelizmente ela ficou mais famosa por esse papel, embora tenha trabalhado com cineastas de prestígio, como Claude Chabrol, Alain Robbe-Grillet, Roger Vadim e Walerian Borowczyk. No último dia 18, aos 60 anos de idade, ela deixou o nosso planeta.

sábado, outubro 20, 2012

PUREZA PROIBIDA



O terceiro longa-metragem de Alfredo Sternheim, PUREZA PROIBIDA (1974), foi uma produção cheia de problemas nos bastidores. O próprio Sternheim não acha um absurdo acreditar que isso possa ter ocorrido porque o filme lida com o candomblé, ainda que tangenciando a trama principal, que é o relacionamento amoroso que cresce entre uma noviça recém-chegada a um convento (Rossana Ghessa) e um pescador negro (Zózimo Bulbul).

Os problemas principais nas filmagens começaram com uma crise renal do diretor, mas isso passou logo. O que veio em seguida foi o problema com a ex-mulher do diretor de fotografia, Ruy Santos. Ele estava em processo de separação com a mulher. E no meio das filmagens, ela comete suicídio. O terceiro acidente foi com Carlo Mossy, que interpreta um padre no filme. Ele sofreu um acidente de carro que o deixou imobilizado por três meses. Acabou sem filmar duas sequências que faltavam. Pelo jeito, tem cara de ser filme maldito, mas pode ter sido tudo coincidência.

Rossana, que era também produtora do filme, está radiante e linda. Sua personagem é adorável e sua pureza faz com que ela entre em conflito com os dogmas e a rigidez moral da Igreja. O andamento da narrativa foi bem acertado, com momentos de lirismo, especialmente quando o casal está junto. Até pensei que o filme seria algo mais erótico, mas até o pouco de nudez e sexo que o filme tem é muito discreto. Talvez pelo fato de a própria Rossana ser a produtora. Assim, ela que ditava as regras.

Pena que a cópia que eu consegui do filme é bem ruim, com o som tornando quase incompreensíveis as falas. Muitas vezes tinha que aumentar o volume e ficava aquele barulho desagradável. Isso acabou tirando um pouco o prazer de ver o filme. Infelizmente em se tratando de cinema brasileiro, a situação é assim. Isso quando temos sorte de conseguir as cópias que queremos.

sexta-feira, outubro 19, 2012

ATIVIDADE PARANORMAL 4 (Paranormal Activity 4)



Não dá para esperar muita coisa de uma franquia que já se estabeleceu através de uma fórmula que se repete ao longo dos filmes. O que conta é o que há de diferente entre cada exemplar. ATIVIDADE PARANORMAL 4 (2012) conta com a mesma dupla de diretores do bem sucedido terceiro filme, Henry Joost e Ariel Schulman. Porém, diferente do terceiro filme, que poderia ser assistido como uma produção independente da franquia, por ser uma prequel, o quarto filme retoma os fatos dos dois primeiros filmes, trazendo de volta a mitologia envolvendo a personagem de Katie Featherston (Katie), a mulher que, depois de possuída por uma entidade maligna, matou o marido, a irmã, o cunhado e sequestrou o sobrinho, ainda bebê.

O novo filme se passa seis anos depois dos eventos do segundo, já em 2011, e com a utilização das tecnologias das webcams como elemento rotineiro na vida das pessoas. Desta vez, a protagonista é a jovem adolescente Kathryn Newton, tão bonita que a câmera parece estar namorando ela o tempo inteiro, mesmo em momentos de tensão. O próprio namorado faz insinuações para aquecer o relacionamento, mas a garota é resistente.

Ela mora na casa em frente à de Katie e seu filho, um garoto estranho que passa uns dias em sua casa pois sua mãe foi supostamente levada para um hospício por causa de algo que não foi revelado. Há também um segredo envolvendo o irmão mais novo de Katie. Os incidentes "à poltergeist" começam a acontecer justamente com a entrada na casa do tal garoto esquisito. 

Um dos grandes baratos desta franquia é o fato de fazer com que o espectador fique prestando atenção nos detalhes, que podem surgir em qualquer lugar do campo de visão. E quando este campo é excessivamente coberto, a expectativa de um susto ou um arrepio aumenta. De certa forma, o filme em certo momento trai as próprias regras, colocando trilha sonora não diegética nos momentos finais, fazendo com que a ideia de que se trata de imagens encontradas (found footage) perca um pouco o sentido.

Embora os diretores não deixem a peteca cair e tragam algumas novidades, especialmente para o final do filme, pode-se dizer que este quarto título é um dos menos criativos da série. Há citações explícitas a filmes como O ILUMINADO, de Stanley Kubrick (o garotinho no triciclo), e a O EXORCISTA, de William Friedkin (o corpo sendo levantado), e a história traz novos elementos ao que havia sido contado nos filmes anteriores.

ATIVIDADE PARANORMAL 4 e seus antecessores são melhor experienciados na sala escura do cinema. Não por causa da qualidade da imagem, que de propósito não chega a ser caprichada – afinal, a intenção é parecer uma colagem de vídeos caseiros -, mas pelos efeitos sonoros e ruídos, que são beneficiados pelo sistema de som do cinema. E o interessante desses filmes é que o público já se acostumou com os finais abruptos, o que não deixa de ser algo positivo, ainda que no fundo haja uma conclusão e um clímax, que se percebe principalmente quando assombrações sutis passam a se tornar exageradas.

De 2009 a 2012, todos os anos tivemos um exemplar da franquia exibido nos cinemas. Mesmo repetindo a fórmula, ATIVIDADE PARANORMAL ainda tem fôlego para mais um ou dois filmes. Vai depender da criatividade de seus criadores e do quanto o público estiver disposto a pagar para continuar vendo.

quinta-feira, outubro 18, 2012

RUBY SPARKS – A NAMORADA PERFEITA (Ruby Sparks)



Que PEQUENA MISS SUNSHINE (2006) é um filme simpático, não tenho como discordar, mas é preciso mais do que um filme simpático para firmar uma carreira no cinema. E a estreia na direção de longa-metragem do casal de videoclipeiros Jonathan Dayton e Valerie Faris prometia muito mais. Demoraram demais a fazer um novo filme e vieram com este RUBY SPARKS – A NAMORADA PERFEITA (2012), filme preguiçoso e chato sobre o processo criativo e uma história não muito original sobre uma personagem de ficção que cria vida.

