sexta-feira, maio 11, 2007

O CHEIRO DO RALO



Um fenômeno curioso que eu tenho notado no meio cinéfilo atual é uma certa cisma que um grupo de pessoas tem expressado contra o cinema brasileiro contemporâneo. E isso até vem de pessoas que eu admiro e respeito. Inclusive, Inácio Araújo, considerado por muitos o melhor crítico de cinema do Brasil da atualidade, escreveu em seu blog que "a gente está fazendo bomba atrás de bomba". Bom, eu sinceramente não consigo ver tanto filme brasileiro ruim. Só nesse ano, o que eu vi e gostei: BATISMO DE SANGUE, CAIXA DOIS, Ó PAÍ, Ó, EU ME LEMBRO, ANTÔNIA. E olha que nem entrou em cartaz aqui ainda SERRAS DA DESORDEM, HÉRCULES 56, PROIBIDO PROIBIR, CARTOLA: MÚSICA PARA OS OLHOS... Hoje, mais dois importantes filmes entram em cartaz no circuito comercial: O BAIXIO DAS BESTAS, de Cláudio Assis, e CÃO SEM DONO, de Beto Brant. Pena que nenhum dos dois chegou em Fortaleza ainda.

No meio dessa boa safra, outro filme notável é O CHEIRO DO RALO (2006), de Heitor Dhalia. O filme é outro que não chegou em Fortaleza ainda, mas que eu tive oportunidade de ver quando estive em Porto Alegre. Mesmo aqueles que não gostaram do filme tecem ao menos elogios à atuação de Selton Mello ou à simpatia da "bunda", a garçonete de nome esquisito vivida por Paula Braun. NINA (2004), o trabalho anterior de Dhalia, apesar de um tanto quanto irritante, já demonstrava grande potencial para trabalhos futuros, coisa que se confirma e se repete nesse segundo filme.

Baseado em romance de Lourenço Mutarelli, O CHEIRO DO RALO é coerente com os personagens das obras do escritor/quadrinhista. Assim como o personagem da HQ "Transubstanciação", o protagonista do filme de Dhalia é uma pessoa atormentada por angústias, desesperanças e desencantos. Inclusive, se o filme fosse um pouco menos cômico e mais melancólico, eu até teria me identificado com o protagonista, já que estou vivendo um momento bem amargo de minha vida. Em vez de instaurar uma melancolia no ar, Dhalia prefere um registro mais engraçado, mais modernoso, mais tarantinesco - até a brincadeira com o nome da "bunda" remete diretamente à noiva de KILL BILL.

Na trama, Selton Mello é Lourenço, um homem amargo que trabalha como comprador de uma loja de objetos usados. Ele se sente bastante incomodado com o mau cheiro proveniente do ralo do banheiro de seu escritório. Para evitar que os clientes pensem que o fedor vem dele mesmo, ele sempre comenta que o cheiro vem do ralo. Uma galeria de personagens esquisitos aparecem para negociar com Lourenço. Nas horas vagas, ele faz o sacrifício de comer os sanduíches horríveis de uma lanchonete, só para apreciar a bunda da garçonete.

Três musas de filmes anteriores aparecem no filme não tão bonitas: Sílvia Lourenço, que havia chamado a atenção em CONTRA TODOS, aparece nua, mas feia e magra no papel de uma viciada em drogas; Susana Alves, a tiazinha, também não aparece tão gostosa e atraente como em MANDRAKE; e Alice Braga também não está tão boa quanto em CIDADE BAIXA. Talvez isso aconteça com a intenção de valorizar o tempo de Paula Braun no filme. E até que essa estratégia funciona, pois quando ela passou um bom tempo sem aparecer no filme eu perguntei logo: "cadê a bunda?".

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