quinta-feira, dezembro 31, 2009

TOP 20 2009 E O BALANÇO DO ANO

1. BASTARDOS INGLÓRIOS, de Quentin Tarantino
2. AMANTES, de James Gray
3. GRAN TORINO, de Clint Eastwood
4. ARRASTE-ME PARA O INFERNO, de Sam Raimi

5. A TROCA, de Clint Eastwood
6. LOKI - ARNALDO BAPTISTA, de Paulo Henrique Fontenelle
7. DESEJO E PERIGO, de Ang Lee
8. O LUTADOR, de Darren Aronofsky

9. FATAL, de Isabel Coixet
10. O CURIOSO CASO DE BENJAMIN BUTTON, de David Fincher
11. FOI APENAS UM SONHO, de Sam Mendes
12. ANTICRISTO, de Lars Von Trier

13. A BELA JUNIE, de Christophe Honoré
14. LEONERA, de Pablo Trapero
15. NA MIRA DO CHEFE, de Martin McDonagh
 16. ABRAÇOS PARTIDOS, de Pedro Almodóvar

17. UMA PROVA DE AMOR, de Nick Cassavetes
18. O CASAMENTO DE RACHEL, de Jonathan Demme
19. UM CONTO DE NATAL, de Arnaud Desplechin
20. PRESSÁGIO, de Alex Proyas

Não foi dos melhores anos. Foi um ano desafiador. E "desafiador" é um eufemismo para não dizer que foi um ano ruim, afinal, é preciso conhecer o fel para valorizar o mel. E assim a gente vai se consolando com o que tem. 2009 também foi um ano fraco para os filmes. Pelo menos entre os lançados no circuito brasileiro. E essa opinião é quase unânime. Distribuidoras sem noção deixando de lançar filmes importantes e com potencial comercial nos cinemas - À PROVA DE MORTE, do Tarantino, continua no limbo -; GUERRA AO TERROR lançado direto em dvd; as projeções digitais da Rain cada vez mais insatisfatórias; um razoavalmente tradicional festival de cinema francês entrando em franca decadência; a falta de relançamentos de clássicos em cópias novas em nossos cinemas; e o filme mais aguardado do ano não era tudo que eu esperava. Por isso que muita gente tem optado por fazer a sua listinha de final de ano totalmente independente dos lançamentos do circuito. Afinal, a internet tem facilitado a vida de muita gente e trazido a alegria para os cinéfilos, que agora dispõem de filmes que levariam muito tempo e dinheiro para um dia conseguir assistir. Eu, no entanto, continuo me baseando em filmes vistos apenas no cinema para a elaboração da listagem.

E se não tivemos À PROVA DE MORTE, tivemos o maravilhoso BASTARDOS INGLÓRIOS, não apenas o melhor filme do ano, mas também forte candidato a melhor da carreira do diretor. Tarantino brinca de recontar a História à sua maneira e se vinga dos nazistas por nós, usando a arma que ele tem: o cinema. E falando em grandes diretores, um ano que traz dois filmes de Clint Eastwood não pode ser de todo ruim. GRAN TORINO e A TROCA são mais dois grandes exemplos da vitalidade desse diretor fantástico e discípulo de John Ford, que cada vez mais se firma como um dos gigantes do cinema mundial. Entrando em sintonia com o drama de uma mãe em busca de seu filho em A TROCA, está o argentino LEONERA, de Pablo Trapero, sobre o amor de uma mãe e a coragem de enfrentar as adversidades, em registro realista.

Em geral, a listinha de melhores é até um pouco óbvia. Outro filme que tem aparecido entre os favoritos das principais listas é AMANTES, de James Gray, que lida com o tema do coração partido de uma forma que entrou em sintonia com um momento que eu estava vivendo. E ver a dor do outro, sentindo a sua própria, tem algo de mágico, apesar de tudo.

Interessante notar que quase todos os filmes lidam com a dor, de uma maneira ou de outra. Será que a falta de comédias, digo, comédias realmente boas, não é reflexo de um tempo mais triste? De uma sociedade mais pessimista e amarga? Da lista, o que mais se aproxima de uma comédia é um filme de horror sobre uma garota atormentada por um espírito maligno! Trata-se da volta triunfal de Sam Raimi ao gênero que o consagrou no divertidíssimo ARRASTE-ME PARA O INFERNO. Outro da lista que nem dá pra classificar como comédia é NA MIRA DO CHEFE, que foi lançado em São Paulo no ano passado, mas que só chegou aqui no comecinho do ano.

Quanto ao cinema nacional, se no ano passado eu tive o prazer de colocar três títulos no meu top 20, neste ano os lançamentos foram uma tristeza, com alguns filmes que me decepcionaram e outros de que eu não esperava nada mesmo. Houve uma tendência para comédias leves e documentários musicais. E foi justamente dessa leva que surgiu o filme que salvou a pátria: LÓKI - ARNALDO BAPTISTA, o doc mais emocionante do ano.

Falando em emoções, o melodrama UMA PROVA DE AMOR, de Nick Cassavetes, trafega por um território perigoso: o dos filmes chorosos de doenças. Mas faz com elegância e coragem. Foi o filme que mais me fez chorar em 2009. E cá pra nós, eu adoro filme pra chorar. DESEJO E PERIGO, talvez o melhor trabalho de Ang Lee, não é bem um filme para chorar. Mas é dessas obras que se instalam como agulhas em nosso coração.

Da safra de filmes do Oscar do início do ano, fui um dos que gostaram de O CURIOSO CASO DE BENJAMIN BUTTON, de David Fincher, e de FOI APENAS UM SONHO, de Sam Mendes. Dois trabalhos que não foram tão unânimes na apreciação geral. O CASAMENTO DE RACHEL é a volta de Jonathan Demme a um tipo de cinema mais pessoal, mais parecido com o que ele fazia no início da carreira. O LUTADOR, de Darren Aronofsky, traz uma interpretação monstruosa de Mickey Rourke num dos mais belos filmes sobre perdedores já feitos.

Talvez a surpresa da lista para quem acompanha o blog seja ANTICRISTO. O filme de Lars Von Trier foi recebido por mim com muita reserva, com os dois pés atrás. Mas é impressionante como a força das imagens permaneceu em minha memória. Não consigo parar de me lembrar de Charlotte Gainsbourg enlouquecida na floresta. Entre outras tantas sequências fantásticas. É, sem dúvida, um filme especial.

Quanto ao cinema europeu, os filmes de Pedro Almodóvar sempre são muito aguardados. E ABRAÇOS PARTIDOS é um filme que o tempo se encarregará de torná-lo um dos mais importantes da carreira do diretor. Ou não. Ou depende dos olhos de quem vê. Da França, temos os talentos de dois cineastas da nova geração: Arnaud Desplechin e Christophe Honoré, com, respectivamente, UM CONTO DE NATAL e A BELA JUNIE.

Entre os menos óbvios da lista, destaco FATAL, de Isabel Coixet, que chegou atrasado no circuito local e me tocou muitíssimo. Também não muito óbvio, mas um filme que tem seus admiradores é PRESSÁGIO. Esse sim o grande filme sobre o fim do mundo. Nada de Emmerich.

Os piores

Não poderia faltar a lista dos odiados. Dureza encontrar só cinco nesse ano tão farto, mas seguem os "desfavoritos" da casa:

1. SINÉDOQUE, NOVA YORK
2. X-MEN ORIGENS - WOLVERINE
3. THE SPIRIT - O FILME
4. TRANSFORMERS: A VINGANÇA DOS DERROTADOS
5. A VERDADE NUA E CRUA

As séries

A cada ano, grandes séries surgem e são uma verdadeira tentação. E, por mais que eu evite ver novas - afinal já tenho compromisso com tantas -, aparece uma série como MAD MEN para virar a mesa. Do mesmo canal, também pude curtir a primeira temporada de BREAKING BAD. FAMÍLIA SOPRANO e SEINFELD são séries que já acabaram, mas que eu ainda estou no caminho. HOUSE é outra que estou vendo com atraso.

Alguns destaques:

- O grande acontecimento do ano na televisão foi a histórica reunião do elenco de SEINFELD em CURB YOUR ENTHUSIASM;
- PRISON BREAK chega ao seu final, com certo cansaço, mas fecha com muita emoção;
- 24 HORAS renasce das cinzas depois de uma temporada ruim e mostra que Jack Bauer ainda tem muito gás;
- Mesmo caso de DEXTER, cuja quarta temporada foi fantástica;
- LOST continua fascinando os fãs e se assumindo definitivamente como uma ficção científica sobre viagens no tempo;
- ENTOURAGE se assume como uma comédia romântica, com ótimos resultados;
- As atuais temporadas de THE BIG BANG THEORY e THE OFFICE não estão tão boas, mas as temporadas anteriores foram ótimas;
- TRUE BLOOD é outra que foi descoberta por mim neste ano, mas que já caiu de qualidade na segundona;
- Também não manifestei o mesmo entusiasmo pela segunda de IN TREATMENT.

Puxa, quanta série, hein!

A minissérie

JOHN ADAMS. Porque foi a única vista. E porque foi a melhor produção para a televisão que eu já vi em muitos anos. Obra-prima.