Muito provavelmente o filme só tenha nascido graças ao roteiro de Zoe Kazan, que faz a personagem-título. A jovem atriz e roteirista tem um rosto familiar, desses que a gente já viu em algum lugar, mas não lembra onde. Ela é neta do diretor Elia Kazan e mulher de Paul Dano, o astro do filme. Eles formam um casal que combina com o jeito indie de se fazer cinema nos Estados Unidos atualmente. E dizer isso, na maioria das vezes, não é um elogio. Na verdade, o cinema indie foi ganhando cacoetes com o tempo e há quase sempre a figura do perdedor.

Paul Dano é um ator que combina com esse tipo de personagem e até que faz um bom trabalho dentro do possível. O problema está mesmo no enredo e na direção que poderiam até render algo bom, mas que me fizeram olhar para o relógio diversas vezes, o que não é um bom sinal. O filme tem mais ou menos a mesma duração de A DELICADEZA DO AMOR, que eu vi com prazer logo em seguida. Quer dizer: dois filmes sobre pessoas com dificuldades de ter relacionamentos amorosos. Um tenta fazer algo inteligente, brincando com a metalinguagem e tem um resultado que causa tédio; o outro não tenta inventar a roda e é de uma sensibilidade admirável.

Na trama de RUBY SPARKS, Paul Dano é Calvin Weir-Fields, um jovem escritor que acertou em cheio em seu primeiro romance, mas que nunca mais fez outro tão bom. Ele, então, tem um sonho, no qual vê uma moça que fala com ele. E o sonho é a inspiração para que ele comece a escrever sobre ela. O que ele não sabia é que ela apareceria em seu apartamento, não como uma alucinação, mas como uma pessoa de verdade.

A partir daí o filme brinca com esse elemento fantástico, mas tentando enfatizar a questão do relacionamento, do quanto uma pessoa é "dona" de outra, da liberdade que cada um deve ter, da insatisfação quanto à pessoa – se ela é muito carente, é ruim; se for muito independente, o sujeito pode ficar com ciúmes. Há, então, toda uma série de assuntos que poderiam ser explorados com mais sensibilidade. Afinal, esses temas requerem maior tato da parte dos diretores.

Assim, continuo achando que os melhores trabalhos de Jonathan Dayton e Valerie Faris foram os clipes que eles fizeram para os Smashing Pumpkins, em especial, "1979" e sua continuação, "Perfect". São videoclipes que lidam com os prazeres e as aventuras da juventude e as obrigações da vida adulta, respectivamente. Em poucos minutos e com a ajuda das canções inspiradas dos Pumpkins, eles abordam esses assuntos com propriedade. Passados tantos anos dessas realizações – e de PEQUENA MISS SUNSHINE -, é possível que o casal tenha perdido a mão.

Ah, e para quem assiste TRUE BLOOD e é fã da vampira Jessica, Deborah Ann Woll tem uma participação pequena no filme, mas que foi o único momento que realmente me entusiasmou. No mais, o elenco de apoio conta com Antonio Banderas, Annette Bening e Elliot Gould.

quarta-feira, outubro 17, 2012

A DELICADEZA DO AMOR (La Délicatesse)



Ao sair da sessão de A DELICADEZA DO AMOR (2011), de David e Stéphane Foenkinos, fiquei me perguntando qual o segredo para que um filme com um enredo tão simples fosse tão bem sucedido em conquistar a plateia. Por plateia, refiro-me a mim e a ao pequeno grupo que parecia estar verdadeiramente se divertindo e se envolvendo com a história da jovem viúva que tem muita dificuldade em voltar a se relacionar novamente com alguém e que encontra na figura de um sujeito considerado feio e ordinário um possível caminho de volta para a vida além da rotina do escritório.

Só o fato de o filme tirar a implicância que eu tinha com Audrey Tatou por causa de O FABULOSO DESTINO DE AMÉLIE POLAIN já merece o meu respeito. Terminada a sessão, inclusive, fica até difícil imaginar outra atriz para o papel. Se ela não tem uma beleza exuberante, o filme trata de acentuar isso em diversos momentos, para benefício da história; do mesmo modo que acentua o que lhe há de belo quando ela precisa brilhar mais. Claro que isso vem muito dos efeitos de maquiagem, cabeleireiro e figurino, mas há também a sintonia perfeita com o enredo. O mesmo se pode dizer do desajeitado personagem vivido por François Damiens.

No início, o filme parece não negar as suas origens, isto é, o romance A Delicadeza, escrito por um dos diretores, David Foenkinos. Isso porque a primeira sequência já mostra a utilização de uma voice-over, que geralmente é a tentativa mais fácil de se traduzir o pensamento do personagem de uma prosa de ficção para a linguagem cinematográfica. Porém, embora esse recurso apareça novamente, ele é muito pouco utilizado ao longo do filme. Aliás, se há uma coisa que não se pode acusar A DELICADEZA DO AMOR é de ser “literário”, já que a dupla de cineastas usa diversas estratégias para fazer bom cinema, seja através de elipses, montagens inesperadas, split screen ou fotos.

A tradição francesa de usar muito a palavra não faz de A DELICADEZA DO AMOR uma exceção, embora seja exagero chamá-lo de verborrágico. O filme até lembra mais o cinema americano do que o cinema europeu, na forma de contar a história. E sua história é muito simples. Difícil é desenvolvê-la e fazer com que o espectador se envolva. E esse é um dos grandes méritos deste filme que faz rir, embora trate sua história e seus personagens com seriedade.

Os irmãos David e Stéphane Foenkinos acertaram em cheio em sua estreia na direção de longa-metragem. Esperamos que saiam outros filmes tão bons e agradáveis quanto este, que além de tudo sabe quando terminar. E de maneira poética, utilizando muito provavelmente as palavras do próprio romance, mas com a força das imagens que o bom cinema é capaz de impor.

terça-feira, outubro 16, 2012

PORTO DOS MORTOS



Filmes de zumbis hoje existem aos borbotões. Saídos não só dos Estados Unidos, mas também da França, da Inglaterra e até de países com pouca tradição no subgênero, como Cuba, que pariu o tão bem recebido JUAN DOS MORTOS. Aqui no Brasil, praticamente na mesma época foram rodados outros filmes de zumbis, como CAPITAL DOS MORTOS, em Brasília; MANGUE NEGRO, no Espírito Santo; e PORTO DOS MORTOS (2011), em Porto Alegre.

Dirigido por Davi de Oliveira Pinheiro, PORTO DOS MORTOS é um projeto feito com poucos recursos, mas com vontade de inovar, de fazer diferente. Para começar, não se trata de um filme de zumbis tradicional. Os mortos-vivos, por exemplo, ficam em segundo plano na trama, mais servindo para acentuar o clima pós-apocalíptico do mundo apresentado. Eles são até inofensivos. O perigo está nos vivos.

