quinta-feira, fevereiro 07, 2008

CÓDIGO DAS RUAS (Sucker Free City)



Ando bem relapso com a filmografia de Spike Lee, cineasta que já provou ser um dos gigantes do cinema americano, mas que ainda tem produções suas saindo direto em vídeo, caso de ELAS ME ODEIAM, MAS ME QUEREM (2004), que dizem não ser muito bom, mas que deve ser melhor do que muita coisa que é exibida na telona. CÓDIGO DAS RUAS (2004) é um caso especial, já que se trata mesmo de uma produção para a tv e o seu lugar é mesmo a tela pequena. Aliás, a aproximação do cineasta com a televisão tem sido uma constante, tanto em longas-metragens como UMA HISTÓRIA DE HUEY P. NEWTON (2001), na direção de um piloto de uma série (SHARK, 2006) e de mini-séries especiais como a recente WHEN THE LEVEES BROKE: A REQUIEM IN FOUR ACTS (2006), um documentário engajado sobre as vítimas do furacão Katrina em Nova Orleans, um tema por si só bombástico. Até já baixei esse documentário, mas estou esperando o momento certo pra assistir.

Sobre CÓDIGO DAS RUAS, dizem que o filme é um piloto que não deu certo. Quer dizer, que não convenceu os executivos de que poderia se transformar numa série de tv, embora o filme sozinho, em seus 113 minutos de duração, dê conta de muita coisa. Principalmente pra quem tem a pretenção de abordar três tipos diferentes de comunidade em três eixos narrativos distintos. O filme mostra os guetos de São Francisco, apresentados de maneira até bastante didática, com direito a utilização de um mapinha de localização nos espaços da cidade e um pequeno histórico de como os grupos de brancos, negros e chineses se encontraram e formaram essa panela de pressão, prestes a explodir. O primeiro bloco a ser mostrado é o dos negros, que acaba mesmo sendo o mais interessante dos três. A presença de César Charlone na fotografia denuncia uma influência clara de CIDADE DE DEUS. Quando o filme mostra as três comunidades em separado, percebe-se que há uma intenção de tornar os tons da fotografia diferentes para cada eixo narrativo, sendo a fotografia do bloco dos chineses muito parecida com a dos filmes produzidos em Hong Kong. Isso não chega a ser novidade - Steven Soderbergh fez isso em TRAFFIC e um outro cineasta já deve ter experimentado algo parecido anteriormente. Mesmo assim, não deixa de ser interessante ver essa mudança plástica sendo esquecida e/ou mesclada à medida que vamos nos aproximando dos personagens e de seus dramas.

Na trama, uma família branca, pressionada pelas dificuldades financeiras, é forçada a morar num bairro mais pobre, de maioria negra. Um grupo de negros não vê com bons olhos a vinda desses "branquelos" para o seu território. O pai de família branco (John Savage), um exemplo de compreensão, até entende o posicionamento deles, já que ele imagina que isso seria uma espécie de defesa de território. O problema é quando os negros começam a entrar na casa deles e roubar os eletrodomésticos e outros bens. Enquanto isso, um grupo de chineses ganha a vida vendendo discos piratas nas ruas. Quando os negros percebem que estão perdendo dinheiro com a pirataria, tendo o disco de um seus rappers sendo vendido bem mais barato nos camelôs chineses, um deles vê o negócio como uma maneira interessante de ganhar dinheiro de uma forma muito mais tranqüila do que ficar se matando no tráfico de drogas. É aí que entra o rapaz branco, com o seu lap top e que passa a piratear alguns discos às escondidas no próprio escritório onde trabalha.

O filme, além de nos mostrar um belo painel de uma sociedade em ebulição, tema chave do cinema de Lee, vide FAÇA A COISA CERTA (1989), também faz questão de mostrar como um negócio a briga por espaço entre essas três raças. O momento mais chocante, no entanto, tem a ver com a relação de uma criança negra com o grupo de traficantes e a maneira como essa criança é tratada lá pelo meio do filme. Um negócio que me deixou extremamente revoltado e querendo justiça. E é por causa de reações como essa que o filme de Spike Lee ganha muito mais pontos nas cenas protagonizadas pelos negros e perde um pouco nas cenas dos brancos e dos chineses, sendo, portanto, um pouco irregular. Ainda assim, há uma seqüência de morte no bloco chinês que deve deixar muito diretor oriental comendo poeira. CÓDIGO DAS RUAS foi produzido pelo canal Showtime e saiu em dvd no Brasil pela Flashstar.

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