Top 5 "Musas do Ano"

Faltou uma brasileira na lista. Podia ser a Luana Piovani, mas ela já foi melhor e não é páreo para essas moças aí abaixo, seja em qualquer quesito: beleza, gostosura, encanto, glamour. As meninas que eu gostaria de levar pra casa:

1. Carole Brana (ERÓTICA AVENTURA)
2. Sasha Grey (CONFISSÕES DE UMA GAROTA DE PROGRAMA)
3. Diane Kruger (BASTARDOS INGLÓRIOS)
4. Mélanie Laurent (BASTARDOS INGLÓRIOS)
5. Nadine Labaki (CARAMELO)

Melhores vistos em DVD, DIVX ou VHS

Foi uma tarefa de dolorosos cortes chegar nestas vinte pérolas. Deixei de fora dois curtas fantásticos (LA JETÉE e A PADEIRA DO BAIRRO). Em ordem alfabética, os vinte melhores longas vistos pela primeira vez na telinha em 2009:

A REGRA DO JOGO, de Jean Renoir
A RELIGIOSA, de Jacques Rivette
A ÚLTIMA CASA, de Dennis Iliadis
AMAR FOI MINHA RUÍNA, de John M. Stahl
AMOR À TARDE, de Eric Rohmer
AURORA, de F.W.Murnau
AVERE VENT'ANNI, de Fernando di Leo
CALAFRIOS, de David Cronenberg
CIDADE TENEBROSA, de André De Toth
ERÓTICA AVENTURA, de Jean-Claude Brisseau
ESCRAVAS DO DESEJO, de Harry Kümel
FUGA DO PASSADO, de Jacques Tourneur
GUERRA AO TERROR, de Kathryn Bigelow
MÁRTIRES, de Pascal Laughier
MATA, BEBÊ, MATA, de Mario Bava
NOITES BRANCAS, de Luchino Visconti
PROFISSÃO LADRÃO / RUAS DE VIOLÊNCIA, de Michael Mann
UMBERTO D., de Vittorio De Sicca
VÍCIO FRENÉTICO, de Abel Ferrara
VIDAS SEM RUMO, de Francis Ford Coppola

Revisões

A cada ano, ao que parece, o número de filmes revistos aumenta. Acho que 2009 foi o meu recorde: quinze revistos.

A ESTALAGEM MALDITA, de Alfred Hitchcock
A LEI DO DESEJO, de Pedro Almodóvar
A MANSÃO DO INFERNO, de Dario Argento
DE REPENTE NUM DOMINGO, de François Truffaut
ENRAIVECIDA - NA FÚRIA DO SEXO, de David Cronenberg
JANELA INDISCRETA, de Alfred Hitchcock
MATADOR, de Pedro Almodóvar
O ILUMINADO, de Stanley Kubrick
OS 39 DEGRAUS, de Alfred Hitchcock
PACTO SINISTRO, de Alfred Hitchcock
SCANNERS - SUA MENTE PODE DESTRUIR, de David Cronenberg
SOB O SIGNO DE CAPRICÓRNIO, de Alfred Hitchcock
THE BROOD - OS FILHOS DO MEDO, de David Cronenberg
UMA VIAGEM PESSOAL ATRAVÉS DO CINEMA AMERICANO, de Martin Scorsese e Michael Henry Wilson
VIDEODROME - A SÍNDROME DO VÍDEO, de David Cronenberg

Feliz ano novo!

Lembro que no final de 2008, muita gente já estava desejando feliz 2010, pois as perspectivas para 2009 não eram das melhores. Lembrei-me da virada de 1990 para 1991, quando Collor de Mello dizia que 91 seria um ano cinza. E de fato foi. Portanto, as vibrações positivas para 2010 já são muito melhores. Vamos colher os frutos plantados. Que o próximo ano nos traga paz, prosperidade, amor em todas as esferas, sucesso profissional, saúde, prazer e muita vontade de viver. São os meus votos para todos os leitores deste blog. Eu, inclusive. :) Até 2010!

quarta-feira, dezembro 30, 2009

CIDADE TENEBROSA (Crime Wave)






















"Por quanto tempo alguém tem que pagar por um erro, por um passo em falso que deu na vida? Quando ficará quite? Não há anistia num film noir. Você simplesmente continua pagando pelos seus pecados."
André De Toth


Martin Scorsese, em seu documentário sobre o cinema americano, dividiu alguns cineastas em três categorias: os ilusionistas, os contrabandistas e os iconoclastas. O húngaro André De Toth se enquadra na categoria de contrabandista, isto é, está naquele grupo de cineastas que trabalhava com mais liberdade e inventividade dentro de produções modestas, podendo expressar algo que numa produção classe A não seria possível. Os contrabandistas seriam aqueles cineastas que se aproveitavam da brecha do sistema, trapaceavam e escapavam impunes. O filme de De Toth citado no documentário é este CIDADE TENEBROSA (1954), fruto desse período fascinante da cinematografia americana, o ciclo do film noir.

Em CIDADE TENEBROSA, temos a história de um homem que está em liberdade condicional e é acusado de fazer parte do assalto a uma loja de conveniência e do assassinato de um policial. O filme começa já com o tal assalto, que é mostrado com um realismo e uma violência brutal. Entre os assaltantes, um rosto bastante conhecido e expressivo aparece: o de Charles Bronson, na época, ainda utilizando o sobrenome Buchinsky. Os dois elementos principais do filme, no entanto, são o personagem de Gene Nelson, o sujeito que está na mira da polícia mesmo sendo inocente, e o delegado, representado por Sterling Hayden. As coisas se complicam para Nelson quando um dos assaltantes, ferido, devido à troca de tiros com o policial, vai parar em seu apartamento.

O filme mantém um clima de tensão do início ao fim e sua curta duração faz dele um thriller eletrizante e compacto. Como espectadores, seguimos os passos do ex-presidiário em sua angustiante tentativa de se manter na linha e de escapar da investida dos bandidos, principalmente para proteger a esposa. Sua curta duração e de como tudo se resolve tão bem nesse espaço de tempo torna o trabalho de De Toth ainda mais admirável. E o final é maravilhoso. Dentro das limitações, o cineasta usou locações nas ruas de Los Angeles e câmera na mão em algumas cenas, ajudando a passar a atmosfera cruel e brutal do tema.

Amanhã, se o blogger (que anda bem instável ultimamente), o tempo e as circunstâncias permitirem, fecharei 2009 com o tradicional balanço do ano, com destaque para os favoritos.

Agradecimentos a Renato Doho pela cópia dessa pérola.

terça-feira, dezembro 29, 2009

PARIS























Dizer que PARIS (2008) é um filme irregular talvez até seja um elogio. Na verdade, trata-se de um filme-painel que definitivamente não deu certo, já que a maioria das tramas são bem desinteressantes. E mesmo as melhores histórias, como as dos personagens de Juliette Binoche, Mélanie Laurent, Romain Duris e Fabrice Luchini, são frágeis e com poucos momentos bons. Os atores que os interpretam esforçam-se para fazer a diferença. Confesso que a possibilidade de ver novamente Mélanie Laurent, depois de sua brilhante presença em BASTARDOS INGLÓRIOS, foi um dos motivos de eu querer ver este filme do mesmo diretor de ALBERGUE ESPANHOL (2002), Cédric Klapisch.

Outro motivo mais do que válido para comparecer ao cinema para ver PARIS é a presença de Juliette Binoche. Com Juliette, foi amor à primeira vista. Desde que a vi em A INSUSTENTÁVEL LEVEZA DO SER, na aurora de minha cinefilia, que eu fiquei encantado com a atriz. Lá se vão vinte anos. Ela já não é apenas um rostinho bonito. É mais do que isso, uma grande atriz. Lembro que quando vi CÓDIGO DESCONHECIDO, de Michael Haneke, a cada momento em que ela aparecia, o filme crescia exponencialmente no meu grau de interesse. Em geral, não gosto muito quando ela faz filmes nos Estados Unidos. Talvez a exceção seja PALAVRAS DE AMOR e, claro, A INSUSTENTÁVEL LEVEZA DO SER, que eu já citei, mas que tem características de cinema europeu.

Romain Duris meio que reprisa o papel que fez em outro filme de título semelhante - EM PARIS, de Christophe Honoré. No filme de Klapisch, ele é um rapaz que descobre que tem um sério problema cardíaco. Precisa de um transplante urgente. E a operação ainda é bem arriscada. Nesse inferno pessoal, o que mais lhe dá calma é olhar da janela de seu apartamento para as pessoas desconhecidas nas ruas e ficar imaginando como são suas vidas. Sua irmã, vivida por Juliette Binoche, é mãe de dois filhos, mas que tem problemas de autoestima. Vive sozinha cuidando das crianças e acredita que sua vida sentimental já acabou, agora que chegou aos quarenta. Fabrice Luchine é um professor de História de meia idade que se apaixona por uma jovem aluna (Mélanie Laurent). A paixão faz com que ele se sinta um adolescente, fazendo coisas bobas, como mandar mensagens anônimas para o celular da moça.