E por isso um jovem casal tem a "sorte" de encontrar um policial sem nome, um homem que faz o possível para proteger os dois jovens do perigo daquele mundo esquecido por Deus, enquanto está à procura de um assassino serial. Esse é o principal ponto de partida do filme, o que já denota que os vivos são mais perigosos que os desmortos.

O que me desagradou e pode desagradar boa parte da audiência, principalmente a que espera um filme de zumbis próximo do tradicional, é o seu andamento lento que parece não chegar a lugar nenhum e o fato de ser excessivamente sério – ou de ter um senso de humor bem particular. Isso está presente principalmente no protagonista, vivido por Rafael Tombini. Muitas vezes seu modo de agir parece mais apropriado a uma comédia, mas isso soaria dissonante com o tom geral do filme. Por outro lado, difícil não ficar impressionado com os ótimos efeitos visuais e de maquiagem de Kapel Furman, o nosso Greg Nicotero, além do belo trabalho de direção de arte e fotografia.

Mas o importante é que o filme reuniu qualidades suficientes para ser selecionado para os mais importantes festivais internacionais de cinema fantástico. Recentemente PORTO DOS MORTOS foi selecionado para o Festival de Sitges, na Espanha. Antes foi exibido em Chicago, Nova York, Havana, Montevidéu. Atualmente está disponível no Netflix e está previsto para estrear nos cinemas brasileiros no próximo dia 2 de novembro, começando por Porto Alegre.

Tive a oportunidade de entrevistar Davi de Oliveira Pinheiro durante o Festival de Gramado, onde ele exibiu um curta-metragem, O BEIJO PERFEITO (2012). Perguntei-lhe como foi que surgiu a ideia de fazer PORTO DOS MORTOS e ele me disse que sempre foi apaixonado por gêneros, mas que estava trabalhando muito com dramas e comédias. Daí surgiu o desejo de fazer coisas mais violentas. Ele disse que é uma pessoa muito violenta no sentido de se irritar facilmente, mas que é uma violência controlada, e que ele queria muito colocar essa violência velada dentro de um filme. Davi falou que, no início, o projeto de PORTO DOS MORTOS era de um filme de zumbis tradicional, lembrando sempre o western ONDE COMEÇA O INFERNO, de Howard Hawks, com pessoas encurraladas e perseguidas por mortos-vivos.

Daí veio a necessidade de fazer algo diferente. E os zumbis acabaram se tornando cenário dentro do filme, que enfatiza mais os relacionamentos entre os personagens e a atmosfera. Ele falou sobre o título, que não apenas se refere à capital gaúcha, mas também remete a PORTO DAS CAIXAS, de Paulo Cesar Saraceni. Há também outro significado para o título, mas creio que falar isso seria entregar um pouco algo que está mais para ser interpretado pelo espectador. Segundo Davi, eu fui a primeira pessoa que ele falou isso em entrevista, o que me deixou feliz. A entrevista (na verdade, mais um gostoso bate-papo) foi bem interessante e se encaminhou por temas como Jodorowsky, esoterismo e religião. Quem sabe um dia eu publico, depois que eu transcrevê-la, editá-la e pedir a autorização dele.

segunda-feira, outubro 15, 2012

OS INFRATORES (Lawless)



Seguindo a tradição do sangrento e emblemático BONNIE & CLYDE – UMA RAJADA DE BALAS, de Arthur Penn, que por sua vez já era herdeiro dos polêmicos filmes de gângster da Warner da década de 1930, OS INFRATORES (2012), de John Hillcoat, é uma das mais gratas surpresas do ano. Aos poucos Hillcoat vem solidificando sua carreira e ganhando mais atenção, não só da crítica, como também do público. No caso de OS INFRATORES, o elenco estelar ajuda bastante, mas nada como ter perfeito controle da narrativa para deixar o espectador satisfeito.

O filme de Hillcoat adapta o livro The Wettest County in the World, escrito pelo neto de Jack Bondurant, no filme interpretado por Shia LaBeouf. O jovem astro interpreta o caçula dos irmãos que sobreviviam destilando uísque e conhaque durante a Lei Seca nos Estados Unidos do início da década de 1930, quando o país passava pela chamada Grande Depressão. Completam o grupo de irmãos os atores Tom Hardy e Jason Clarke, nos papéis de Forrest e Howard, respectivamente.

Vale destacar a performance de Hardy, que tem se mostrado diferente em cada produção, provando que tem talento debaixo dos músculos. Ele aparece ainda com aquele corpo do Bane, de BATMAN – O CAVALEIRO DAS TREVAS RESSURGE; por isso, o aspecto quase indestrutível de seu personagem acaba sendo fácil de ser "comprado" pelo espectador, ainda que em determinado momento, eu tenha suspeitado que sua invencibilidade tivesse chegado ao fim.

Outro trunfo do filme é ter uma violência que contagia, não só pelo aspecto gráfico, mas principalmente por ter um antagonista de peso, na figura de Guy Pearce, que faz um vilão tão odioso que é impossível não torcer por sua morte ou sofrimento, de preferência nas mãos dos irmãos Bondurant. Há diversas sequências impactantes envolvendo Pearce, mas nada como o clímax, no final, que encerra com chave de ouro este belo trabalho de Hillcoat, que já havia mostrado talento e sensibilidade no drama pós-apocalíptico A ESTRADA (2009).

Boa parte do sucesso do filme também se deve à parceria que o cineasta fez com o cantor Nick Cave, que aqui se saiu muito bem como roteirista e autor das canções do filme, junto com Warren Ellis (não confundir com o homônimo e talentoso escritor de histórias em quadrinhos). Cave já havia trabalhado também na função de roteirista em outros dois trabalhos de Hillcoat, A PROPOSTA (2005) e o pouco conhecido GHOSTS... OF THE CIVIL DEAD (1988).

Não posso encerrar o texto sem mencionar o belíssimo elenco de apoio, em especial Jessica Chastain e Mia Wasikowska, duas das melhores revelações femininas dos últimos anos. Vale destacar também o trabalho do jovem Dane DeHaan (de PODER SEM LIMITES), que interpreta o ajudante dos irmãos Bondurant na destilaria e melhor amigo de Jack. Há também, ainda que em participação pequena, Gary Oldman, grande camaleão do cinema contemporâneo, muito à vontade na pele de um poderoso gângster do estado da Virgínia.

domingo, outubro 14, 2012

A VOLTA DOS MORTOS-VIVOS (The Return of the Living Dead)



Quem teve a oportunidade de ver na televisão – ou, melhor ainda, no cinema -, nos anos 1980, A VOLTA DOS MORTOS VIVOS (1985) com certeza deve lembrar com carinho deste que é um dos melhores e mais divertidos filmes de zumbis até hoje realizados. Dirigido por Dan O'Bannon, que havia escrito o roteiro de ALIEN – O 8° PASSAGEIRO (1979), o filme, como vários tantos que foram influenciados pelo clássico de George A. Romero, A NOITE DOS MORTOS VIVOS, presta tributo à obra, mas também brinca com a possibilidade de o filme de Romero ter sido inspirado em fatos reais que não foram divulgados pela imprensa por serem confidenciais para o exército americano.

