sexta-feira, julho 11, 2008

NOME PRÓPRIO



O filme está previsto para estrear na próxima sexta-feira, dia 18, mas como tive oportunidade de vê-lo com antecedência numa cabine de imprensa (agradeço antecipadamente à Thaís pelo convite), pretendo expor aqui as minhas impressões sobre o filme. Mas antes de falar de NOME PRÓPRIO (2008), gostaria de falar um pouco de um filme do diretor, Murilo Salles, que marcou bastante o início de minha cinefilia. FACA DE DOIS GUMES (1989) fez parte da última leva de filmes da Embrafilme, antes do Collor chegar e acabar de vez com o cinema nacional. Não era uma safra tão brilhante, mas pra mim, cinéfilo iniciante, foi um prazer ver aqueles filmes no cinema, especialmente um thriller tão bem acabado quanto aquele. Com o tempo, percebi que Murilo Salles é um cineasta que talvez não tenha uma marca de fácil identificação - se é que há -, já que seus filmes seguintes são completamente diferentes um do outro. NOME PRÓPRIO, no entanto, pode-se dizer que continua demonstrando o seu interesse com os problemas e as aventuras da juventude, como no anterior SEJA O QUE DEUS QUISER (2002). Só que há uma grande diferença, talvez um abismo, entre os dois filmes. Se o primeiro era uma comédia agitada, o novo filme é um trabalho mais introspectivo e angustiante, sobre uma pessoa que, nas palavras da própria personagem, "gosta de viver em sua cabeça". Como muita gente que gosta de escrever. Aliás, não se trata apenas de gostar de escrever, mas de sentir uma necessidade urgente de escrever, como forma de exorcizar os demônios.

Essa necessidade de escrever, embora sempre tenha existido desde que o homem inventou a escrita, transpareceu bastante no final dos anos 90 com a internet e o advento dos blogs. E um dos blogs mais visitados e mais polêmicos e lidos do Brasil era o de Clarah Averbuck, que hoje é uma celebridade, mas que passou por maus bocados e teve sua vida - intensa e autodestrutiva - muito bem representada no filme por Leandra Leal, que se entrega no filme com todo o seu talento e coragem. Quando eu aderi ao mundo dos blogs, depois de algum tempo tentando resistir, cheguei a pegar o finalzinho do brazileira preta , embora nunca tenha sido um leitor assíduo. Talvez, assim como ela, eu tenha acabado ficando muito autocentrado no meu próprio blog e no meu interesse em questão, no caso, o cinema. Ainda assim, continuo achando que as pessoas que me conhecem através deste espaço virtual me conhecem bem mais do que aquelas que me vêem todos os dias mas que nunca travaram uma conversa de verdade comigo. Mas deixando um pouco de lado a minha pessoa, o fato é que eu me solidarizei com Clarah, aliás, com Camila, a personagem do filme, inspirado nos livros MÁQUINA DE PINBALL, VIDA DE GATO e nos blogs de Clarah - o atual se chama Adiós Lounge. O nome "Camila" talvez tenha sido inspirado na personagem do romance PERGUNTE AO PÓ, de John Fante, já que o escritor é citado em determinada cena do filme. Sem falar que o estilo de vida regado a drogas e álcool da personagem combina bastante com Fante e, principalmente, com Bukowski - vide brazileira preta, cuja página contém a citação de uma frase do "velho tarado".

NOME PRÓPRIO começa sem os créditos, com o uso da câmera na mão, na cena em que o namorado de Camila a expulsa de casa. O motivo: ela havia transado com outro cara. Assim, de maneira violenta, ele coloca seu PC, seu monitor e suas roupas dentro de caixas e pede para que ela deixe a casa imediatamente. Sem ter para onde ir, Camila encontra abrigo na casa de um amigo e é onde passa boa parte do tempo tomando pílulas para emagrecer (que a deixam ligadona) com cerveja. A aflição de estar sozinha e de ser abandonada pelo namorado que ainda ama, junto com a solidão, faz com que a necessidade de escrever se torne ainda mais latente. Assim, ela começa a publicar seus textos no blog, onde expõe seus pensamentos, sentimentos e fatos da própria vida e onde encontra também fãs de sua escrita, que acabam ajudando-a de alguma maneira a sobreviver sem trabalho, dedicando-se apenas aos seus escritos e a uma vida boêmia.

De personalidade forte e capaz até de tomar o namorado da amiga na cara dura, numa cena memorável na praia, Camila é dessas que não leva desaforo pra casa, assusta caras que têm cantada fraca e que tem de lidar com as dificuldades de se viver sem dinheiro. Outra cena inesquecível do filme envolve um adolescente, fã do blog de Camila, que oferece a ela hospedagem e que acaba por se aproveitar de seu corpo, ainda que de maneira "um pouco" diferente. A cena dele se masturbando olhando para a foto da vagina de Camila na tela do computador é representativa do mundo de hoje, de como o sexo e a tecnologia acabaram se tornando cada vez mais próximos, aumentando a distância física entre as pessoas. O filme conta também com a beleza espetacular da "falsa loura" Rosanne Mulholland, em participação igualmente memorável. Mas é à Leandra Leal que o filme deve a maior parte de sua força. Sem Leandra, sem a entrega e o talento dessa jovem, de quem eu sempre fui fã, o filme não seria o mesmo.

Murilo Salles também faz um belo trabalho, ao mostrar um pouco da história recente da internet, uma história bem próxima de nós. A internet discada e de difícil acesso daqueles tempos hoje é pouco usada e a internet de banda larga é cada vez mais comum nos dias de hoje, sem falar na própria aparelhagem, com os monitores pesados sendo substituídos por levinhos e fininhos de LCD. Outra curiosidade: entre os vários e-mails que Camila recebe em seu Outlook, percebi que havia até um de trânsitos astrológicos, coisa que eu só passei a receber nos últimos meses, graças à minha inscrição no site Personare, excelente dica do amigo Eduardo Aguilar. E falando em Personare, as "coincidências" são tantas entre os textos que recebo falando do que ocorrerá em cada trânsito e o estado em que se encontra a minha vida que eu chego a ficar boquiaberto.

No blog do filme, é possível ver, entre outras coisas, a lista de cidades onde o filme aportará no dia 18.

P.S.: Está no ar a nova edição da Revista Zingu!, cujo destaque é o dossiê John Wayne. Tem uma contribuição minha lá sobre o filme HATARI!, de Howard Hawks. No mais, tem Filipe Chamy falando de A RELIGIOSA, de Jacques Rivette; Marcelo Carrard dando o seu adeus ao mestre Dino Risi; Matheus Trunk mandando um artigo interessantíssimo sobre realizadores da Boca do Lixo que só fizeram um único filme; Stella Stevens na seção Musas Eternas, entre outras coisas bacanas.

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