Há outras tramas bem desinteressantes e aborrecidas, como a dos homens que trabalham na feira ou do irmão do professor. Algumas parecem ter sido cortadas sem dó nem piedade, como a dos imigrantes africanos. Entre tramas mornas e outras totalmente sem graça, fica na memória o striptease descontraído e encantador de Binoche.

segunda-feira, dezembro 28, 2009

MAD MEN - 1ª TEMPORADA (Mad Men - Season One)























Depois de tantos elogios, acabei me rendendo: resolvi conferir a primeira temporada de MAD MEN (2007). E posso dizer que fui fisgado mais rapidamente do que quando comecei a ver FAMÍLIA SOPRANO. A comparação se dá principalmente pelo fato de Matthew Weiner, o criador de MAD MEN, ter trabalhado na série dos mafiosos de New Jersey como roteirista e como produtor executivo. As tramas se passam na Nova York de 1960 e os personagens em foco são os publicitários da época e as pessoas ligadas a eles.

A série nos leva a um tempo onde os costumes e os valores eram bem mais estranhos do que eu supunha. O fato de praticamente todos fumarem muito é algo que chama a atenção de imediato. Inclusive, logo no primeiro episódio começa-se a cogitar a possibilidade de que o cigarro causa câncer. Beber uísque em pleno local de trabalho como se bebe água também me pareceu bem estranho. A figura principal da série é Don Draper, um publicitário de cargo importante que tem um passado misterioso. Nem mesmo sua esposa, a adorável Betty Draper, sabe de seu passado, guardado a sete chaves e só revelado aos poucos ao longo da temporada. A fragilidade e o amor devotado de Betty a Don são uma das coisas que eu mais gosto na série. Há um episódio, em especial, que me deixou encantado, quando ela fala para o marido o quanto espera todos os dias pelo momento de fazer amor com ele.

O segundo nome dos créditos é dado à atriz que faz a personagem Peggy Olsen, secretária de Don. Ela é pouco simpática para alguém que deveria servir de porta de entrada para o espectador. Acho isso um dos problemas da série. Enquanto isso, alguns coadjuvantes ganham importância, ainda que apareçam pouco. Caso de Joan, a secretária gostosa e arrogante que tem um caso com um dos sócios da companhia. A superficialidade e vulgaridade dela no começo incomoda, mas depois ela vai ficando encantadora, talvez por ser bonita e sensual. Aliás, é impressionante como a ruiva fica mais bonita a cada episódio, com seus olhos expressivos e ar enigmático. Ela é um exemplo de mulher independente da época, que tem uma moral bem distinta das que ficam em casa cuidando do lar, enquanto o marido trabalha. Pete Campbell é outro personagem importante. Começa e termina a série como o sujeito mesquinho e capaz de jogar sujo para subir na vida.

O pano de fundo político destaca principalmente as eleições presidenciais: Nixon versus Kennedy. No aspecto social, vemos a contracultura ameaçando a aparente paz e ordem da sociedade americana, ainda de maneira tímida, através da cena de Midge - amante de Don - e seus amigos beatniks. Naquele tempo, os negros ainda ocupavam cargos de menor status na sociedade, como ascensoristas de elevador, por exemplo. O tratamento dado às mulheres é ainda mais incômodo, mas já se percebe que havia aquelas que se comportavam de maneira mais independente e agressiva no trabalho e nos relacionamentos. Caso de Rachel Menken. Ela é uma das adoráveis mulheres de Don. Eis um cara de sorte. Talvez a ideia seja mesmo fazer com que nós queiramos estar em seu lugar.

Assim como FAMÍLIA SOPRANO, cada episódio tem um tratamento especial e poderia ser comentado separadamente. Alguns deles são bem admiráveis. Pode ser que no próximo ano, quando começarem a exibir a quarta temporada da série, eu já tenha visto as outras duas. Pelos comentários entusiasmados dos espectadores, a série melhora a cada temporada e os vários prêmios obtidos são mais do que merecidos.

domingo, dezembro 27, 2009

VIDEODROME – A SÍNDROME DO VÍDEO (Videodrome)






















Acho que não há outro filme que ingresse de maneira tão rápida no subconsciente quanto VIDEODROME - A SÍNDROME DO VÍDEO (1983). Já vi esse filme em vhs antes, mas é impressionante como a memória dele desaparece rápido. No dia que fui rever, deixei para continuar no dia seguinte por causa do horário. No dia seguinte, tive que rever boa parte do começo para que minha memória fosse lembrando o que tinha visto na noite anterior. É como se fosse um sonho transformado em filme. E um filme imediatamente transformado em sonho. Como aqueles sonhos confusos que a gente tem e quer se lembrar, mas surgem apenas flashes, que vão se apagando rapidamente ao longo do dia. Se há alguma dúvida do quanto o cinema e o sonho podem andar juntos ou se assemelharem, ela pode ser tirada com esse exemplar de David Cronenberg.

Mas essa não é a única qualidade de VIDEODROME. Eu me vi diante de uma obra que antecipava o nosso futuro – ou o nosso presente. Se CALAFRIOS (1975) e ENRAIVECIDA - NA FÚRIA DO SEXO (1977) antecipavam a AIDS, VIDEODROME antecipa as doenças do nosso momento atual, ligadas à depressão, síndrome do pânico, TOC, delírios, bem como a presença massiva da tecnologia na vida social, com a ascensão dos sites de relacionamento e o cada vez maior distanciamento da presença física nas relações. Por mais confuso que possa ser o filme, ele me pareceu um convite para a reflexão sobre esse momento. Cronenberg, um homem com uma obsessão e um sentido de estranhamento pelo corpo, faz uma espécie de elogio do carnal. Ainda que seja uma nova carne. "Long live the new flesh", diz o personagem de James Woods ao final do filme, um dos mais impactantes da carreira de Cronenberg.

VIDEODROME é uma sucessão de imagens de delírio, que crescem à medida que o filme vai chegando à sua conclusão. Como uma abertura na barriga de Woods semelhante a uma vagina ou uma arma surgindo de dentro da televisão. No começo, vemos o personagem de Woods, um produtor de um canal a cabo especializado em sexo que fica muito interessado em imagens supostamente captadas de uma tv pirata. São imagens de agressão física e tortura, que não tem nada de sexo, mas cujo conteúdo pode ser de natureza fetichista para muitos, inclusive para o protagonista, que fica querendo cada vez mais imagens do tal canal misterioso, o videodrome. Ele encontra uma garota que tem tendências masoquistas, vivida por Debbie Harry. Ela gosta, por exemplo, de queimar o próprio seio com cigarro e na primeira noite que se encontram pede para que ele lhe corte. A trama vai se tornando cada vez mais intrincada quando Woods passa a investigar mais a fundo o tal videodrome. E o filme vai ficando cada vez mais delirante. Definitivamente, um de meus favoritos de David Cronenberg.

VIDEODROME foi um fracasso de bilheteria quando lançado nos Estados Unidos. Provavelmente por não ter um lançamento apropriado. Nas exibições-teste, o público, não acostumado a tanta estranheza, reagiu de forma até violenta nos cartões onde se deixava as impressões. Isso eu soube através do livro "Cronenberg on Cronenberg", onde o autor fala de maneira até passional sobre alguns escritores que morreram sem saber que alcançariam respeito, como Whitman, Melville, Hawthorne, Poe. Todos eles morreram pensando que seus trabalhos não significavam nada. Lendo isso, eu também fiquei indignado e triste.

sexta-feira, dezembro 25, 2009

CAFÉ LUMIÈRE (Kôhî Jikô)























Filmes como os de Hou Hsiao-hsien, que trazem uma estrutura bem mais incomum de direção de câmera, fazem com que a gente reflita mais sobre o papel da câmera, perceba mais certos detalhes que passam batidos no cinema mais ligado ao entretenimento. Não se tata de dizer que um é melhor do que o outro. Mas a verdade é que filmes que nos chamam a atenção para a reflexão sobre a própria natureza do cinema são muito mais interessantes para quem quer estudar a arte. Hitchcock falava da montagem como a essência do cinema e até subvalorizava um trabalho como FESTIM DIABÓLICO, por exemplo. Então, por que será que o plano-sequência ainda mexe com a gente? Talvez por captar mais a verdade do que uma cena toda recortada? Com certeza não é algo tão simples assim de responder.

Saindo um pouco do filme, mas continuando a divagação, dia desses assisti a um trecho da novela das oito, e vi uma cena na qual a personagem de Giovanna Antonelli conversava com a filha e a câmera não mostrava as duas de imediato. Mostrava suas vozes e a imagem da rua. Só depois de alguns segundos que vemos as duas chegando no carro. Esse tipo de coisa, eu nunca tinha visto antes em novela. Acho interessante. É como se a telenovela estivesse passando por um processo de sofisticação estética. O que normalmente vemos é o básico: plano geral, às vezes a paisagem do lugar, plano mostrando o ambiente e em seguida muitos closes, muito campo e contracampo. Será que essa mudança tem a ver com o tamanho dos aparelhos de tevê? É possível.

Voltando a Hou Hsiao-hsien, esse cineasta que até o nome eu tive de aprender a pronunciar procurando no Google, tive a primeira experiência com algo dele vendo um trecho de FLORES DE SHANGAI (1998), que o Ruy Gardnier, talvez o maior estudioso do cineasta no Brasil, passou num curso de crítica de cinema em 2008. CAFÉ LUMIÈRE (2003) é o primeiro trabalho que vejo do cineasta integralmente. Se normalmente o cinema produzido no Oriente ainda se constitui um enigma pra mim, imagina um filme como esse. Sem falar que eu nunca cheguei a ver um filme sequer de Yasujiro Ozu, o principal homenageado de CAFÉ LUMIÈRE. Naturalmente, o que absorvo é mais enigmático do que familiar.