Ao contrário do pai dos zumbis modernos, O'Bannon procura dar uma explicação para o aparecimento dos desmortos. E mais: as regras também mudam: diferente do tradicional tiro no cérebro que dá cabo dos mortos-vivos, os zumbis de A VOLTA DOS MORTOS-VIVOS não morrem nem mesmo quando são esquartejados. E uma solução encontrada para dar fim ao corpo esquartejado de um deles acaba desencadeando uma situação ainda pior.

Embora seja tratado com muito bom humor e até leveza, com um andamento narrativo que é uma delícia e uma trilha sonora punk rock que torna o filme ainda mais gostoso, outro motivo fundamental para não esquecer o filme é a punkzinha que fica pelada no cemitério e que até hoje deve habitar a memória afetiva de muitos espectadores que o viram em sua adolescência. Na trama, ela faz parte de um grupo de punks de butique que, para passar o tempo enquanto esperam um amigo, resolvem dar um pulinho no cemitério da cidade.

Muito bom rever o filme, agora em sua janela correta e com som 5.1 e constatar que ele continua tão bom e divertido quanto na época de sua exibição nos cinemas (ou na televisão). Vemos o quanto a produção foi transgressora, principalmente se a compararmos com o ar de reverência que tantos filmes, séries e quadrinhos continuam tratando as regras criadas por Romero para os zumbis.

sábado, outubro 13, 2012

TOTALMENTE INOCENTES



Aproveitando que eu estou meio ranzinza, mesmo estando numa casa de praia, não esqueço o blog e os filmes. Aproveito a internet de um amigo para atualizar o espaço com um filme que não merece muito o nosso apreço, a comédia paródica TOTALMENTE INOCENTES (2012), estreia de Rodrigo Bittencourt na direção. O filme pretende ser moderno, além de querer se vender também como a primeira paródia brasileira, a exemplo do que é feito nos Estados Unidos, com filmes como TODO MUNDO EM PÂNICO. A intenção de TOTALMENTE INOCENTES é parodiar os chamados "favela movies", como CIDADE DE DEUS e TROPA DE ELITE. Mas acaba também fazendo uma citação ao clássico A RAINHA DIABA, já que o primeiro dono da boca de fumo no filme é um homossexual bem afetado, mas que também sabe quando é o momento de mostrar o seu lado mais viril.

O filme é uma grande bobagem que já desagrada desde o começo, por mais que possamos imaginar que um filme como esse é inofensivo. Tenho minhas dúvidas quanto a isso. Um filme como esse e provavelmente também o que está sendo exibido atualmente, ATÉ QUE A SORTE NOS SEPARE, são muito danosos para o cinema brasileiro. Se a resposta do público é positiva é porque eles estão mal acostumados com produções para cinema com cara de produções televisivas. E da pior safra, já que nunca a televisão brasileira aberta esteve tão ruim. Assim, casos como o de TROPA DE ELITE e sua continuação acabam sendo exceções, por serem produções de qualidade que alcançaram o grande público.

Na trama, se é que vale a pena falar, há um garoto do morro que é apaixonado por uma moça da mesma comunidade (Mariana Rios), tida como a princesinha do morro e desejada pelo líder da boca de fumo da área, vivido por Fábio Porchat. Fábio Assunção é um repórter atrapalhado que está querendo sair de férias, mas que só as receberá por sua chefe (Ingrid Guimarães, no papel de uma mulher que gosta de mulher) se conseguir uma matéria boa sobre a situação hostil no morro.

Que nem é mostrada de maneira tão hostil assim (apesar das armas), já que o filme é também feito para agradar uma audiência infantil. Nem dá para imaginar que esse filme tenha conseguido o tanto de bilheteria que conseguiu, sendo tão bobo e mal realizado. As piadas não têm graça, os efeitos especiais para deixar o filme estiloso só o tornam pior, e o roteiro e as atuações são constrangedoras. Não recomendaria este filme para ninguém, mas parece que outras pessoas andaram recomendando. Infelizmente. Será que é este mesmo o cinema que o povo brasileiro quer ver nas telas?

quinta-feira, outubro 11, 2012

55 DIAS EM PEQUIM (55 Days at Peking)



Infelizmente o último filme comercial de Nicholas Ray, 55 DIAS EM PEQUIM (1963), não é apenas chato pra cacete, mas também foi o principal responsável por sua saída de cena. Nem mesmo até o final das filmagens ele permaneceu, sendo substituído por outros dois diretores, por causa de um enfarte. Vai ver foi o acumulado de tanto estresse que ele teve em tantas produções complicadas, tantas brigas com produtores.

Depois de 55 DIAS EM PEQUIM, ele até tentou fazer outros filmes menores, que era sua intenção, mas por um motivo ou outro, esses projetos não deram certo. Exceto um, o experimental WE CAN’T GO HOME AGAIN (1976), que será lançado numa versão restaurada em novembro próximo, nos Estados Unidos. Logo, é possível que eu ainda o veja em breve. Há também UM FILME PARA NICK (1981), de Wim Wenders, cuja codireção é atribuída a Ray. Esse eu já tenho cópia.

Mas falemos um pouco desta despedida de Ray do cinema comercial. Trata-se da segunda parceria com o produtor Samuel Bronston, com quem Ray havia trabalhado em REI DOS REIS (1961). Logo de início, já se percebe o enorme investimento na produção, com cenários que recriam a China da virada do século XIX para o XX e com uma enorme quantidade de extras, tanto de chineses como de estrangeiros.

No filme, uma tomada virtuosa mostra os doze países estrangeiros acampados em território chinês, todos tocando com orquestra sinfônica seus respectivos hinos e com suas bandeiras fincadas e tremulando ao vento. Não deixa de ser um início bastante inteligente e prático de apresentar a situação, embora relações políticas nem sempre sejam simples de entender, pois envolvem também conhecimento da parte do espectador a respeito da história do país ou povo em questão. Mas o filme procura não complicar nesse sentido. Afinal, Bronston queria entretenimento para as massas, por mais que algumas de suas produções épicas tratassem de assuntos mais complexos.

