terça-feira, fevereiro 24, 2009

QUEM QUER SER UM MILIONÁRIO? (Slumdog Millionaire)























Os finalistas para o Oscar deste ano foram bem estranhos. Quem é que ia prever, dois anos atrás, que os favoritos ao prêmio principal seriam filmes dirigidos por David Fincher e Danny Boyle? Quem ia prever que o principal nome indie da festa, Gus Van Sant, voltaria com um título mais acadêmico? E quem diria que um dos melhores filmes, talvez até o melhor dos cinco, fosse dirigido por Ron Howard? O cinema é uma caixinha de surpresas. E mesmo que alguém tivesse apostado numa recente moda indiana, quem diria, há dois anos, que QUEM QUER SER UM MILIONÁRIO? (2008) abocanharia tantos prêmios? Danny Boyle finalmente conquistou Hollywood. E ainda trouxe Bollywood consigo, embora, como eu já falei aqui, duvido que ela tenha vindo para ficar. Vamos ver se filmes puramente indianos e com aquelas características bem populares e tradicionais do país vão se tornar também populares no Ocidente.

Quanto ao filme de Boyle, eu fui um dos que não entraram em sua viagem. Como também não havia entrado na viagem de TRAINSPOTTING (1996), um dos filmes mais celebrados do cineasta e uma das obras mais representativas dos anos 90. Mas pelo menos é possível estabelecer elos em comum entre o novo filme e outros trabalhos do diretor. O dinheiro, por exemplo, é algo que está presente desde a estreia de Boyle, com o suspense COVA RASA (1994) até o pouco visto CAIU DO CÉU (2004). Só que em QUEM QUER SER UM MILIONÁRIO? o dinheiro é tido por Jamal, o protagonista, não como algo tentador, mas como uma maneira de escapar de sua condição e, principalmente, de conseguir o amor de sua vida: uma garota por quem ele é apaixonado desde a infância e que agora encontra-se sob o poder de um grupo de gângsters perversos. Desses que pegam as crianças desde cedo para trabalharem como mendigos, assassinos ou entrarem para o mundo da prostituição. E por mais que alguém diga que ele está falando da realidade do país, não é assim que se vê o filme.

Assim como o jogo de perguntas e respostas que ele está jogando e que faz Jamal se lembrar de momentos da sua vida, numa montagem que valeu ao filme um Oscar, também a vida de Jamal, inclusive os momentos teoricamente mais dramáticos, como a morte de sua mãe, são vistos como um jogo. Há uma frieza que já é característica de Boyle. A emoção é superficial e alegria final é rasa. E eu vejo isso como um problema. Preciso da emoção para entender que o cineasta sabe o mínimo das técnicas de manipular a audiência, como Fincher soube mostrar, por mais que acusem o seu filme de apelar demais para os clichês. E quando eu falo "manipular", eu falo isso positivamente, como Hitchcock manipulava a audiência. Não há problema nenhum nisso se você está se permitindo ser manipulado. (É claro que essa é uma discussão que vai mais longe se analisarmos o que faz, por exemplo, um cineasta como Lars Von Trier.)

Dizem que Boyle chegou a se sentir ofendido quando compararam o seu filme ao brasileiro CIDADE DE DEUS. Meirelles pelo menos acertou a mão em seu filme e fez um trabalho que vai além da estética publicitária e do queimar a vista com as luzes e a fotografia. Além do mais, a comparação com CIDADE DE DEUS, vai além da sequência das galinhas. A amizade entre os dois irmãos pode ser usada como uma relação de aproximação entre os dois filmes, bem como a resistência do protagonista a adentrar o mundo da corrupção, coisa que seu irmão não soube fazer.

De todo modo, minha intenção não é denegrir a imagem do filme, que tem os seus defensores, que não são apenas os votantes da Academia e da imprensa estrangeira nos Estados Unidos, que também votaram no filme para o Globo de Ouro. Um dos textos mais interessantes que eu li sobre o filme foi o de Chico Fireman, que encarou a aceitação de QUEM QUER SER UM MILIONÁRIO? nos Estados Unidos como símbolo de uma nação que agora quer voltar o olhar para os problemas do mundo, deixar de olhar só para o próprio umbigo e aceitar os estrangeiros com braços abertos. Afinal, com Obama no poder, queremos acreditar que estamos diante de uma nova nação, certo? Uma nação que também quer ser otimista, apesar dos obstáculos. Achei interessante essa explicação. Embora obras como CARTAS DE IWO JIMA, de Clint Eastwood, e A PAIXÃO DE CRISTO, de Mel Gibson, com suas opções pela língua original, já fossem "ensaios" para esse momento.

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