Enigmático principalmente o momento em que um dos personagens mostra para a protagonista, na tela de seu laptop, a imagem de uma rede de trens e, no centro, algo parecido com um feto. A trama principal gira em torno do fato de a garota estar grávida de um namorado de Taiwan. Ela volta para o Japão e conta o fato para os seus pais adotivos. O pai fica impassível, sem saber o que fazer/dizer, enquanto a mãe exige dele uma posição. É semper mais difícil para o homem lidar com esse tipo de situação.

O grande barato de CAFÉ LUMIÈRE é mixar momentos corriqueiros da rotina, com gente conversando enquanto come em frente a uma câmera frequentemente imóvel e num lugar um tanto desconfortável para o espectador, com as paredes ou colunas do canto sempre à mostra. A soma desses momentos de rotina com outros ligados a algo próximo do sobrenatural, como os sonhos da protagonista e o modo como o cineasta os destaca, tornam o filme intrigante. Os movimentos leves e sutis de câmera também são pontos altos, bem como a movimentação dos personagens dentro e fora do nosso campo de visão.

Dia desses li um texto do início do século XX, de uma antologia organizada por Ismail Xavier, que falava da importância da chegada do cinema e de como os gestos - muito mais comuns no cinema mudo - trouxeram de volta a valorização da imagem. As civilizações, quanto mais sofisticadas fossem, menos gestos usavam, pois teriam no domínio das palavras toda a expressão de seus sentimentos e pensamentos. Talvez o povo oriental seja o que menos se utiliza de gestos ou de expressões faciais para mostrar suas emoções. Principalmente o povo japonês. Às vezes é um enigma tentar perceber o que eles estão pensando ou sentindo. Por exemplo, li num texto sobre o filme que dizia que a garota se apaixona pelo rapaz que grava os sons dos trens e eu, sinceramente, não percebi isso. Engraçado como ainda me sinto distanciado dos costumes orientais, de perceber suas sutilezas. Mas aos poucos eu vou me aproximando, acho eu.

Agradecimentos a Marcos Felipe, que há tempos me presenteou com uns filmes do cineasta e eu, de ingrato que sou, demorei esse tempo todo para ver um deles. Valeu, fella!

quarta-feira, dezembro 23, 2009

BONEQUINHA DE LUXO (Breakfast at Tiffany's)






















Mais um clássico que eu até hoje não tinha visto. Acabei vendo meio que por acaso, quando um colega da escola me emprestou o dvd. Muitas vezes não é a gente que vai atrás dos filmes, mas eles que vêm ao nosso encontro. Foi o caso de BONEQUINHA DE LUXO (1961), de Blake Edwards, que, apesar de usar um registro mais sensível e sofisticado neste filme, já ensaiava uma investida em comédias mais físicas como A PANTERA COR-DE-ROSA (1963) e suas continuações. Mickey Rooney é o principal responsável pelo aspecto mais físico do humor do filme, fazendo o papel do síndico japonês do prédio, que sempre reclama do barulho que a personagem de Audrey Hepburn faz, seja chegando de madrugada de seus encontros, seja organizando festas em seu apartamento.

O curioso do filme é o modo discreto com que a personagem é tratada. Afinal, ela é uma espécie de prostituta de luxo. Ou no mínimo uma mulher muito interessada no dinheiro dos homens para custear o seu estilo de vida. O que não a impede de ser também adorável. Especialmente aos olhos do protagonista, vivido por um ator que até então desconhecia, George Peppard. Ele é novo no prédio e conhece a jovem por acaso. Fica imediatamente encantado e começa a ter um relacionamento próximo da amizade, já que ela dá a entender que não tem interesses sentimentais no rapaz. Ele também é parecido com ela, já que recebe constantemente a visita de uma mulher que sempre deixa dinheiro na cabeceira da cama.

O andamento do filme tem aquele clima de sessão da tarde dos anos 80, afinal, naquela época, os filmes que passavam à tarde eram dessa década. Então, eles me passam uma lembrança daquelas tardes preguiçosas. Digamos que se não fosse pela Audrey Hepburn e a trilha de Henry Mancini, que traz o clássico "Moon River", que se tornou maior do que o filme, eu não teria gostado de BONEQUINHA DE LUXO. Eu mesmo não sabia que a canção tinha sido composta exclusivamente para o filme. Inclusive, Mancine fez a música especialmente para o tom de voz de Audrey, que não era uma cantora profissional e tinha uma voz bem limitada. O final é fiel às comédias românticas tradicionais. E eu gosto do final. Acredito que o filme vai ficando melhor à medida que se aproxima de sua conclusão. Por mais lugar-comum que possa parecer, a direção segura de Edwards, a chuva que cai na sequência-chave e o nosso amor por Audrey Hepburn fazem toda a diferença.

Agradecimentos ao amigo Stênio.

terça-feira, dezembro 22, 2009

JULIE & JULIA























A temporada do Oscar já chegou. Na verdade, chegou desde que fizeram a besteira de lançar GUERRA AO TERROR direto em dvd. E chegou também quando Tarantino lançou o seu BASTARDOS INGLÓRIOS. Começou bem, então. Chegam agora os filmes que dão ênfase à interpretação, como é o caso de quase todo filme com a Meryl Streep lançado perto do final do ano. Inclusive, a atriz recebeu duas indicações pela mesma categoria para o Globo de Ouro (melhor atriz em musical ou comédia). Uma para IT'S COMPLICATED, de Nancy Meyers, e outra para este JULIE & JULIA (2009), que curiosamente também é dirigido por uma mulher, Nora Ephron, mais famosa pelos romances femininos que fez com Meg Ryan - SINTONIA DE AMOR (1993) e MENS@GEM PRA VOCÊ (1998).

JULIE & JULIA se enquadra na categoria de "filme gastronômico". Aquele tipo de filme que tenta aproximar o espectador de um sentido que o cinema não consegue abarcar: o paladar. E não deixa de ser curioso que esse filão seja até bastante explorado pelo cinema. Sinal de que há um público interessado. No Brasil recentemente tivemos ESTÔMAGO, mas não sei se dá pra comparar coxinha de boteco com cozinha francesa. Mas cada um dá o que tem, não é? E falando em culinária francesa, que até já ganhou uma animação caprichada pela Pixar (RATATOUILLE), não é interessante como os americanos se curvam à qualidade da comida francesa? Fazer o quê, se eles só tem hambúrgueres e tortas? A propósito, falando em tortas, há um filme muito simpático abordando o assunto, que é GARÇONETE, de Adrienne Shelly. E lembremos o quanto as tortas são valorizadas em cada episódio de TWIN PEAKS.

Mas voltando a JULIE & JULIA, o filme mostra duas histórias acontecendo em tempos diferentes. A primeira delas se passa nos anos 50 e mostra Julia Child (Meryl Streep), uma americana casada com um funcionário público que trabalha na embaixada americana em Paris (Stanley Tucci). Ela não tem muito o que fazer e aceita a ideia de começar um curso de culinária, afinal, o que ela mais gosta de fazer na vida é comer. Simultaneamente, vemos a rotina de uma jovem mulher em 2002, Julie Powell (Amy Adams), que é infeliz no emprego e que tem a ideia de escrever um blog sobre sua aventura de fazer mais de quinhentos pratos com as receitas do livro de culinária francesa de Julia Child no espaço de um ano.

As duas histórias têm o mesmo grau de interesse. Apesar de termos uma interpretação de peso como a de Streep, o fato de ter uma personagem que faz um blog e se empolga com os comentários de seus leitores fez com que eu me identificasse mais com a personagem de Adams. Infelizmente, como o filme não pode oferecer aos espectadores os deliciosos pratos preparados pelas protagonistas, temos que nos contentar com os dramas pouco interessantes das personagens e alguns poucos risos. Melhor sorte Streep e Adams tiveram quando trabalharam juntas em DÚVIDA, de John Patrick Shanley.

segunda-feira, dezembro 21, 2009

AVATAR























Dizer que AVATAR (2009) é muito barulho por nada seria uma baita de uma injustiça. Mas digamos que a espera foi longa demais, a expectativa foi grande demais para um filme cujos maiores méritos estão em seus aspectos técnicos, nas inovações tecnológicas, que são inegáveis. Basta olhar para as imagens fantásticas do filme para perceber o quanto aquilo tudo custou tempo, dinheiro e muita dedicação. Depois de AVATAR, qualquer dúvida de que James Cameron não fosse o cineasta mais megalomaníaco da atualidade se dissipa. Depois de torrar milhões com um projeto ambicioso como TITANIC (1997) e de passar todo esse tempo sem dirigir nenhum outro filme, ele precisava fazer algo gigantesco novamente. Algo inédito para os olhos, de preferência de longa duração e aproveitando a tecnologia 3D.

