segunda-feira, fevereiro 07, 2005

AGONIA DE AMOR (The Paradine Case)

 

Último filme da parceria de Alfred Hitchcock com o produtor David O. Selznick, AGONIA DE AMOR (1947) está mais para drama de tribunal do que para filme de suspense, mas é um filme extremamente prazeiroso e tem muitas das características do mestre do suspense. 

A começar pela cena de abertura, onde vemos a Sra. Paradine (interpretada pela belíssima Alida Valli), uma mulher bonita e sofisticada tocando piano em sua casa luxuosa. Ela é interrompida pelo mordomo, que a informa que um policial está à sua porta. Ela vai presa, acusada de ter assassinado o seu marido cego. Desde essa cena de abertura que o filme nos prende de uma forma impressionante. Só a idéia de uma pessoa aparentemente normal estar sendo presa já é algo bem desagradável de se imaginar. Hitchcock depois faria o filme definitivo sobre o assunto em O HOMEM ERRADO (1957). 

Tudo leva a crer que essa sua obsessão pela figura do inocente sendo preso tenha vindo de sua experiência traumatizante na cadeia: quando criança, o seu pai lhe pregou uma peça e o enviou para o delegado de polícia com um bilhete. O delegado o trancafiou na cadeia por poucos minutos, mas que foram suficientes para deixar marcado esse momento por toda sua vida. Será que não teríamos um Hitchcock se isso nunca tivesse acontecido? 

Em AGONIA DE AMOR, Gregory Peck é o advogado responsável pelo caso da Sra. Paradine. Ele tem um casamento estável, mas se apaixona por sua cliente. (Também pudera, quem não se apaixonaria por Alida Valli?, que eu considero uma das mais belas atrizes a passar por Hitchcock. Talvez até mais linda que Ingrid Bergman.) O advogado acredita que ela é inocente e faz de tudo para inocentá-la. Também no elenco, e numa participação memorável, o grande ator britânico Charles Laughton, como o juiz implacável. Era de Laughton que Hitchcock mais gostava do elenco. Os dois já tinham trabalhado juntos em A ESTALAGEM MALDITA (1939). De acordo com a entrevista do livro Hitchcock/Truffaut, soube que o diretor não gostou da escalação de Allida Valli, nem de Gregory Peck, nem de Louis Jordan, julgando-os inadequados para os papéis. 

AGONIA DE AMOR é um filme mais simples de Hitch. Não tem muitos momentos virtuosos, com travellings antológicos ou coisas do tipo. O que podemos destacar de virtuosidade acontece apenas numa cena no tribunal, onde a Sra. Paradine está no banco dos réus e sente a presença do cavalariço chegando. Para dar a idéia de que a viúva estava sentindo a presença de seu serviçal no tribunal, Hitchcock usou a câmera girando em torno de Valli, enquanto ao fundo, em retroprojeção, vemos o cavalariço adentrar a corte. 

Depois desse filme, Hitchcock finalmente se libertaria do produtor Selznick e iniciaria a sua fase mais genial e brilhante com FESTIM DIABÓLICO (1948), quando ele passaria a ser o seu próprio produtor. Selznick já tinha ficado puto com Hitch porque ele não deixava mais espaço para ele cortar cenas que achava desnecessárias, já fazendo a edição em sua própria cabeça. Selznick dizia: "não consigo acompanhar esse quebra-cabeças de cortes que você está fazendo", conforme li em Afinal, Quem Faz os Filmes, de Peter Bogdanovich. É com esse filme que termina o mais famoso embate diretor vs produtor da história do cinema. 

Ah, e só pra deixar registrado: a cópia do DVD da Continental está surpreendentemente muito boa.

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