Na trama, a imperatriz chinesa vive dentro da Cidade Proibida, sendo assistida por dois homens: um que acredita que a solução para os problemas da China está principalmente em retirar todos os estrangeiros do território, assim como já têm feito um grupo de rebeldes chamados Boxers; e o outro, que acredita que a situação pode ser resolvida de maneira pacífica. Um pouco como Jesus e Barrabás em REI DOS REIS.

Quando a Rainha dá um ultimato para que todos os embaixadores e seus homens saiam do território chinês, o que eles não esperavam era que o embaixador britânico vivido por David Niven resolvesse assumir uma postura agressiva e continuar no território. Para isso, ele usa de seus dons persuasivos para fazer com que todos os outros líderes das outras nações também fiquem. E começa uma guerra que derramaria sangue de ambos os lados.

O curioso do filme é que ele mostra o ponto de vista dos invasores. E, querendo ou não, por mais que se diga que ele não pinte os chineses como vilões, o modo estranho e caricato deles não é muito atraente. Tanto que eu estranhei o final do filme, já que Ray sempre esteve do lado dos oprimidos. Em 55 DIAS EM PEQUIM,  os personagens não têm carisma, os diálogos são fracos, algumas vezes as atuações chegam a ser até constrangedoras, como a de Ava Gardner, que interpreta uma baronesa russa. Ela seria a maior heroína rayniana do filme, por seu caráter mais marginal. O personagem de Charlton Heston também não ganha a nossa simpatia. Tudo, aliás, parece ter sido feito com boas intenções, mas, no fim das contas, não deu certo.

O escritor de The Films of Nicholas Ray, Geoff Andrew, é defensor ardoroso do filme, apesar de suas falhas, mas eu simplesmente não consigo ser. Considero o pior trabalho de Ray. Mais até do que A VIDA ÍNTIMA DE UMA MULHER (1949), o segundo longa-metragem do diretor, e considerado por muitos como seu ponto mais baixo. Até pretendia fazer um top 10 de Ray agora, mas talvez seja melhor esperar por WE CAN’T GO HOME AGAIN. Vai que é um filme que fica entre os seus melhores.

quarta-feira, outubro 10, 2012

O ANO PASSADO EM MARIENBAD (L'Année Dernière à Marienbad)



Acredito que é natural a gente não gostar de determinado diretor. A gente até pode dar mais chances e conseguir algumas exceções na filmografia do sujeito, mas, em geral, quando não há uma boa sintonia entre espectador e cineasta, isso fica difícil. Da turma da Nouvelle Vague francesa, eu adoro os filmes do Eric Rohmer, do Claude Chabrol, do François Truffaut, de alguns do Jean-Luc Godard, do pouco que vi de Jacques Rivette, mas ainda tenho muita resistência a Alain Resnais, que é um diretor bastante celebrado por críticos e cinéfilos, mas minha relação com ele é mais de respeito do que de admiração.

Mesmo tendo visto seus principais primeiros longas-metragens – HIROSHIMA, MEU AMOR (1959) e agora este O ANO PASSADO EM MARIENBAD (1961) – e tendo visto também os seus últimos trabalhos – BEIJO NA BOCA, NÃO! (2003), MEDOS PRIVADOS EM LUGARES PÚBLICOS (2006) e ERVAS DANINHAS (2009) -, ainda não chegou a vez de eu ser um fã de seu trabalho. Falta eu ver muita coisa ainda dele, mas por enquanto me falta disposição.

Aproveitei que me veio disposição para ver O ANO PASSADO EM MARIENBAD, mesmo já sabendo da fama de difícil do filme. Ponto positivo para eu vê-lo: a comparação que normalmente se costuma fazer com o cinema de David Lynch. Além do mais, não necessariamente preciso entender o filme para gostar dele, apreciá-lo. Essa é uma questão até um pouco polêmica. Mas o fato é que determinados filmes me fazem viajar e eu pouco me importo se o compreendi racionalmente. Se ele mexeu com os meus sentidos e sentimentos já ganhou o meu apreço.

O ANO PASSADO EM MARIENBAD é o caso de filme que é lindo de ver, mas que é cansativo de acompanhar, principalmente quando você se esforça para entender. Robbe-Grillet, o roteirista do filme, disse que "quem tentar extrair um sentido linear do filme, discernir uma lógica coerente de causa e efeito ou uma trajetória plausível em termos de enredo e desenvolvimento de personagens, estará fadado ao fracasso, à frustração e achará o filme incompreensível" (STAM, 2008, p. 341).

Depois que li esse texto vi que queimei meus neurônios à toa. Ainda assim, pude pensar nos personagens como fantasmas. E como o filme tem uma trilha sonora misteriosa e os personagens falam de maneira estranha, sem entonação – algo parecido um pouco com alguns trabalhos de Robert Bresson -, dá para ver o filme como uma espécie de filme de horror de arte, por mais horrível que seja esse tipo de classificação.

Na trama, os dois protagonistas não possuem nomes. Ele é X (Giorgio Albertazzi), um homem que tenta convencer uma mulher, A (Delphine Seyrig), de que os dois já se viram no ano passado em algum lugar. Aos poucos, com a descrição dele e com as idas e vindas no tempo do filme, ela começa a pensar que isso talvez seja verdade, embora esteja tão confusa que não sabe nem há quanto tempo está naquele lugar. Ou por que está ali. Se ela está desorientada, o espectador fica tanto quanto. Além do mais, o filme não segue uma continuidade nos figurinos. De repente, ela aparece com uma roupa totalmente diferente da que estava antes. Segundo Stam, isso antecipou o que seria comum em comerciais de televisão, já na chamada era pós-moderna.

É um ótimo filme para se estudar, pois racionalmente ele pode mesmo ser fascinante. Mas seu hermetismo acaba por afastar até pessoas como eu, que curtem cineastas com fama de difíceis, como Lynch, Buñuel, Jodorowsky, Weerasethakul, Bresson, Tarkovski e até o próprio Robbe-Grillet diretor.

Referência bibliográfica

STAM, Robert. A literatura através do cinema : realismo, magia e a arte da adaptação. Belo Horizonte: UFMG, 2008.

terça-feira, outubro 09, 2012

AQUI É O MEU LUGAR (This Must Be the Place)



Os italianos há tempos têm uma simpatia enorme pelo cinema e pela cultura dos Estados Unidos. Já nos anos 1950, os quadrinhos italianos de Giovanni Luigi Bonnelli mostravam histórias de caubóis contadas com uma admirável intimidade. Depois veio Sergio Leone inaugurando o western spaghetti com um ator americano. E há também histórias de horror e de detetives que mais devem à tradição inglesa e americana do que propriamente aos italianos. Hoje em dia, trazer ator americano para filme europeu virou uma questão comercial, mas que também pode ser visto como respeito mútuo.