Não sou entusiasta da tecnologia - ainda prefiro o bom e velho 2D, que não me dá dor de cabeça e já me deu tantas alegrias -, mas como o cineasta também faz as vezes de ilusionista, a utilização desse novo recurso parece um caminho sem volta. O próximo passo, muitos dizem, é livrar-se dos óculos. Mas eu sou daqueles que seguem a cartilha da Pixar: não basta inovar na parte técnica, tem que trazer um filme que tenha uma trama que agrade; tem que ter personagens com quem a gente se importe e cenas de ação de cair o queixo ou nos deixar com o coração na mão. Infelizmente, porém, não é o caso de AVATAR, que tem uma trama até bem curiosa, mas não o suficiente para me empolgar. Ao contrário, em vários momentos, eu torcia para que o filme acabasse logo. E durante o clímax eu bocejava.

Não me incomodou a mensagem ecológica e new age. Eu até comungo com o que eles dizem. O problema é o modo como foi transmitido. O fato é que Cameron não é Steven Spielberg e não tem o mesmo dom de fazer algo ao mesmo tempo de ponta no aspecto técnico e ser capaz de mexer com as emoções da plateia, como arrancar lágrimas, por exemplo. A exceção de Cameron nesse aspecto é TITANIC, mas ainda assim é um filme que parece se preocupar mais com a perfeição dos efeitos especiais do que com o drama dos tripulantes. Não que eu ache que Cameron queira ser Spielberg. Nem seus fãs mais ardorosos, que se empolgam com robôs gigantes e criaturas fabulosas, desejam isso.

Embora já tenha sido divulgado em blogs e sites de cinema que a inspiração dos personagens veio de uma obscura HQ da Marvel, há ecos também da história de Pocahontas, a índia que se envolveu com um homem branco e que testemunhou a destruição de seu mundo por outra civilização. A nativa que se envolve com o protagonista é talvez a personagem mais interessante do filme. Neytiri foi interpretada por Zoe Saldana, que emprestou suas belas feições para a construção do rosto mais belo de AVATAR. Ela é a maior das mulheres fortes do filme. Em tamanho e importância. Perto dela, a participação de Sigourney Weaver parece simbólica e autorreferente e a de Michelle Rodriguez opaca.

Não sei como receberia o filme se o visse em 2D. Será que teria gostado mais? Provavelmente não seria tão interessante, visualmente falando, a julgar pelo trailer, que traz umas imagens um pouco esmaecidas nos cinemas convencionais. A cópia 3D é de dar gosto e valoriza as cores de uma maneira impressionante. Acho que alguém tinha me dito antes que, em 3D, o vermelho não era vivo, mas em AVATAR eu pude ver que isso está longe de ser verdade. O vermelho aparece forte principalmente no final, nas roupas de guerra dos nativos, quando eles se preparam para encarar os invasores. E que bom que as legendas chegaram ao 3D e foram feitas no capricho para se adequarem bem às imagens. Mas por ter escolhido ver o filme legendado, estou de ressaca de sono até agora. Já passava de uma da manhã quando cheguei ontem da sessão.

sexta-feira, dezembro 18, 2009

FUGA DO PASSADO (Out of the Past)























O documentário THE RULES OF FILM NOIR, produzido pela BBC e comentado recentemente aqui no blog, me deu um empurrãozinho para que eu retomasse a apreciação de alguns dos filmes mais importantes desse gênero glorioso. FUGA DO PASSADO (1947), de Jacques Tourneur, tem uma trama que até certo momento me fez lembrar MARCAS DA VIOLÊNCIA, de David Cronenberg. Ambos trazem um protagonista que vive uma vida pacata numa cidadezinha americana até o dia que o passado volta para assombrá-lo. E a diferença aqui é que esse passado é contado em flashback pelo protagonista (Robert Mitchum) com toda a classe que os melhores filmes desse ciclo possuiam. E que prazer que é ver este universo misterioso se descortinando aos poucos.

Assim como os melhores fimes do gênero, FUGA DO PASSADO também mostra um destino trágico para seu protagonista. E apesar de termos, entre as três importantes mulheres do filme, uma que representa a segurança, a estabilidade, a paz, a que mais atrai é a mais perigosa (Jane Greer), aquela em quem você não pode confiar. No longo flashback, Mitchum recebe uma missão de seu chefe, vivido por Kirk Douglas, de encontrar uma mulher. Obviamente, ele se apaixona por ela e entra numa fria. Ele diz para si mesmo que ela foi a melhor coisa que lhe aconteceu e também a pior.

O mais belo de FUGA DO PASSADO é talvez a forma poética com que Tourneur conduz o filme. Os diálogos são um espetáculo à parte, como quando Greer pergunta para Mitchum, num cassino, se há uma maneira de ganhar e ele diz: "há uma maneira de perder mais lentamente." Tudo no filme exala fatalidade e pessimismo. Mas apesar de tudo isso, os personagens nadam contra a maré, a fim de permanecerem o maior tempo possível vivos, mesmo sabendo que a qualquer momento algo de ruim surgirá ali, batendo à porta. Mesmo uma personagem com uma moral tão questionável como a de Jane Greer é apreciada pela plateia.

Jacques Tourneur é um cineasta que poderia ser mais lembrado como um dos maiorais, afinal, ele foi o realizador de grandes obras como SANGUE DE PANTERA (1942), A MORTA-VIVA (1943) e A NOITE DO DEMÔNIO (1957) - este último, ainda não vi.

quinta-feira, dezembro 17, 2009

SPARROW (Man Jeuk)























Ando bem displicente com os filmes orientais. Mesmo os trabalhos de cineastas de Hong Kong que eu aprendi a respeitar, como Johnnie To ou Wilson Yip. Já baixei filmes desses dois cineastas há vários meses, mas acabei me atrasando na apreciação. Incusive, até já tem filme novo de Johnnie To "em cartaz" nos melhores sites de torrent - VENGEANCE (2009). Enquanto isso, vou tirando um pouco o atraso com SPARROW (2008), filme que me pegou desprevenido. Tinha me esquecido dos poucos comentários que havia lido a respeito do filme no ano passado e esperava algo próximo dos ótimos trabalhos anteriores de To - BREAKING NEWS - UMA CIDADE EM ALERTA (2004), ELEIÇÃO (2005), ELEIÇÃO 2 (2006) e EXILADOS (2006). Mas que nada. SPARROW é algo bem diferente.

Trata-se de uma comédia com a leveza dos musicais hollywoodianos (ou franceses?) do passado, mas que, pelo fato de ter sido rodada do outro lado do mundo, tem suas óbvias diferenças. Johnnie To traz de volta a trupe dos trabalhos anteriores - destaque para Simon Yam -, junta no caldo a bela Kelly Lin, e faz um filme inusitado sobre um grupo de batedores de carteira que se envolvem com uma jovem mulher "protegida" de um gângster. Na verdade, não há muito o que falar da trama. O filme é puro estilo. O que me deixou com pouco interesse por SPARROW foi justamente essa leveza. A bela direção de To torna-o especial e bonito, mas isso não evitou que o filme funcionasse como um sonífero para mim. Acho que preciso da violência para me manter acordado nos filmes orientais. Sem falar que o senso de humor também não me conquistou.

Algo que me chamou muito a atenção no filme foi o tema musical, que lembra bastante a música de abertura de FALSA LOURA, de Carlos Reichenbach. Até escrevi para o Carlão, comentando sobre a semelhança com a trilha de Nelson Ayres. No filme de To, é uma música latina que faz um sutil crossover com a música tradicional chinesa. É um trabalho bem delicado.

Já disseram que SPARROW é um musical sem canções e danças. As coreografias não são de danças, mas da direção, do modo como os atores se movem diante da câmera. Destaque para a cena dos guarda-chuvas, que já foi tanto lembrada como sendo uma possível homenagem a CANTANDO NA CHUVA, como também a CORRESPODENTE ESTRANGEIRO, de Hitchcock. Apesar de curtinho e aparentemente menos despretencioso do que os anteriores, trata-se de um filme bastante especial para To, que levou três anos para concluí-lo.

quarta-feira, dezembro 16, 2009

O SOLISTA (The Soloist)























O novo trabalho de Joe Wright tem cara de filme feito para ganhar Oscar. E com razão tem sido esnobado pelas premiações e passou em branco nas indicações do Globo de Ouro, divulgadas ontem. A situação deve se repetir com o Oscar. O SOLISTA (2009) talvez objetivasse principalmente premiar os atores Jamie Foxx e Robert Downey Jr. Uma pena que o filme seja tão destituído de emoção. A única emoção que sentimos é de incômodo. Incômodo com uma história que não cativa, com personagens sem o menor carisma e tentativas frustradas de emocionar. Wright até usa um daqueles planos gerais, com a câmera se afastando e dando uma enorme panorâmica da paisagem feia de uma Los Angeles pouco vista nos filmes, mas isso não ajuda muito.

A impressão que tive foi que Wright se sentiu tão mal quanto nós, espectadores, ao fazer essa história mais intimista. Depois de dois belos filmes de época cheios de glamour - ORGULHO E PRECONCEITO (2005) e DESEJO E REPARAÇÃO (2007) -, que podiam vez ou outra mostrar uma veia épica, talvez Wright tenha se sentido engessado. O que acabou afetando também o seu talento como contador de histórias. Agora, se a intenção do filme é mesmo tornar tudo desagradável para o espectador, numa forma de nos deixar sentindo como se estivéssemos no inferno da cabeça de Nathaniel Ayers (Jamie Foxx), ou nos abrigos para doentes mentais pobres ou nas ruas cheias de mendigos, talvez até que O SOLISTA tenha sido bem sucedido.

