segunda-feira, maio 12, 2008

MUTUM



Interessante observar a variada quantidade de novos cineastas que têm surgido nos últimos anos. Não sei se daqui a alguns anos estaremos olhando para esse atual momento e dando um nome a ele, como se estivesse acontecendo alguma espécie de evento especial, como o cinema novo, nos anos 50/60 e o cinema marginal nos anos 60/70. Uma pena que muitos cineastas que fizeram a alegria do povo nas décadas de 70 e 80 não estejam sendo muito respeitados pelos financiadores e alguns deles acabam tendo dificuldades de produzir e colocar em cartaz os filmes que tanto deseja. Enquanto isso, os jovens realizadores, alguns deles, do sexo feminino (eu tenho uma teoria de que a quantidade de cineastas-mulheres vai aumentar consideravelmente nos próximos anos), têm mostrado belos e inspirados filmes. É o caso de Sandra Kogut e seu primeiro longa-metragem de ficção, MUTUM (2007), baseado em obra de Guimarães Rosa. Sandra é autora do premiado documentário PASSAPORTE HÚNGARO (2001), realizado quando de sua estada na Europa, onde ensaiava a carreira dirigindo curtas-metragens.

Mutum é o nome de uma localidade do sertão mineiro, o lugar onde se passa a estória, vista sob a ótica de um garoto chamado Tiago. O menino tem 10 anos de idade e seu melhor amigo é o seu irmão. No início do filme, notamos a inocência do garoto, quando ele volta da cidade e traz para os seus irmãos um "santinho" que encontrou no chão. Na verdade, tratava-se de um calendário com uma fotografia de uma mulher nua, que os pais do menino logo tratam logo de dizer que aquilo é imoral, rasgando a foto. O filme vai mostrando aos poucos a dura realidade da família de Tiago. Seu pai, interpretado por João Miguel, de CINEMA ASPIRINAS E URUBUS, é um homem rude e que fica ainda mais agressivo quando descobre que está sendo chifrado. Sua mulher tem uma queda pelo cunhado, que é enxotado pela família para que sua presença não cause uma tragédia.

E assim, aos poucos, vamos nos acostumando com aquele ambiente rústico e que até parece se passar no século XIX, de tão distante que parece estar da civilização. Há uma interessante opção por uma ausência de trilha sonora, substituída pelo som das árvores, dos pássaros e dos passos dos personagens pisando as folhas caídas no chão. Os diálogos são curtos, havendo um espaço maior para a valorização das imagens. No campo das emoções, Sandra Kogut optou pelas sutilezas, quando poderia fazer um filme bem mais carregado nas tintas e bem mais popular, mas aposto que o filme faria a alegria de François Truffaut, se ele estivesse vivo, ele que tinha um olhar generoso para o universo infantil no ambiente hostil dos adultos. Uma das seqüências finais, aquela em que o menino pede o par de óculos do médico emprestado para dar uma última olhada na sua família e em sua localidade natal, é um dos mais belos momentos do cinema brasileiro recente, bem como a cena da mãe, que apesar de sentir pesar pela ausência do filho, tenta procurar sempre o que é melhor para ele. MUTUM foi o grande vencedor do Festival do Rio de 2007 e cada vez que eu penso no filme, mais eu gosto dele.

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