É o caso da presença de Sean Penn em AQUI É O MEU LUGAR (2011), de Paolo Sorrentino, um dos cineastas italianos mais festejados da nova geração. Seus filmes AS CONSEQUÊNCIAS DO AMOR (2004), O AMIGO DA FAMÍLIA (2006) e IL DIVO (2008) foram sensação em festivais mundo afora. Eis que AQUI É O MEU LUGAR chega aos cinemas comerciais brasileiros. Aqui, por exemplo, entrou em cartaz num cinema de shopping. O que não deixa de ser interessante, ajudando a diversificar a programação. Pode causar estranheza nos espectadores, afinal, é mesmo um filme estranho, mas inegavelmente tem seus bons momentos.

Na trama, Sean Penn é um velho e aposentado roqueiro que continua usando a mesma maquiagem que usava quando sua banda estava na ativa, nos anos 1980. O personagem foi claramente inspirado em Robert Smith, da banda The Cure. Não apenas pelo visual, mas pelo modo como o personagem descreve seu estilo em determinado momento do filme. AQUI É O MEU LUGAR pede um pouco de paciência ao espectador. Inclusive para entregar um pouco o porquê de algumas cenas, como a visita do protagonista a um cemitério, por exemplo.

O filme conta com uma participação bem especial de David Byrne numa cena surpreendente, que mostra o talento de Sorrentino na utilização do espaço da tela larga. A sequência de um show se transformar numa espécie de videoclipe, usando mais uma grua e uma cenografia especial do que cortes. A cena de Penn conversando com Byrne, que interpreta a si mesmo, é outro momento bem memorável.

Uma coisa que pode incomodar é justamente a interpretação de Sean Penn, por demais afetada no agir e frágil no falar. Ele anda como se estivesse rastejando, sempre com sua malinha com rodinhas pelo caminho. Apesar de ser uma figura estranha, ele vive rodeado por pessoas que o amam, como sua esposa, vivida por Frances McDormand. Sua vida tediosa e depressiva ganha um pouco de sentido quando ele viaja aos Estados Unidos para o funeral do seu pai, com quem nunca teve uma relação amigável. É lá que ele vai encontrar um sentido - pelo menos provisório - para sua vida: terminar aquilo que seu pai não conseguiu fazer enquanto vivo.

Um dos destaques do filme é Eve Hewson, a filha de Bono Vox, que se saiu melhor do que a encomenda como atriz. A bela moça faz o papel da melhor amiga de Cheyenne, o personagem de Penn.

segunda-feira, outubro 08, 2012

MARLEY & EU (Marley & Me)



E finalmente, depois de muita resistência, resolvi assistir MARLEY & EU (2008). Acho que não vi no cinema na época em que passou por ter preconceito com melodrama de cachorro. Tinha visto alguns em sessões da tarde no passado. Lembro de vários que eu vi com a Lassie e não queria repetir de novo a experiência. Mas um outro filme de cachorro, que passou no ano seguinte, SEMPRE AO SEU LADO, de Lasse Hallström, me fez ver que era possível emocionar com um trabalho de qualidade.

Mas o principal motivo para que eu resolvesse finalmente ver MARLEY & EU foi uma foto que uma amiga colocou no Facebook do filme. Uma dessas fotos de "oncinha pintada, zebrinha listrada, coelhinho peludo" que muita gente gosta de colocar em suas linhas do tempo. Aí eu achei o cachorro a cara do Rick, o cãozinho de quatro anos que mora aqui em casa. Também um labrador e da mesma cor e feições de Marley.

Cachorros são animais que de tão próximos se tornam parte da família. Eles têm uma inteligência emocional que às vezes ainda nos surpreende. E com o tempo criar um vínculo afetivo é inevitável. Eu já tinha convivido com um cachorro antes (um adorável e agitado dálmata), mas ele foi embora, deixando todos da minha casa com um vazio imenso no coração. E eis que chegou o Rick, que eu não quis logo de início criar outro vínculo para sofrer de novo. Mas ele foi ficando de vez e agora eu posso amá-lo. Ainda que à minha maneira. Mas vamos ao filme.

Não sei se dá para dizer que MARLEY & EU é um bom filme. Mas é um filme com uma edição que facilita a fluidez e a gente nem percebe as quase duas horas passando. O cinema hollywoodiano em geral procura ser assim. A trama é bem simples: Owen Wilson e Jennifer Aniston são um casal de jornalistas que estão começando a vida juntos. Ele resolve presenteá-la com um filhote de labrador antes de começarem a ter filhos. Ela adora e o bichinho, mas ele é um diabinho de tão danado, destruindo tudo que encontra pela frente e não sendo nada fácil de ser adestrado.O personagem de Wilson é um jornalista que se torna um colunista. E sua escrita sobre assuntos de sua vida particular faz muito sucesso, principalmente quando ele escreve sobre Marley, o seu cachorro hiperativo.

Esses escritos seriam a semente do livro que seria lançado em 2006 e que seria adaptado para o cinema dois anos depois. E é natural que já saibamos como o filme vai terminar. Ainda assim, me permiti chorar. Por que não? Não é essa a função do filme? Se ele não fosse eficiente nesse sentido, eu estaria aqui o xingando. Ao contrário disso, quando o filme terminou, fui dar um abraço no Rick, que estava deitado na porta do meu quarto. Esses animaizinhos podem até não entender o que se passa nas nossas cabeças, mas estão sempre prontos para dar e receber amor.

domingo, outubro 07, 2012

TODA NUDEZ SERÁ CASTIGADA



Estava entusiasmado com a possibilidade de rever no cinema TODA NUDEZ SERÁ CASTIGADA (1973), de Arnaldo Jabor. Tinha o filme em alta conta em minha memória afetiva. Inclusive aquele final rasgadamente surpreendente. Mas vendo na cópia restaurada no Festival de Gramado achei-o um pouco fraco. Ainda assim, apesar de certo desapontamento, não dá para negar as qualidades da obra e do quanto ela foi ousada ao tentar ofender o status quo da sociedade brasileira de então.