Na trama, Robert Downey Jr. é um colunista do Los Angeles Times que vê na figura de um mendigo capaz de tocar violino um prato cheio para uma de suas colunas. Assim, ele procura saber do passado de Nathaniel Ayers. E o filme nos fornece, através de flashbacks, alguns momentos do passado de Nathaniel, de como ele, desde criança, sempre foi um entusiasta de música e de como aprendeu violoncelo na mesma medida que foi se tornando mais mentalmente instável, até adquirir o que o filme chama de esquizofrenia. O jornalista acaba se envolvendo mais do que esperava na vida de Nathaniel, tornando-se seu único amigo.

Pena que esse sentimento de amizade nunca seja sentido no filme. E Wright não consegue o mínimo de ternura para emocionar a plateia, por mais que se perceba suas tentativas. Espera-se que ele volte à boa forma com o que ele sabe fazer de melhor, filmes de época luxuosos. INDIAN SUMMER é o nome de seu novo projeto, previsto para 2011 e já contando com Cate Blanchett no elenco.

terça-feira, dezembro 15, 2009

DEXTER - A QUARTA TEMPORADA COMPLETA (Dexter - The Complete Fourth Season)























Parecia com as anteriores, mas alguns elementos acabaram por transformar a quarta temporada de DEXTER (2009) na melhor da série até o momento. Afirmar isso, levando em consideração a ótima primeira temporada, que ainda por cima tinha a vantagem da novidade, talvez seja um pouco precipitado, mas vejamos. Antes de mais nada, a temporada contou com o melhor serial killer que Dexter Morgan já enfrentou: Arthur Mitchell, também conhecido como "Trinity Killer" e interpretado por ninguém menos que John Lithgow. Sabe-se que um grande vilão é elemento importantíssimo para tornar um filme ou uma série em algo no mínimo muito bom.

Na trama, o agora aposentado agente do FBI Frank Lundy está de volta a Miami, numa busca obcecada pelo tal serial killer - e também para balançar o sofrido coração de Debra Morgan. Segundo ele, o assassino utiliza como modus operandi três tipos de mortes diferentes em diferentes cidades dos Estados Unidos. Uma das mortes é apresentada logo no primeiro episódio e é de grande impacto: o assassino pega uma mulher na banheira, imbobiliza-a, deita-se com ela, faz com que ela olhe para si mesma no espelho em seus momentos finais e desfere um golpe mortal em sua coxa até a banheira se encher de sangue.

Não sei se houve mudança da equipe criativa, mas a série esteve tão bem escrita que nem parece aquele tosquice que foi a terceira temporada. Entre os melhores momentos, destaco o segundo episódio, "Remains to be seen", um dos mais eletrizantes. Dexter sofre um acidente de carro, devido ao sono que o abate - vida de casado e pai de recém-nascido não é mole - e sua principal preocupação é que alguém descubra o corpo em pedacinhos de sua mais recente vítima. A temporada também rendeu a melhor performance de Jennifer Carpenter, que já era vista até por aqueles que não gostam da série como a melhor coisa de DEXTER.

O melhor episódio da temporada e provavelmente de toda a série é "Hungry Man", dirigido por John Dahl. É o episódio em que Dexter se convida para participar do dia de ação de graças na casa de Arthur e testemunha o horror que aquele homem faz a sua própria família. O momento do ataque de Dexter é empolgante. Tudo bem que humanizaram demais o personagem ao longo da série. Aquele homem com dificuldades de sentir da primeira temporada foi cada vez mais substituído por alguém que começa a descobrir o amor e os valores familiares. Isso pode até ser visto como ridículo, mas até que os roteiristas fizeram um bom trabalho e transformaram a rotina de casado de Dexter em mais uma dificuldade em sua vida. Quanto aos assassinatos que ele comete, eles se tornaram cada vez menos importantes diante da trama principal. Mas a trama principal é muito boa. E os roteiristas também foram ousados no final, surpreendente e que me deixou olhando para a televisão por alguns minutos. Ainda não sei se gostei do final, mas foi uma baita surpresa.

Também vi ontem a série de curtinhas em animação DEXTER - THE EARLY CUTS (2009), que utiliza a voz de Michael C. Hall e a música da série para mostrar o primeiro assassinato de Dexter, seu primeiro troféu. Os curtas caricaturizam ainda mais o personagem, mas os desenhos são caprichados. (Valeu, Zezão!)

P.S.: John Lithgow foi indicado ao Globo de Ouro como melhor ator coadjuvante em série ou minissérie! Está bem acompanhado, concorrendo com Ari (ENTOURAGE) e Ben (LOST).

segunda-feira, dezembro 14, 2009

JANELA INDISCRETA (Rear Window)























Terceira vez que vejo JANELA INDISCRETA (1954), de Alfred Hitchcock. A primeira foi na televisão, dublado, e a segunda, no cinema, quando do relançamento depois da restauração. Curiosamente, ainda assim, é um filme cuja fotografia parece ainda um pouco envelhecida. Devo dizer que a terceira vez foi melhor que as demais. Antes, eu não gostava tanto, por causa de seu andamento mais suave, que na minha cabeça não combinava muito com um filme de suspense. Mas agora, apreciando o filme pelo que ele é e não pelo que eu esperava que fosse, percebo que se trata mesmo de uma obra-prima. E um dos filmes mais influentes do cinema, sem dúvida. Quantos diretores já não homenagearam a obra?

É também um dos filmes mais estudados em teoria do cinema e técnica de edição, graças às reações do personagem de James Stewart a partir do que ele vê nas várias janelas. A propósito, desde a primeira vez que vi o filme - aliás, principalmente na primeira vez que vi o filme - que fico impressionado com a a moça seminua que se requebra em uma das janelas. É algo bem ousado, ainda mais para a época. Há uma sexualidade muito forte ali.

A sexualidade também está presente em momentos bem menos explícitos, em especial na cena do beijo de Grace Kelly. O famoso beijo-surpresa, cuja sequência em câmera lenta foi recuperada anos depois. Confesso que a primeira vez que vi a Grace Kelly neste filme, com os hormônios a mil da adolescência, digamos que o meu corpo reagiu instantaneamente. E ainda mexe comigo até hoje. Parece com um sonho. O personagem de Stewart está dormindo e quando acorda vê aquela deusa se aproximando dele. Ele, quase sem poder se esquivar, devido à sua condição de acidentado. Mas para que se esquivar? Aliás, como alguém não quer casar com Grace Kelly? Talvez esse seja o maior absurdo do filme.

Era a segunda parceria de Hitchcock com a atriz-princesa. Em DISQUE M PARA MATAR (1954), ela ainda estava um pouco engessada. Foi com JANELA INDISCRETA, com um papel que valorizava mais o seu jeito expansivo, alegre e encantador de ser, que ela mostrou realmente a que veio. E se mostraria ainda mais bela e sedutora no trabalho seguinte, LADRÃO DE CASACA (1955). O próprio Hithcock, muito sabiamente, havia percebido isso e, quando contratou o roteirista John Michael Hayes, pediu a ele que passasse uns dias com Grace Kelly, para perceber o seu modo de ser e poder fazer uma personagem moldada nela.

E falando ainda nos aspectos sexuais do mais famoso filme sobre voyeurismo de todos os tempos, interessante destacar o patrulhamento social que se fazia com o sexo entre pessoas não casadas. Era mesmo algo proibido. Principalmente num condomínio, onde o senhorio não permitia que pessoas solteiras trouxessem outras para dormir em seu apartamento. O olhar de cumplicidade - ou talvez de reprovação ou de inveja - do policial amigo de Stewart quando vê as roupas íntimas da moça em seu apartamento também é algo que diz muito do que era a sociedade naquela época. E Hithcock quis mostrar uma mulher bem liberal e ativa, como já era comum em Nova York.

Mas já gastei cinco parágrafos falando basicamente de sexo e de Grace Kelly e ainda não falei do principal, que é o olhar de James Stewart às janelas de seu condomínio como metáfora da relação entre o espectador e o cinema. E essa semelhança entre protagonista e espectador faz com que o momento do encontro com o assassino seja realmente assustador. Interessante notar que a distância da câmera, em relação às janelas dos apartamentos que ele espia é sempre longe. Exceto quando ele usa uma lente de aumento, como um binóculo ou uma lente adaptada para uma câmera fotográfica. Outro aspecto digno de nota também é o fato de Hitchcock não entregar logo de cara uma visão geral de todas as janelas. Ele o faz apenas quando quer enfatizar uma situação dramática, como na cena da morte do cachorrinho, que é realmente uma das mais emocionantes do filme.

