terça-feira, novembro 24, 2009

A BELA JUNIE (La Belle Personne)























Com quase um ano de diferença em relação à estreia em São Paulo, chega finalmente aos cinemas de Fortaleza A BELA JUNIE (2008), de Christophe Honoré, cineasta que eu nem dava muita bola, até ver o maravilhoso CANÇÕES DE AMOR (2007) e passar a ficar interessado por todos os seus trabalhos. Com A BELA JUNIE não se repetiu em mim o mesmo impacto emocional do citado musical, mas me deliciei com a ciranda de paixões mostrada no filme. A jovem do título nacional é uma moça que mal chega na escola e já arrebata os corações dos rapazes. E do professor também, vivido pelo ator-fetiche de Honoré, Louis Garrel. Ele é um professor de italiano que depois da paixão imediata que passa a nutrir pela jovem já rompe os relacionamentos que tem com uma aluna e com outra professora, mais velha que ele. Tudo para limpar terreno para Junie, vivida por Léa Seydoux - que esteve num papel pequeno em BASTARDOS INGLÓRIOS, como uma das filhas do fazendeiro no sensacional primeiro capítulo do filme de Tarantino.

Uma das coisas que me chamou atenção em A BELA JUNIE, mas que já transparecia um pouco nos dois longas anteriores de Honoré - EM PARIS (2006) e CANÇÕES DE AMOR - é o aspecto anacrônico. Por instantes, tive a impressão de estar vendo um filme dos anos 60. Discos de vinil, um velho aparelho de fita de áudio e a aparência de filmes da Nouvelle Vague nas ruas, nas roupas e nos cabelos contrastam com os telefones celulares. E curiosamente no colégio se aprende italiano, inglês e até russo. Será que isso é comum no sistema de ensino privado francês? Se for, deve ser um dos melhores do mundo.

Mais o que mais me chama a atenção nos franceses, principalmente desde que eu vi UM CONTO DE NATAL, de Arnaud Desplechin, é a maneira meio fria e meio trágica com que eles lidam com as paixões e as tragédias. Do mesmo modo que alguém pode se suicidar por causa de um sentimento de rejeição, outros parecem lidar com o ocorrido como se fosse apenas algo ruim que deva ser simplesmente esquecido, deixado de lado.

O filme estabelece uma ligação forte tanto com EM PARIS quanto com CANÇÕES DE AMOR, até pela utilização de uma cena musical, cantada por Grégoire Leprince-Ringuet, numa espécie de videoclipe incluído no filme, a exemplo do que também acontece na sequência final de EM PARIS. Outra característica que liga A BELA JUNIE com os outros filmes, inclusive MA MÈRE (2004), é uma abordagem livre de restrições com o amor entre pessoas do mesmo sexo. Não ocorre de maneira tão explícita quanto em CANÇÕES DE AMOR, mas há uma subtrama de personagens coadjuvantes que lidam com essa questão.

A sensação de familiaridade se instala no espectador que tem acompanhado as obras de Honoré até mesmo nas participações especiais - no caso, de Chiara Mastroianni e Clotilde Hesme. Essa sensação de familiaridade, porém, pode parecer um incômodo dèja vu para quem não aprecia os filmes do diretor. E não são poucos os que não vêem com bons olhos os seus filmes, que vêem Honoré (bem como Desplechin) como os grandes vilões do cinema francês contemporâneo. Eu sigo gostando de seus fimes, ainda que nem sempre entre neles "com os dois pés". Mas no final, acho tudo muito bonito e satisfatório. Encanto-me com a maneira dramática com que ele lida com as paixões ou a dor extrema.

A BELA JUNIE foi adaptado da mesma fonte de A CARTA, de Manoel de Oliveira. Não vi o filme português, mas no filme de Honoré a tal carta não é bem o centro da trama. O que mais importa é o amor do professor de italiano por Junie, o jeito enigmático da moça, suas atitudes inesperadas, seu medo de amar e sua beleza natural, que é símbolo do que há de mais belo e perigoso na juventude.

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