Quem acaba roubando a cena no filme é Paulo César Peréio, que faz o irmão de Herculano, o personagem de Paulo Porto. Esse ator dá um ótimo perdedor e corno. Ficou perfeito para o papel, embora o filme deva quase tudo ao desempenho de Darlene Glória. Ela é a personagem mais rica, por se equilibrar numa corda-bamba. Ela é às vezes muito doce; às vezes muito agressiva. Como prostituta, ela via Herculano como uma saída daquela vida, mas havia ali sentimento por ele. E isso é que é interessante. E depois entra o filho do Herculano na história, que trata de embolar ainda mais o enredo.

A minha cena preferida é aquela em que Herculano liga para o bordel e ela atende. O irmão vivido por Peréio fica do lado dela, para ela não entregar os pontos de uma vez, dar uma de durona. Está tocando uma canção do Roberto Carlos ao fundo, "Detalhes". E isso faz uma diferença enorme para a dimensão sentimental da cena. Aliás, eu adoro quando toca Roberto nos filmes, mesmo filmes da Boca do Lixo ou do Cinema Marginal. Lembro com carinho, por exemplo, de "Ninguém vai tirar você de mim" tocando em uma cena crucial de MATOU A FAMÍLIA E FOI AO CINEMA, de Julio Bressane.

Mas depois o filme do Jabor fica histérico demais, chegando a me incomodar. Não sei se é porque eu estava um pouco indisposto, mas eu tinha acabado de ver o curta O DUPLO, da Juliana Rojas, e tinha adorado. Talvez a mudança de registro tenha prejudicado. Ou talvez o filme tenha envelhecido mal mesmo. Ainda assim, foi válida a exibição, já que o filme foi o primeiro a ganhar o Kikito de Ouro da História do Festival de Gramado.

(E eu terminei o texto e não citei sequer o nome de Nelson Rodrigues. Pode isso?)

sábado, outubro 06, 2012

BUSCA IMPLACÁVEL 2 (Taken 2)



Produções francesas visando o mercado internacional, com astros de Hollywood como chamarizes, de vez em quando funcionam. Foi o caso de BUSCA IMPLACÁVEL (2008), de Pierre Morel. O filme contava a história de um agente aposentado da CIA que tem sua filha sequestrada durante uma viagem a França, para ser vendida num bordel. O tal agente era Liam Neeson, que mostrou que o peso da idade não foi empecilho nenhum para que ele se tornasse um dos melhores action heroes da atualidade. Nem é preciso dizer que ele foi lá e não só resgatou a filha, mas também acabou matando um monte de bandidos.

Eis que Luc Besson, o produtor, muito satisfeito com o sucesso do filme, pensou em uma continuação, algo que para esse tipo de filme já soa de cara como puro caça-níqueis. O produtor contou com Liam Neeson, Famke Janssen e Maggie Grace, que aceitaram reprisar os seus papéis, mas cometeu o erro de trocar o talentoso diretor Morel por Olivier Megaton, de CARGA EXPLOSIVA 3 (2008) e COLOMBIANA – EM BUSCA DE VINGANÇA (2011). Megaton, com seu nome saído de um filme dos Transformers, já não era um diretor muito bem quisto pelos fãs dos filmes de ação. E de fato, a continuação cai muito em qualidade, muito por sua causa.

Em BUSCA IMPLACÁVEL 2 (2012), o pai de um dos sujeitos que foram mortos pelo personagem de Neeson no primeiro filme, resolve se vingar. O prólogo, com o velho patriarca mafioso vivido por Rade Serbedzija (rosto famoso, por tanto interpretar vilões), na Albânia, proclamando que enterrará o corpo do homem que matou o seu filho, já dá o ar de que no campo das atuações o filme deve oferecer canastrice à exaustão. Nem Liam Neeson salva nesse aspecto.

Os bandidos aproveitam uma viagem que Bryan Milss (Neeson) faz com sua ex-mulher (Janssen) e filha (Grace) para Istambul para sequestrá-los e executar o seu plano de vingança. E o jogo de gato e rato e os absurdos da inteligência e habilidades de vencer qualquer um de Bryan acabam tornando o filme bem divertido, embora a edição picotada e a câmera flutuante incomodem de vez em quando. Destaque para a cena de Bryan dizendo por telefone como a filha deve fazer para chegar até onde eles estão. Difícil de engolir, mas divertido.

Assim, como diversão escapista, BUSCA IMPLACÁVEL 2 cumpre sua missão. Mas o sentimento de vazio ao sair da sessão é inevitável. Mesmo assim, diante de um circuito que não oferece melhores novidades, o filme de Megaton/Besson acaba sendo uma das alternativas mais atraentes. Principalmente para quem gosta de thrillers e quer voltar aos personagens do primeiro e ótimo filme.

P.S.: No Blog de Cinema do Diário do Nordeste, tem uma matéria sobre os problemas de público que o cinema brasileiro está vivenciando em 2012. AQUI

quinta-feira, outubro 04, 2012

MULHER, MULHER



Fiquei um tanto decepcionado com este MULHER, MULHER (1979), estrelado por Helena Ramos. Afinal, depois de ter visto pérolas da nossa cinematografia, como AMADAS E VIOLENTADAS (1975) e A MULHER QUE INVENTOU O AMOR (1979), além de outro trabalho muito bom, que é POSSUÍDAS PELO PECADO (1976), já fiquei bem animado com o cinema de Jean Garrett. E quando o filme começa e vi que a direção de fotografia é de Carlos Reichenbach, aí é que minhas expectativas com relação ao filme se elevaram.

Infelizmente, MULHER, MULHER é bem frouxo, com um roteiro fraco de Ody Fraga, que não ajuda. O que tem de interessante no filme é a ousadia no quesito sexual, com cenas de masturbação da personagem de Helena Ramos mostrada de maneira quase ginecológica. Além do mais, há a tal cena dela com o cavalo, que parecia ser o grande amor de sua vida, já que ela já começa o filme como uma recém-viúva.

Aliás, lembrei de um recurso muito bom que Garrett usa para mostrar o passado. Em vez do corte e do flashback, a ação se passa enquanto a personagem de Helena Ramos está em cena. Trata-se de um recurso que parece ter sido muito utilizado no teatro, mas que no cinema causa estranheza, por ser pouco usual. O uso do travelling para os lados para mostrar sequências do passado também são destaque. Mas o que eu achei mais bonito mesmo talvez tenha sido contribuição do Carlão, que são as tomadas emolduradas pelas portas e janelas, vistas de fora, como pelo olhar de um voyeur.