Não percebi isso de cara, só depois, lendo a entrevista que Hitchcock deu a François Truffaut. Aliás, outra coisa que Truffaut muito inteligentemente destacou foi a aliança. Na cena em que Grace Kelly - que quer se casar com James Stewart - coloca a aliança da esposa do assassino no dedo, ela tem uma dupla vitória: ter conseguido uma evidência do crime e já ter uma aliança no dedo! Já estaria a um passo para o casamento, portanto. Muita coisa que pode passar batido para o espectador pode ser visto na cerca de uma hora de documentário de Laurent Bouzereau, presente nos extras do dvd da Universal. Ainda haveria muito o que falar sobre JANELA INDISCRETA. Aliás, é um filme que parece fonte inesgotável de estudos, teorias, análises. E mais uma das provas da genialidade do nosso querido mestre do suspense.

sexta-feira, dezembro 11, 2009

O ENIGMA DO MAL (The Entity)























Aproveitando o gancho de um filme que ganhou um remake (VÍCIO FRENÉTICO), segue mais um. O ENIGMA DO MAL (1981), o ótimo horror de Sidney J. Fury, ganhará uma refilmagem a cargo de Hideo Nakata. Não há muitos detalhes sobre quem participará ou imagens na web. Ainda é um mistério ou talvez ainda esteja em negociação. Quanto ao filme de Fury, em tempos de ATIVIDADE PARANORMAL, é bom ver outro bom filme sobre espíritos perturbadores. Assim como no novo filme, em O ENIGMA DO MAL, o mal não está presente na casa, mas assombrando a protagonista, vivida por Barbara Hershey. Portanto, não importa aonde ela vá, a entidade estará sempre lhe incomodando.

Hershey faz o papel de uma mãe de família que basicamente cuida sozinha dos filhos. Seu companheiro trabalha viajando e está sempre ausente. Num dia normal, ela é atacada por uma força invisível. Ela conta que sentiu que a entidade a violou sexualmente, um estupro. O detalhe é que quase sempre que a entidade ataca, ouvimos um som como de guitarras e bateria em volume bem alto. Como eu vi o filme durante a madrugada, sempre tinha que baixar o som do home theater se não quisesse ouvir a reclamação dos vizinhos ou mesmo do pessoal de casa. O som do dvd da Fox é 4.0. Não tinha visto esse tipo de som antes. E não sei qual seria a diferença do som 5.1.

Como espectadores, somos testemunhas dos fenômenos ocorridos, e, portanto, é sempre bom quando chega um momento em que a protagonista encontra alguém que entenda que aquilo que está acontecendo não é fruto de sua imaginação e sim ataques reais de uma entidade diabólica. Até sentimos um alívio quando vemos um grupo de pesquisadores de fenômenos paranormais tentando ajudá-la.

O filme parece um pouco datado – aqueles raios tipicamente oitentistas eram uma novidade que foi usada com certo abuso na época -, mas é bem saboroso. Desses que você começa a assistir e não pára até chegar ao final. Uma das cenas mais lembradas do filme é aquela da nudez de Hershey, num momento em que ela é atacada pela entidade. Mas não chega a ser nada sensual, dada à situação nada confortável e até perturbadora do momento.

quinta-feira, dezembro 10, 2009

VÍCIO FRENÉTICO (Bad Lieutenant)























Não tinha a intenção de ver VÍCIO FRENÉTICO (1992) agora. Minha intenção era fazer uma daquelas peregrinações pela obra de Abel Ferrara, acompanhando seus filmes em ordem cronológica. Até já estou acumulando alguns em dvix e dvd e a previsão de eu começar a vê-los é agora em 2010. Porém, quando vi o trailer no cinema da versão de Werner Herzog, fiquei salivando para ver logo o original de Ferrara, que eu devia ter visto há muito tempo. Era uma dessas lacunas quase imperdoáveis. E por mais que muitos já tenham me avisado do quão chapante é o filme, eu não estava preparado para ver algo tão visceral, tão forte, tão genial. Obra-prima mesmo.

VÍCIO FRENÉTICO mostra a descida progressiva de um homem ao abismo de sua alma. Ou ao inferno, já que estamos lidando com um cineasta que trabalha com o Catolicismo, que tem na culpa e no sacrifício as suas principais marcas. Harvey Keitel tem o papel de sua vida como o mau policial do título original. Um homem que nem mesmo tem nome no filme. Ele é um policial que vai fundo em vários tipos de drogas (cheiráveis, fumáveis, injetáveis), no sexo pago, nas apostas em jogos e no comportamento imoral, aproveitando-se de sua posição de policial. Refiro-me, principalmente, à memorável cena da abordagem das duas meninas no carro, que talvez seja o momento em que o personagem de Keitel parece mais repulsivo.

O que pode vir como uma espécie de redenção ou como o caminho do bem para ele talvez esteja na busca pelos estupradores das freiras. Sim, o filme ainda por cima tem uma cena de estupro de freiras, que pode ser visto pelos olhos do escândalo ou do fetiche. A sequência de sexo do filme, com duas prostitutas na cama, traz consigo uma bela e triste canção dos anos 50 ("Pledging my love", cantada por Johnny Ace), que já dá o tom de melancolia e pessimismo que será uma constante no decorrer do filme. A canção aparecerá novamente perto do final, acentuando sua importância na tragédia daquele homem que entra numa espécie de autossacrifício. Sua busca pelos pecados capitais não está ligada à uma procura desesperada pelo prazer. Ele faz aquilo como um meio de dar cabo aos poucos de sua vida mesmo. Talvez porque, sendo católico, ele acredite que pecando de maneira cada vez mais suja, ele tornará sua alma cada vez menos digna do perdão. Dessa forma, Ferrara questiona a natureza do pecado e o quanto o prazer e a dor podem estar tão próximos quando se já está num estado de inferno pessoal.

E se eu já tinha me admirado com o tratamento todo especial das discussões religiosas entre criminosos em OS CHEFÕES (1996), fiquei ainda mais impressionado com o quão fundo Ferrara vai na reflexão da fé e do pecado, mostrando os estragos que a religião faz na cabeça das pessoas, mas também nos mostrando a beleza do perdão. Tudo isso embalado com o papel de presente da transgressão.

quarta-feira, dezembro 09, 2009

É PROIBIDO FUMAR























2009 não foi um ano muito generoso para o cinema brasileiro. Pelo menos dentro do que foi lançado comercialmente. Foi o ano das comédias de sucesso de bilheteria (SE EU FOSSE VOCÊ 2, A MULHER INVISÍVEL, DIVÃ); também foi o ano em que dois filmes dos quais eu esperava muito me deixaram um pouco desapontado (MOSCOU, NO MEU LUGAR). Mas 2009 foi principalmente o ano dos documentários musicais, sendo que o melhor deles (LOKI – ARNALDO BAPTISTA) segue sendo o único brasileiro que está entre os meus franco-favoritos. Por isso, já neste finalzinho de ano, eu não esperava algo tão bom quanto É PROIBIDO FUMAR (2009), um filme que chega assim devagarinho e conquista.

O filme de Anna Muylaert é uma produção modesta mas cheia de qualidades. A começar pelo casal de protagonistas, vivido por uma Glória Pires inspirada e um Paulo Miklos muito à vontade, no papel de um músico de bar que conquista o coração de sua vizinha solteirona e professora de violão. Ele, Max, adora Jorge Benjor; ela, Baby, ama Chico Buarque. Um dos momentos mais agradáveis do filme é ver os dois discutindo música, ele dizendo que Chico Buarque é meio "devagar". Paulo Miklos já traz consigo uma persona bem simpática graças aos Titãs e se revelou um ator de mão cheia em O INVASOR, de Beto Brant. Estava faltando outro filme para ele brilhar. A trama inicial de É PROIBIDO FUMAR e a consequente reviravolta que finalizará o filme giram em torno do fato de ela tentar parar de fumar a pedido dele, o que gera situações cômicas, mas que também terá seus momentos de tensão.

E falando em contrastes, não cheguei a ver DURVAL DISCOS (2002), o longa de estreia de Muylaert, mas lembro que em toda resenha que lia, diziam que o filme era como um disco de vinil, dividido em lado A e lado B. Da mesma forma, pode-se dizer que se divide o novo filme. Mas talvez a mudança aconteça de maneira mais gradual.

É PROIBIDO FUMAR é cheio de pequenos momentos que parecem não significar muito, mas que acabam ganhando contornos de importância para o espectador. Desde as conversas banais no elevador, até as discussões de Baby com suas irmãs. O ponto de vista do filme é basicamente dela, mas em certo momento, a fim de criar uma conclusão bem interessante, vemos também o ponto de vista de Max. Há um belo trabalho de câmera, que se destaca ainda mais quando o filme se aproxima do final. O sentimento de cumplicidade, que é tão comum entre filme e espectador, acaba sendo o mote.

É PROIBIDO FUMAR foi o grande vencedor do festival de Brasília de 2009, levando oito prêmios, incluindo filme, ator e atriz.

terça-feira, dezembro 08, 2009

ABRAÇOS PARTIDOS (Los Abrazos Rotos)























Parece que a intenção de Pedro Almodóvar de voltar às origens com VOLVER (2006) se confirma com o novo ABRAÇOS PARTIDOS (2009), que retoma o gosto do cineasta pelo mistério, utilizado em duas de suas obras da década de 80, MATADOR (1986) e A LEI DO DESEJO (1986). Mesmo fazendo referência ao passado, os novos filmes de Almodóvar são obras de um cineasta maduro, um mestre em pleno domínio da técnica, só torcendo para que os bons ventos tragam não apenas ideias brilhantes, mas também inspiração durante a realização.

Mas por mais que a tentação de ficar fazendo comparações com suas outras obras seja forte, o ideal é mesmo encarar ABRAÇOS PARTIDOS como uma obra única, independente, por mais que isso seja difícil, já que tudo parece tão conectado. Antes de mais nada, no novo filme, nos vemos diante do personagem masculino mais bem construído da carreira do cineasta: o diretor de cinema cego interpretado por Lluís Homar. Ele é um personagem trágico, cuja história pessoal vai se descortinando à medida que o filme vai nos apresentando a dois tempos: o ano de 2008, quando somos apresentados a Harry Caine, o protagonista, um homem cego que já foi um cineasta bem sucedido no passado, mas que convive com naturalidade e resignação com sua deficiência; e os acontecimentos em torno de Lena, a personagem de Penélope Cruz, quatorze anos atrás, quando ela sofria com o pai com câncer e era assediada por seu patrão. As duas tramas se completarão através do flashback narrativo de Lluís Homar, contando de seu relacionamento passado com uma jovem atriz chamada Madalena.

Um dos momentos mais belos do filme é aquele em que Harry Caine fala da vontade que ele tem de fazer um filme sobre Arthur Miller, o dramaturgo que foi casado com Marilyn Monroe e que teve um filho com síndrome de down. Ele abandonou a criança, negou a existência do filho, tirando-o até mesmo de sua autobiografia. E o que acontece quando o filho se encontra com o pai é totalmente o oposto de uma história de vingança ou rancor. Trata-se de uma história de perdão. Diferente do que tenta fazer um jovem que visita Harry e quer que ele faça um filme com a intenção de destruir moralmente o próprio pai.

Na verdade, tudo que acontece antes e depois do flashback não é tão forte quanto o que acontece durante. A comovente história de amor entre Mateo Blanco (seu nome, antes de adotar o pseudônimo Harry Caine) e Lena é o que move a trama e também o momento em que o filme acelera um pouco o ritmo, mas sem se tornar irregular. O gosto por contar histórias já era bem aparente desde o início da carreira de Almodóvar, mas o contar, o uso das palavras, é ainda mais acentuado no novo filme, através da narração de Harry. Afinal, ele como um homem privado daquilo que mais amava - as imagens - precisa se apegar à palavra falada. Para assim poder criar imagens em sua mente. É assim que ele faz sexo com uma jovem no começo do filme, perguntando a ela detalhes de sua aparência. Para ele, a imagem é fundamental. E um dos grandes momentos do filme acontece quando Harry/Mateo toca com as mãos a tela que captura a imagem de Lena. É um dos momentos de maior beleza de ABRAÇOS PARTIDOS. E Penélope Cruz se confirma como uma das grandes musas do cinema na atualidade.

segunda-feira, dezembro 07, 2009

ATIVIDADE PARANORMAL (Paranormal Activity)























E eis que a moda dos mockumentaries, que já parecia até um pouco gasta, ganha mais um exemplar de peso. Talvez o sucesso desse tipo de produção esteja no perfil do público atual, já mais acostumado a reality shows e vídeos do youtube e em busca de um terror mais próximo do real. Mas que traga, claro, o conforto de saber que aquilo ali é apenas um filme. E o cinema é o lugar perfeito para nos permitirmos ser enganados, pagarmos por isso e esperarmos o melhor resultado possível, no caso, sustos, arrepios e quem sabe até a promessa de uma noite mal dormida. Feito para repetir o sucesso de A BRUXA DE BLAIR, inclusive na estrutura, no baixo orçamento e no marketing promocional, ATIVIDADE PARANORMAL (2009) é uma bela surpresa. E em tempos de vacas magras, de poucos filmes de horror que realmente assustam, a produção, que custou apenas quinze mil dólares e está arrecadando milhões, é bem eficiente.

Por mais que digam por aí que é besta quem paga pra ver filme com imagem ruim, parecida com a do youtube, eu digo justamente o contrário. Vale muito a pena ver o filme no cinema. De preferência em salas equipadas com uma aparelhagem de som dolby de ótima qualidade. Na sala que eu vi, nas cenas dos passos, eu poderia jurar que eram passos de verdade, isto é, de alguém andando pela sala. E levando em consideração toda a tensão que o filme provoca, detalhes como esse são bastante significativos.

O ponto de partida da trama é incrivelmente simples: casal que vive atormentado por supostas assombrações sobrenaturais resolve filmar a si próprios durante a noite enquanto dormem, a fim de flagrarem algo. O resultado é perturbador. Não dá pra falar muita coisa, sob o risco de estragar um pouco as várias surpresas que o filme provoca. Inclusive, vale dizer que quem já viu o filme pela cópia da internet ainda poderá ver um final diferente nos cinemas. Vi os dois finais e diria que gosto mais do final do cinema. Achei mais impactante, embora seja mesmo menos realista que o original. Dizem que o final original foi mudado por sugestão de Steven Spielberg. Se é que o final original é o da versão que caiu na rede.

Dá até pra se sentir um pouco como em dez anos atrás, na sessão de A BRUXA DE BLAIR. Inclusive com a reclamação de parte da audiência quanto à forma do filme. Um senhor ao meu lado, por exemplo, reclamava que não acontecia nada, que ele estava ficando com sono. Mas é justamente a expectativa do que vai acontecer, por mais frustrante que seja, que torna o nível de tensão bem elevado. O fato de que aquilo que está perturbando o casal não ser exatamente um espírito, mas um demônio, também ajuda a tornar o filme mais apavorante ainda. E tem aquela velha máxima de que o que você não vê é mais assustador do que o que você vê. Mas claro que é tudo questão de não criar muita expectativa, não ler muito sobre o filme antes de vê-lo e deixar-se levar por sua atmosfera perturbadora.

Quanto ao trailer veiculado para promover o filme, pareceu-me uma picareta imitação do trailer do espanhol [REC].

sexta-feira, dezembro 04, 2009

POR TODA MINHA VIDA - RAUL SEIXAS























O dia da morte de Raul Seixas (em 21.08.1989) foi um desses dias bem memoráveis. Como o 11 de setembro de 2001 ou o Impeachment do Collor, por exemplo, eventos que todo mundo sabe onde estava quando o fato ocorreu. Lembro que estava passando uns dias na Serra do Ibiapaba, na aconchegante cidade de São Benedito, quando saiu a notícia de sua morte. Um sujeito fã do Raul passou o dia passeando pela cidade com uma caixa de som em cima do carro tocando suas canções. Raul é desses casos especiais. É bem recebido em botecos pobres e em locais chiques. Tem até quem não goste, mas não há como ficar indiferente ao som e às letras muitas vezes polêmicas de Raulzito e seus parceiros de composição, entre eles Paulo Coelho. Aliás, a melhor parte de "O Mago", a biografia de Paulo Coelho, é quando o livro fala de sua relação com Raul.

Exibido ontem à noite na Rede Globo, POR TODA MINHA VIDA - RAUL SEIXAS (2009) teve direção de João Jardim, o homem por trás do ótimo PRO DIA NASCER FELIZ (2005). Quem interpreta Raul no programa é Júlio Andrade, o ator de CÃO SEM DONO e HOTEL ATLÂNTICO. Ele realmente se parece com Raul. Há momentos que nem dá pra distinguir. Há um bom trabalho de fotografia que tenta recriar as imagens da época. Outro acerto no programa é a pouca utilização de cenas dramatizadas. Diferente, por exemplo, do que aconteceu com os especiais abordando as vidas de Elis Regina e Renato Russo. Isso evita algumas situações embaraçosas.

O problema é que o programa ficou muito superficial e apressado. Ficou parecendo aquelas matérias bem rasteiras do Globo Repórter. A Rede Globo utiliza um tipo de edição padrão que tira qualquer traço autoral. Houve alguns detalhes que eu não conhecia, como o emocionante momento dos fãs carregando o caixão de Raul em seu velório, cantando suas músicas. Destaque também para os depoimentos das filhas, ex-esposas, outros familiares e amigos. Deixaram o depoimento mais emocionante para o final, de uma das filhas do cantor. Como Marcelo Nova bem disse, Raul era um homem de excessos. E foi assim até o final da vida.

Lembro que a última vez que ele fez show aqui em Fortaleza, uma amiga que foi me contou que ele só conseguiu cantar umas três músicas, deixando o público nervoso e pronto para quebrar tudo ali. Como não estive lá e não lembro detalhes do que ela me contou, não sei dizer ao certo qual a dimensão do ocorrido. Mas pelo que vi no programa, esse quebra-quebra era comum em seus derradeiros shows, que ele fez ao lado de Marcelo Nova. Era triste vê-lo tão inchado e decadente. Lembro-me de vê-lo no programa do Faustão, cantando "Carpinteiro do Universo", e foi muito triste vê-lo naquele estado. Mas tudo e todos têm o seu fim e o fim raramente é bonito de se ver. Felizmente os créditos sobem com uma imagem divertida, de quando o carro de Raul foi arrastado por uma ressaca do mar no Rio de Janeiro e ele levou a situação na esportiva.

Quanto ao documentário sobre o cantor a ser exibido nos cinemas em 2010, já está pronto e chama-se RAUL - O INÍCIO, O FIM E O MEIO, com direção de Walter Carvalho e Evaldo Mocarzel.