Nota-se que as ideias formais até que fazem de MULHER, MULHER um trabalho que consegue unir bem o vulgar com o sofisticado. Que, aliás, era uma das grandes qualidades dos melhores cineastas da Boca do Lixo, naquela época. A trama fraca é que incomoda. Na história, Helena Ramos é uma jovem viúva que começa a ouvir as fitas que seu falecido marido, um psicanalista, gravava de suas pacientes. Uma dessas pacientes tinha instintos suicidas e isso acaba afetando a protagonista a ponto de ela ir perdendo sua sanidade. Os outros personagens que entram na história só ajudam a tornar tudo ainda mais constrangedor.

MULHER, MULHER pode ser visto como uma obra que anteciparia MULHER OBJETO, de Silvio de Abreu, que também lida – de maneira muito melhor – com a psicanálise. Sem falar que Helena está muito mais bonita e sensual no filme de Silvio de Abreu. E eu prefiro a Helena morena à Helena loira. 

quarta-feira, outubro 03, 2012

A DIFÍCIL ARTE DE AMAR (Heartburn)



Fui atrás deste filme na época que a diretora e roteirista Nora Ephron faleceu, em junho passado. Mas acabei vendo uns trechos do filme e me desanimando. Resultado: só acabei de vê-lo na semana passada. Não é dos melhores trabalhos de Mike Nichols, mas conta com uma dupla de peso: Jack Nicholson e Meryl Streep. Pena que isso não garante o pleno sucesso de um filme. Lembro que quando a Globo exibia propaganda do filme em sua programação o que mais me chamava atenção era a canção de Carly Simon, “Coming round again". Ainda acho uma bela balada, por mais que tenha ficado bem a cara dos anos 80. E o diretor e sua equipe sabiam do potencial da canção. Tanto que a exploram bastante.

A DIFÍCIL ARTE DE AMAR (1986) mostra o auge e a queda de um casamento. O filme já começa com o casal vivido por Nicholson e Streep se conhecendo numa cerimônia de casamento. Na época, eles já tinham aquela aparência de pessoas de meia idade, principalmente Nicholson, mas acredito que naquele tempo havia mais filmes com atores mais velhos em dramas sobre relacionamentos e em comédias românticas do que hoje. Até na televisão brasileira era assim, que eu lembre.

O filme foi feito a partir de uma autobiografia de Norah Ephron. Então, muito do que é apresentado aconteceu em sua vida, embora naturalmente os roteiristas devam ter mexido em algumas coisas. É um filme que talvez tenha como principal problema o fato de não ter nada de mais em sua história. Os diálogos são bons, mas o andamento é capenga. Falta aos personagens mais carisma. Mike Nichols, por melhor que seja, não é um cineasta da forma. Ele precisa do conteúdo para fazer um bom filme.

No elenco de apoio, o que mais chama atenção hoje é a participação do jovem Kevin Spacey no papel de um ladrão. Foi sua estreia no cinema. Demoraria alguns anos para ele atingir o estrelato com OS SUSPEITOS, de Bryan Singer.

Um Top 5 Mike Nichols

1. ÂNSIA DE AMAR (1971)
2. A PRIMEIRA NOITE DE UM HOMEM (1967)
3. CLOSER - PERTO DEMAIS (2004)
4. QUEM TEM MEDO DE VIRGINIA WOOLF? (1966)
5. UMA LIÇÃO DE VIDA (2001)

terça-feira, outubro 02, 2012

O SOM AO REDOR



A tão esperada estreia na direção de longas de ficção de Kleber Mendonça Filho não deixou ninguém decepcionado. Ao contrário, O SOM AO REDOR (2012) é um filme que quanto mais se pensa a respeito, mais se gosta. É claramente uma obra que traz o background do diretor curta-metragista. Há até uma sequência praticamente retirada de ELETRODOMÉSTICA (2005). Quando o entrevistei em Gramado, lembrei que David Lynch havia feito algo parecido em IMPÉRIO DOS SONHOS, aproveitando trechos de sua série de curtas arrepiantes e bizarros RABBITS. Ele parece ter achado curiosa a comparação. Mas se há um cineasta a quem KMF faz questão de homenagear e de declarar amor ao trabalho é John Carpenter. E ele até chega a batizar uma escola de "João Carpinteiro" numa das sequências do filme.

O SOM AO REDOR tem, inclusive, alguns elementos do cinema fantástico, que ajudam a tornar a sua narrativa tensa. Não se sabe para onde a história se encaminhará, com os vários e interessantes personagens e o suspense que surge de pequenas coisas. É a mulher que odeia o cachorro do vizinho (Maeve Jinkings); o dono da maior parte das casas do bairro, que age como um velho coronel (o sensacional W.J. Solha); o sujeito que aparece querendo ser um vigilante do bairro (Irandhir Santos); o rapaz que trabalha como corretor de imóveis (Gustavo Jahn); entre outros.

Neste filme-coral, em que cada bloco e cada subtrama é tão instigante e tão importante para o quadro geral, o diretor ainda encontra tempo para enfatizar um elemento que geralmente é negligenciado, principalmente no cinema brasileiro: o som. E de fato o trabalho de som do filme justifica o título, embora eu acredite que deva haver um lugar ideal, com acústica adequada, para que ele seja melhor apreciado. No Palácio dos Festivais, em Gramado, o som estava indo bem até o momento em que estourou a caixa média e todos tivemos que voltar para nossos hotéis. Triste ironia. Felizmente, no dia seguinte, foi possível rever o filme integralmente.

Apesar de haver vários personagens e de haver um mistério, um suspense no ar mesmo em momentos de rotina na vida dos personagens, O SOM AO REDOR não é necessariamente um filme de ações e reações. O que há principalmente de comum entre seus personagens é que eles transitam o mesmo espaço privilegiado, próximo à Praia de Boa Viagem. O fato de haver a figura de Clodoaldo (Irandhir Santos, em grande atuação) trazendo sua vigilância particular para o lugar ajuda a enfatizar a falta de segurança e a paranoia, que é vista até mesmo nos pesadelos de uma garotinha.

É preferível não dizer muita coisa sobre O SOM AO REDOR. Tanto que o teaser trailer feito ou encomendado pelo diretor mostra apenas algumas poucas imagens, com o som e a tensão em destaque. A chamada invasão pernambucana que assaltou o Festival de Brasília em setembro tem na figura de Kleber Mendonça Filho e seus excepcionais curtas VINIL VERDE (2004) e NOITE DE SEXTA, MANHÃ DE SÁBADO (2006) um de seus maiores expoentes. É ao mesmo tempo um alívio e um prazer poder vê-lo estreando na direção de longa-metragem de ficção com um trabalho próximo a uma obra-prima.

O SOM AO REDOR ganhou os prêmios de direção, melhor filme pelo júri popular, prêmio da crítica e melhor desenho de som no Festival de Cinema de Gramado.